Fazendo história com as palmas das mãos
Na pele do tambor
Publicado em 07 de fevereiro de 2019
Por Jornal Do Dia
Há algo de primitivo no apelo de um tambor. Foi atraído pelo chamado ancestral e uma pontinha da curiosidade mais vulgar que pisei uma vez no chão sagrado de um terreiro. Havia, sim, alguma magia no ar, a beleza ritual de uma comunhão festiva com o mistério. Mulheres em saias vermelhas de ciganas bebiam e dançavam possuídas pela graça, um espetáculo de línguas estranhas, adivinhações, súplicas e sentido. Tudo impressionava, tudo vibrava, mas eu pouco vi do culto. A música dos atabaques ecoava sem descanso. Ali, eu era todo ouvidos.
É mais ou menos essa a promessa guardada nas apresentações do grupo Burundanga Percussivo, agora dedicado a uma série de ensaios no mais praieiro de todos os bares da cidade, o sempre bem freqüentado Bar Paraty. Embora a intenção seja outra, mais imediata e mundana, a reunião promovida pelo maestro Pedro Mendonça terá sempre um dado de resgate. Basta um comando e os tambores quase sempre calados da gente sergipana transbordam em sopapos de alegria, até onde eu sei a única surra que o lombo cansado do povo gosta.
O maestro Pedro Mendonça escreve assim, com a palma das mãos, mais um belo capítulo da música Serigy. Depois de colaborar com artistas e projetos diversos, notadamente o grupo Membrana o terceto instrumental Café Pequeno, coloca agora a percussão no centro do palco, sob aplausos e holofotes. A oportunidade não poderia ser mais feliz. O pulso forte, a marcação cerrada, o acento expansivo, honram a nossa vocação cultural para a festa.
Fé e farra, cultura e religiosidade. O leitor mais rigoroso talvez torça o nariz para os imperativos aparentes na página. Nada mais equivocado. Na pele do tambor, convivem todos os opostos. Daí a comunicação sem reservas, imediata.
Ensaios de Verão do Burundanga com Bento Adami e Convidados:
10, 17 e 24 de fevereiro, às 13 horas, no Paraty (Rodovia José Sarney).