VELHAS NOVIDADES
Publicado em 23 de agosto de 2020
Por Jornal Do Dia
Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos
Em 1994, Gilberto Gil trouxe à tona uma discussão ainda muito atual. No CD Unplugged (Acústico), há uma canção que traduz em grande medida a questão das velhas ideias em novos rótulos ou dos remendos novos em panos velhos. Trata-se da faixa 1: "A Novidade". Os versos a seguir dizem muito dos nossos dias: "E a novidade que seria um sonho / O milagre risonho da sereia / Virava um pesadelo tão medonho".
Na cultura popular, diz-se da sereia que ela tem a capacidade de fascinar e atrair pelo canto e pelo encanto. Como de certo têm sido a falácia, o discurso e o panegírico do nosso tempo e dias. As falas envernizadas de bondade, os elogios baratos, os tapinhas nas costas e ventos de transformação e de mudança. A venda da esperança em bandejas de ouro, metal barato forjado no fogo da mentira e das intrigas e nas manobras palacianas ou ao pé do ouvido.
Alguns anos antes, em 1978, Caetano Veloso disse em "Sampa": "E à mente apavora o que ainda não é mesmo velho". O genial compositor baiano também não deixa a desejar quando o assunto é novidade. Pois a novidade ela sempre teve esta capacidade de impactar, de gerar no mínimo dois movimentos e desconfianças: de quem é velho, que não sente no novo consistência (por falta de experiência); e do próprio novo que se pergunta até onde vai a novidade da novidade.
"Devemos aprender durante toda a vida, sem imaginar que a sabedoria vem com a velhice" (Platão). À época do famoso filósofo grego, a quem se atribue esta frase, velho era sinônimo de confiança e poder. As antigas sociedades, cujas pessoas não viviam muito tempo para envelhecer, organizavam suas estruturas administrativas, legando maiores responsabilidades aos anciãos.
Ainda sobre a novidade, lhe dão como descrédito a falta de memória, não somente por não gozar de tempo para consolidar e deixar legados. Mas, sobretudo, quando a semântica da palavra assume a peja do esquecer do combinado, do esquecer de somar, esquecer de que o novo tem telhado de vidro. De que estamos falando mesmo?
Ah, sim! Da novidade. Que na canção "Nunca mais poder", da banda Engenheiros do Hawaii (CD O papa é pop – 1990), assume uma faceta muito peculiar e especial, particularmente definidora do que estou propondo como discussão neste texto: "Todo mundo é moderno / Como um relógio antigo"
E na política não é diferente: novo tempo, nova política, o novo que é velho se apresentando como novo, novos caciques com roupagens e práticas de velhos caciques, nova democracia e nova ditadura… Todo mundo quer ser novo, mas não inova. Todo mundo quer inovar, mas não muda de fato. E vamos nessa toada, como gado marcado, para as urnas de tempos em tempos, seduzidos pela novidade.
Perdoem-me o pessimismo do momento e peço que ele não os afete negativamente em suas escolhas e posicionamentos, mas permitam-me dizer o que penso sobre a novidade no campo político partidário de então, mais como reflexão do que como atitude de alguém que joga a toalha: no Brasil, a política é a arte de enganar os tolos e de fazer sábios os idiotas. Dar crédito a papagaios de pirata e a aberrações democráticas. De iludir os bem-intencionados e de fazer grande os imbecis. Alguma novidade nisto? Talvez não: só a forma de dizer e de sentir na pele.