Sem piedade
A prosa afiada de Camilla Canuto
Publicado em 07 de fevereiro de 2023
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
Via de regra, não leio mulheres. Não dou atenção, em geral, a escritores vivos. As minhas preferências literárias recaem quase sempre sobre autores consagrados pela História, merecedores de vasta fortuna crítica, como o raio atraído pela copa das árvores mais altas, tronco imenso, árvores seculares.
Não passei incólume, entretanto, pela prosa afiada de Camilla Canuto. O seu nome confraterniza com assinaturas cobertas de verniz e petulância na prateleira sensível de meus heróis literários. É assim há tempos, desde quando li um conto submetido por ela a uma banca de pareceristas reunidos pela Funcaju. Guardei o nome para mim, até agora.
‘Há uma lápide com o seu nome’, o primeiro livro de Camilla, realiza muito em poucas páginas. Numa sala de espelhos familiar, gerações de mulheres traídas por si mesmas e pelas circunstâncias tacanhas dos costumes ainda em voga se miram e se julgam. Os dedos apontados por umas e outras as acompanha até o caixão.
Cruel como somente os grandes escritores podem ser, Camilla é implacável com seus personagens, homens e mulheres, narra como um tirano, sem conivência, piedade, sem um pingo de empatia ante as mesquinharias das relações sociais. E, assim, leva o seu trabalho até as últimas consequências.
Não tenho vocação para levantar bandeiras, cínico por natureza e exercício do arbítrio. O leitor leia mulheres, se quiser, por sua própria conta, portanto. Antes de todas, no entanto, leia Camilla Canuto. A dica é de graça.