Segunda, 20 De Janeiro De 2025
       
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Joel e o Morro do Urubu


Publicado em 23 de outubro de 2018
Por Jornal Do Dia


 

* Raymundo Mello
(publicação de Raymundinho Mello, seu filho)
Em mais uma feliz e notável iniciativa no 
âmbito cultural, a ‘Universidade Tiraden-
tes’ – leia-se: ‘Professor Jouberto Uchoa de Mendonça’ – instalou na sua Biblioteca Central, no Campus Farolândia, o ‘Memorial Joel Silveira’, abrigando o acervo que pertenceu ao jornalista sergipano (falecido em 2007) que tanto se destacou no cenário nacional.
Doado por sua família à instituição e ali tratado conforme os princípios museológicos, o acervo compõe um valoroso e agradável espaço, entregue ao público apreciador de memórias na última segunda-feira, 15 de outubro, ‘Dia do Professor’, celebrando, assim, o centenário de Joel Silveira, ocorrido em 23 de setembro passado.
Ao registrar a efeméride, trago para os caros leitores /recortes/ de dois artigos consecutivos publicados por meu pai, o ‘Memorialista Raymundo Mello’, aqui no ‘Jornal do Dia’, edições de 31/05 e 07/06/2016, prestando a sua homenagem a Joel Silveira.  Título original dos textos: "Falando de coisas boas" e "Cumprindo o compromisso", respectivamente.
Assim escreveu Raymundo Mello:
"Na juventude – anos 40 e 50 -, conhecia e frequentava todos os bairros de Aracaju – que eram poucos, então -, a pé, de bondes, marinetes ou nos automóveis de propriedade de meu cunhado, ‘Lúcio Leite’. Ele, apesar de funcionário público federal, representava a empresa ‘São Paulo Studio’, que reproduzia fotos preto-e-branco em cores, trabalho muito apreciado à época. Ele cuidava das "vendas" e quando o produto era negociado a prazo, 3 a 4 parcelas, eu era o encarregado das cobranças mensais no vencimento de cada parcela.
Esse trabalho me facilitava andar muita pela cidade inteira, principalmente entre os bairros Santo Antônio, Industrial, 18 do Forte, Siqueira Campos – o Aribé – e, no rumo sul, até o ‘Carro Quebrado’ – hoje, São José – e a ‘Praia Formosa’ – que, então, eram os limites da cidade -, fazendo cobrança das prestações.
Dois locais, em especial, me chamavam a atenção: a ‘Praça da Catinga’ (hoje, Praça da Bandeira) e o ‘Morro do Urubu’ – atualmente um dos parques da cidade -, no limite final do bairro Industrial, cada um com seus mistérios, especialmente noturnos, onde a escuridão enchia os dois locais de expectativa, surpresas e dúvidas.
(…) O que a memória me pede para publicar hoje é uma crônica que considero ‘um poema’ daquela época, escrita pelo grande homem de imprensa, sergipano com serviços prestados a Sergipe e ao Brasil, que, no período de 1942 a 1945, quando o país esteve envolvido na 2.ª guerra mundial, foi ‘Correspondente de guerra’ fazendo registros memoráveis, que embarcou com a FEB (Força Expedicionária Brasileira) sob suspeita, porque carregava o título de "comunista" – Joel Silveira.
Leiam a seguir o que ele nos deixou sobre o Morro do Urubu; e que essa leitura estimule cada um a visitar aquele local, hoje o Parque da Cidade".
MISTÉRIO DO MORRO DO URUBU (por Joel Silveira)
"As lendas da cidade descem de lá. Ele é trevoso como um morro de mistério. Fica olhando assim para a cidade, com seus mil olhos de sombra e cinza. Parece imenso, o maior morro do mundo. Quem sabe o que existe do lado de lá? Quando eu era pequeno, minha mãe dizia que era o inferno. Eu tinha olhos medrosos para a montanha que mais tarde se tornaria minha amiga.
Margarida me mostrou que o morro é amigo, cheio de caminhos estreitos e floridos, repleto de clareiras que escondem e isolam. Há folhas secas e macias atapetando o chão, e você pode sentar-se lá, bem distante do mundo, bem distante de todos, sozinho com seus pensamentos e seus poemas. Leve sua namorada. Ela ficará mais meiga e mais bela. Ela se encherá daquela tranquilidade, será a mais doce e a mais amiga das namoradas.
E vocês poderão esperar a noite.
Primeiro, uma luzinha longe, bem longe, acendendo e apagando. É o farol – você adivinhou pela tristeza. Depois, outras fileiras de luzes encherão as ruas, e Aracaju ficará riscada como um tabuleiro de xadrez. Tantas estrelas, meu Deus! Todas as estrelas do céu estão brilhando, não falta uma só. Fale para sua namorada das belezas da vida. Acaricie seus cabelos. Eles têm agora o perfume do Morro do Urubu. Seus olhos estão negros e profundos como a noite do Morro do Urubu".
Na terça seguinte, meu pai continuou:
"A memória me transporta para o ‘Morro do Urubu’ e a ‘Praça da Catinga’, ambos no ‘meu tempo de jovem’; revejo-os em pensamento, e, como "o tempo não para" – no dizer de Cazuza -, comparo-os com o que aqueles locais representam hoje.
Quanto ao Morro do Urubu, àquela época só o via, admirava e imaginava o que ele escondia além daquele matagal lindo, verde de todos os matizes; não passava pela minha mente entrar em suas veredas, descobrir seus segredos, saborear o que ele oferecia. Confesso que quando pensava um pouco em tão grande aventura, o medo era mais forte, me fazia tremer, dar um passo atrás, pois, quem sabe, cobras, lagartos gigantes e gatos-do-mato ali estariam, prontos para defender suas posses ameaçadas pelo ‘intruso’; eu me sentia indefeso para enfrentar a aventura de ‘escalar’ o Morro de Urubu.
Feliz foi Joel Silveira, que o escalou e gozou os momentos em que o desfrutou. Felizmente, para todos nós, ele não foi egoísta e registrou (…) tudo de maravilhoso que o morro escondia naquele tempo (…).
Assim, tiro da mente tudo de errado que imaginei sobre aquele local e assumo o Morro do Urubu com todas as nuances descritas por Joel. E me sinto mais leve – passo o seu registro para a minha mente e declaro: ‘era assim, daquele jeito, o Morro do Urubu’.
Hoje, aquela área é um dos melhores locais de lazer da cidade. Local para todos e para tudo, bem cuidado, oferecendo ‘natureza’ para quem enfrenta o asfalto. É o ‘Parque da Cidade’, com sua mata fechada que ainda preserva parte da ‘mata atlântica’, e, em paralelo, lagos, animais preservados, um excelente zoológico, restaurante, ‘clube do chorinho’, sociedade hípica com aplicado trabalho de ‘equinoterapia’ de grandes efeitos técnicos e terapêuticos, e muitos locais para "curtir" a natureza, ler, rezar, meditar, relaxar, e, naturalmente, namorar. Além de tudo isso, e muito mais, um ‘teleférico’ que, compassadamente, proporcionando apreciar o percurso, leva os visitantes para a admiração e uma oração aos pés de ‘Nossa Senhora da Conceição’, imagem da cultura sergipana em louvor à ‘Padroeira da cidade’.
Pronto. O morro de ontem era como Joel Silveira desenhou, imortalizou poeticamente; hoje ele é como eu digo, e quem quiser mais, vá lá. Os portões, dentro dos horários pré-estabelecidos, estão sempre abertos". (…)
* Raymundo Mello é Memorialista
raymundopmello@yahoo.com.br

* Raymundo Mello

(publicação de Raymundinho Mello, seu filho)

Em mais uma feliz e notável iniciativa no  âmbito cultural, a ‘Universidade Tiraden- tes’ – leia-se: ‘Professor Jouberto Uchoa de Mendonça’ – instalou na sua Biblioteca Central, no Campus Farolândia, o ‘Memorial Joel Silveira’, abrigando o acervo que pertenceu ao jornalista sergipano (falecido em 2007) que tanto se destacou no cenário nacional.
Doado por sua família à instituição e ali tratado conforme os princípios museológicos, o acervo compõe um valoroso e agradável espaço, entregue ao público apreciador de memórias na última segunda-feira, 15 de outubro, ‘Dia do Professor’, celebrando, assim, o centenário de Joel Silveira, ocorrido em 23 de setembro passado.
Ao registrar a efeméride, trago para os caros leitores /recortes/ de dois artigos consecutivos publicados por meu pai, o ‘Memorialista Raymundo Mello’, aqui no ‘Jornal do Dia’, edições de 31/05 e 07/06/2016, prestando a sua homenagem a Joel Silveira.  Título original dos textos: "Falando de coisas boas" e "Cumprindo o compromisso", respectivamente.
Assim escreveu Raymundo Mello:
"Na juventude – anos 40 e 50 -, conhecia e frequentava todos os bairros de Aracaju – que eram poucos, então -, a pé, de bondes, marinetes ou nos automóveis de propriedade de meu cunhado, ‘Lúcio Leite’. Ele, apesar de funcionário público federal, representava a empresa ‘São Paulo Studio’, que reproduzia fotos preto-e-branco em cores, trabalho muito apreciado à época. Ele cuidava das "vendas" e quando o produto era negociado a prazo, 3 a 4 parcelas, eu era o encarregado das cobranças mensais no vencimento de cada parcela.
Esse trabalho me facilitava andar muita pela cidade inteira, principalmente entre os bairros Santo Antônio, Industrial, 18 do Forte, Siqueira Campos – o Aribé – e, no rumo sul, até o ‘Carro Quebrado’ – hoje, São José – e a ‘Praia Formosa’ – que, então, eram os limites da cidade -, fazendo cobrança das prestações.
Dois locais, em especial, me chamavam a atenção: a ‘Praça da Catinga’ (hoje, Praça da Bandeira) e o ‘Morro do Urubu’ – atualmente um dos parques da cidade -, no limite final do bairro Industrial, cada um com seus mistérios, especialmente noturnos, onde a escuridão enchia os dois locais de expectativa, surpresas e dúvidas.
(…) O que a memória me pede para publicar hoje é uma crônica que considero ‘um poema’ daquela época, escrita pelo grande homem de imprensa, sergipano com serviços prestados a Sergipe e ao Brasil, que, no período de 1942 a 1945, quando o país esteve envolvido na 2.ª guerra mundial, foi ‘Correspondente de guerra’ fazendo registros memoráveis, que embarcou com a FEB (Força Expedicionária Brasileira) sob suspeita, porque carregava o título de "comunista" – Joel Silveira.
Leiam a seguir o que ele nos deixou sobre o Morro do Urubu; e que essa leitura estimule cada um a visitar aquele local, hoje o Parque da Cidade".

MISTÉRIO DO MORRO DO URUBU (por Joel Silveira)
"As lendas da cidade descem de lá. Ele é trevoso como um morro de mistério. Fica olhando assim para a cidade, com seus mil olhos de sombra e cinza. Parece imenso, o maior morro do mundo. Quem sabe o que existe do lado de lá? Quando eu era pequeno, minha mãe dizia que era o inferno. Eu tinha olhos medrosos para a montanha que mais tarde se tornaria minha amiga.
Margarida me mostrou que o morro é amigo, cheio de caminhos estreitos e floridos, repleto de clareiras que escondem e isolam. Há folhas secas e macias atapetando o chão, e você pode sentar-se lá, bem distante do mundo, bem distante de todos, sozinho com seus pensamentos e seus poemas. Leve sua namorada. Ela ficará mais meiga e mais bela. Ela se encherá daquela tranquilidade, será a mais doce e a mais amiga das namoradas.
E vocês poderão esperar a noite.
Primeiro, uma luzinha longe, bem longe, acendendo e apagando. É o farol – você adivinhou pela tristeza. Depois, outras fileiras de luzes encherão as ruas, e Aracaju ficará riscada como um tabuleiro de xadrez. Tantas estrelas, meu Deus! Todas as estrelas do céu estão brilhando, não falta uma só. Fale para sua namorada das belezas da vida. Acaricie seus cabelos. Eles têm agora o perfume do Morro do Urubu. Seus olhos estão negros e profundos como a noite do Morro do Urubu".

Na terça seguinte, meu pai continuou:"A memória me transporta para o ‘Morro do Urubu’ e a ‘Praça da Catinga’, ambos no ‘meu tempo de jovem’; revejo-os em pensamento, e, como "o tempo não para" – no dizer de Cazuza -, comparo-os com o que aqueles locais representam hoje.
Quanto ao Morro do Urubu, àquela época só o via, admirava e imaginava o que ele escondia além daquele matagal lindo, verde de todos os matizes; não passava pela minha mente entrar em suas veredas, descobrir seus segredos, saborear o que ele oferecia. Confesso que quando pensava um pouco em tão grande aventura, o medo era mais forte, me fazia tremer, dar um passo atrás, pois, quem sabe, cobras, lagartos gigantes e gatos-do-mato ali estariam, prontos para defender suas posses ameaçadas pelo ‘intruso’; eu me sentia indefeso para enfrentar a aventura de ‘escalar’ o Morro de Urubu.
Feliz foi Joel Silveira, que o escalou e gozou os momentos em que o desfrutou. Felizmente, para todos nós, ele não foi egoísta e registrou (…) tudo de maravilhoso que o morro escondia naquele tempo (…).
Assim, tiro da mente tudo de errado que imaginei sobre aquele local e assumo o Morro do Urubu com todas as nuances descritas por Joel. E me sinto mais leve – passo o seu registro para a minha mente e declaro: ‘era assim, daquele jeito, o Morro do Urubu’.
Hoje, aquela área é um dos melhores locais de lazer da cidade. Local para todos e para tudo, bem cuidado, oferecendo ‘natureza’ para quem enfrenta o asfalto. É o ‘Parque da Cidade’, com sua mata fechada que ainda preserva parte da ‘mata atlântica’, e, em paralelo, lagos, animais preservados, um excelente zoológico, restaurante, ‘clube do chorinho’, sociedade hípica com aplicado trabalho de ‘equinoterapia’ de grandes efeitos técnicos e terapêuticos, e muitos locais para "curtir" a natureza, ler, rezar, meditar, relaxar, e, naturalmente, namorar. Além de tudo isso, e muito mais, um ‘teleférico’ que, compassadamente, proporcionando apreciar o percurso, leva os visitantes para a admiração e uma oração aos pés de ‘Nossa Senhora da Conceição’, imagem da cultura sergipana em louvor à ‘Padroeira da cidade’.
Pronto. O morro de ontem era como Joel Silveira desenhou, imortalizou poeticamente; hoje ele é como eu digo, e quem quiser mais, vá lá. Os portões, dentro dos horários pré-estabelecidos, estão sempre abertos". (…)

* Raymundo Mello é Memorialistaraymundopmello@yahoo.com.br

 

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