Um realizador nato.
De sol a sol
Publicado em 10 de agosto de 2023
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos – riansantos@jornaldodiase.com.br
O trabalhismo está fora de moda. Segundo as más línguas, os folhetos largados no chão de fábrica foram varridos pela emergência das pautas identitárias. Homens e mulheres, pretos e brancos, gays, lésbicas, travestis, todos trabalham, no entanto – transpiram de sol a sol, na esperança vã de ver a vida melhorar, um dia.
Para a maioria, a vida é luta. Fala-se aqui dos trabalhadores operários, gente que pega no pesado. Mas também daqueles que lidam com a imaginação, torneiros das ideias. Carlos Pronzato é destes. Câmera à mão, ele registra, testemunha, documenta. No conjunto da obra, mais de 80 filmes, amplia a voz dos marginalizados.
Trabalhador, sim senhor. Lembro do forte impacto que me tomou, há muitos anos, ao ser abordado pelo sujeito. Ele parecia um doido, sob a barba imensa e os cabelos desgrenhados. Estendeu a mão ao estagiário surpreendido na redação do jornal e se apresentou com o sotaque empoeirado, repleto de mares e estradas. Carlos Pronzato. O nome, então, não me dizia nada. Assina, no entanto, o documentário ‘A revolta do buzu’ (2003), um atestado de filiação dos mais aguerridos. Foi a primeira vez que vi um cineasta de verdade, em carne e osso. E o homem já tinha lado.
Se trabalho é suplício (penso aqui na etmologia da palavra, na exaustão do hamster confinado numa roda), a falta de meios e oportunidade para pegar no batente é mais penosa ainda. Indiferente aos gargalos do mercado exibidor, entretanto, Pronzato filma, orgulhoso dos próprios calos.
Lançamento – Sexta feira, 11 de agosto, às 18 horas, o Cine Vitoria abriga o lançamento do documentário ‘Jangadeiros alagoanos, o que Orson Welles não viu’ (2022), dirigido por Carlos Pronzato.
O documentário conta a história dos pescadores Umbelino José dos Santos, Joaquim Faustilino de Sant’Ana, Eugênio Antônio de Oliveira e Pedro Ganhado da Silva, cidadãos originários de diversas cidades do Litoral Alagoano que saíram de Maceió em 27 de agosto de 1922 para o Rio de Janeiro. Eles sofreram os mais diversos revezes na viagem. Só para ilustrar destas dificuldades, na costa da Bahia, enfrentaram um grande temporal, quando foram atirados ao mar e perderam suas provisões, roupas e a vela da jangada Independência. A solidariedade do povo baiano foi decisiva para a continuidade da viagem.
Após noventa e oito dias, mais de mil milhas percorridas e nove tempestades enfrentadas, no dia 2 de dezembro os Jangadeiros Alagoanos chegaram à Cidade Maravilhosa, onde foram recebidos como heróis. A população, o governo e a imprensa queriam estar próximos dos alagoanos, que talvez ainda não tivessem se dado conta da proeza que realizaram. Além da proeza dessa viagem, um fato curioso e que está presente no documentário é que os pecadores resolveram empreender esta jornada dois dias antes dela ter início. O objetivo foi participar dos festejos pelo centenário das comemorações da Independência do Brasil.