Voando para o Leste
Publicado em 14 de junho de 2013
Por Jornal Do Dia
*Ary Moreira Lisboa
"S’tamos em pleno mar". Lamentou Castro Alves em seu belo e pouco conhecido poema, Navio Negreiros, onde é narrada a viagem dos escravos importados da África para o Brasil. O dia 13 de maio acabou em ela – no papel. S’tamos em pleno ar, a bordo de um asa dura, direi eu, em direção oposta aos navegantes antigos. Como sempre o Brasil não perdeu o ranço e a hegemonia de ser o último em tudo. Foi último país a abolir a escravidão. Fenômeno igual ocorreu com a proclamação da República, com a derrubada do Império, na América Latina. Nosso sistema de governo já sofreu várias e terríveis experiências, antes de se fixar numa tênue e incipiente Democracia, que Otavio Mangabeira recomendava ser irrigada com muito cuidado, como uma planta tenra, por ser muito precoce e vulnerável.
Agora os donos atuais do poder acham que tudo pode. Inspirados em maus exemplos, nada dignificantes, desejam mudar tudo, inclusive com o policiamento do Judiciário, a castração da Imprensa. Esquecidos, ou talvez por desconhecimento, do verso de Paul Verlaine, poeta francês, que disse: "Não existe noite por mais tenebrosa que seja, que nunca tenha uma aurora".
Provavelmente tal inspiração tenha surgido dos versos de Virgilio, no Primeiro Canto da Eneida, quando um velho escravo, já alquebrado pelo tempo e sofrimento, tenha dito: "Libertas quae sera tamen" (liberdade ainda que tardia), que os mineiros liderados pelos positivistas de então, tenham inserido em sua bandeira. Grande lema! Pena que a tão sonhada liberdade ainda não tenha chegado aos menos infortunados. É o Brasil um caleidoscópio de desigualdade, representada pela miséria, pela "fome de saber", de Castro Alves.
A inexpressividade do Brasil é tão grande, que quando um de seus filhos é indicado para cargos internacionais de alguma representação, o país todo comemora como se tivesse conquistado mais um título mundial de futebol. Este sim, valioso importante. Jamais a presidência de um órgão mundial, principalmente sendo baiano. Em todas as disputas enfrentadas para órgãos internacionais perdemos para africanos, asiáticos e outros mais.
Nossos vizinhos conseguiram eleger até um Papa. Fato inédito. Se partirmos para outros campos, tais como literatura, paz, então o mundo escurece totalmente por eclipse de subdesenvolvimento total. Argentina, Chile, Colômbia, México, Peru, até a minúscula Costa Rita já teve o seu momento de glória, com Oscar Arias, que a elevou aos topos internacionais. Sorte nossa é que ainda – ainda – não se instituiu um prêmio especial para a corrupção, a safadeza, a falta de educação, de saúde, de justiça, de respeito aos direitos do cidadão, de civilidade, cidadania. Existisse ele, com certeza, seríamos imbatíveis, ocuparíamos o primeiro lugar no pódio.
Em parte nenhuma do mundo se encontra jovens delinquentes, assassinos, usuários de drogas como no Brasil, onde são tratados como imbecis, idiotas, insanos, por isso inimputáveis, com plena liberdade para matar, na certeza de que nada lhes acontecerá. Isso leva os bandidos a usarem tais menores para praticarem seus atos delituosos. Onde estará a gloriosa nação daqui ao final do século? O que será da nossa juventude que nada aprende por não ter professores capacitados para ensiná-los? Provavelmente, com o avanço da medicina, com muitas vacinas descobertas, a expectativa de vida aumentará em muito. Mas como chegarão até lá? Estarão habilitados para enfrentar o momento?
Na atualidade tudo é facilitado para que o homem nada faça. Não utilize o físico para nada, pois no futuro tudo será movido pelos meios cibernéticos, com teclados pressionados no devido local, para iniciar o movimento desejado. Não creio que haverá dificuldades para os manetas, pois mãos mecânicas serão inventadas, utilizadas cotidianamente, ou quem sabe, apenas com o pensamento se conseguirá movimentar qualquer objeto, carros, abrir geladeiras, enfim, tudo.
O mundo é feito de surpresas, como diria meu velho amigo Djalma Santana: "Este mundo é muito bem feito, meu doutor". Ele disse isso nos idos de 1960. Se vivo estivesse veria que o muito além de ser "muito bem feito", está mais torto do que a Torre de Pisa, somente não caindo por teimosia para contrariar a lei da gravidade. O mundo sendo bem feito ou não, não dá exemplo dignificante ao Brasil, que não valoriza a qualidade, somente se preocupando com a quantidade. Pois tal exemplo estatísco impressiona os incautos estrangeiros, que não vislumbram nossas estradas, nossos portos, nossos aeroportos, nossas faculdades, nossos hospitais.
Estamos nos preparando para dois eventos internacionais de grande repercussão: Copa das Confederações e Copa do Mundo. Ocasião em que teremos oportunidade de mostrar ao mundo que sabemos receber e quão grandes somos. O mundo sairá daqui estarrecido e amalucado. Brasil a vista! Dirão ao chegar.
* Ary Moreira Lisboa é advogado e escritor