Astúcia
Publicado em 11 de abril de 2018
Por Jornal Do Dia
* Antonio Passos
Quieto! Calado! Você perdeu professor. Tem alguma dúvida disso? Você não pode fazer nada contra mim. Não pode nem me alcançar. Tudo que você pode é gritar, espernear, protestar, mas, só até quando eu quiser. Eu tenho uma arma nas mãos, apontada para você. Você não tem como fugir. Se quiser, a qualquer momento, com um simples movimento, eu posso despedaçar seu corpo. Você perdeu professor!
Eu nem sei se você é mesmo professor ou professora, isso é o que menos importa, pode até ser. Sabe por que eu lhe chamo de professor? É por causa dessa sua arrogância. Dessa sua mania de querer ficar falando coisas sobre política, sobre sociedade, sobre economia… Só porque leu uma meia dúzia de livros, porque se formou numa universidade pública. É mestre, é? É doutor? Ou é só encrenqueiro mesmo?
Sua sabedoria de mesa de bar aqui não vale nada. Onde é que você pensa que está organizando o seu exército de vagabundos? Na sala de aula? No boteco da esquina? Ou na sala de jantar? Isso demora muito tempo seu arrogante imbecil. Enquanto você delira eu tenho as minhas forças prontas e treinadas pra entrar em combate na hora que eu quiser. A minha palavra você não discute. O que eu digo, é lei e pronto.
Pra que eu quero sua intelectualidade de meia tigela se eu tenho intelectuais de verdade ao meu lado? Gente bem nascida e bem criada, que se dedicou a vida toda aos estudos sem ter que perder tempo com mais nada. Homens e mulheres que estudaram nas melhores escolas do mundo e sabem bem o que é certo, o que é errado e o que é melhor para todos. Esse sim é o saber que nos engrandece e faz bem.
Sabe de uma coisa? O que me vem à cabeça o tempo todo? Eu fico pensando porque não aniquilo você de uma vez por todas. Seria tão simples e restaria um mundo mais limpo, sem tanta desobediência e ousadia. Mas aí vem aquela aporrinhação, tem sempre alguém soprando no meu ouvido: calma, calma, se eles e elas não existirem mais, quem é que vai nos servir? Acho que robôs seriam melhores.
Não, não. Esse meu desejo exterminador é mesmo bobagem. Sem você por perto eu perderia a oportunidade de observar e me divertir com a sua impotência e total humilhação. Claro que se você ou qualquer outro quiser dar uma de herói um bom corretivo é sempre exemplar e necessário para desencorajar o resto da turba. Mas o exemplo vivo da impotência também é uma lição importante para a segurança.
O que? Vai reclamar na imprensa? Vai procurar a televisão? Que boa ideia! Vá então, corra, vá logo e depois venha me dizer o resultado. Você então acredita mesmo que os meios de comunicação estão dispostos a divulgar mentiras contra gente de bem? Sim, de vez em quando alguém da nossa turma é fritado, você tem razão. Esses são apenas bois de piranha meu simplório professor. Depois, tudo se ajeita.
Agora chega. Caia fora da minha vista, já perdi tempo demais com você. Eu tenho mais o que fazer, eu tenho amigos e uma vida para gozar. Será que você é professor mesmo? É autodidata, é? Coisa nenhuma. O que você é mesmo é um agitador barato. Um arruaceiro desqualificado. Professor de araque. Vá seu molambo, se mande e grave bem o meu nome pra nunca mais se esquecer de mim. O meu nome é Astúcia.
* Antonio Passos é jornalista