A indispensável condição na vida moderna
Publicado em 25 de agosto de 2020
Por Jornal Do Dia
No mundo "apressado" em que vivemos, fruto de uma sociedade tão consumista, individualista e indiferente, e com opiniões tão massificadas, o silenciar por alguns minutos é como encontrar um poço de águas límpidas quando se está num deserto morrendo de sede…
* Raymundo Mello
(publicação de Raymundinho Mello, seu filho)
Tenho trabalhado muito. A necessidade de isolamen to social – apenas físico – que a pandemia do vírus maldito infligiu, trouxe como alternativa de trabalho o "home-office", e, então, o lar, costumeiramente um lugar de descanso, pelo menos pra mim, virou sinônimo de trabalho quase o tempo todo. Dia desses, cansado após um dia bem laboral, deitei-me no sofá e, sob pouca luz, pus-me a refletir sobre o quanto as pessoas hoje em dia preferem "repetir como papagaio" as opiniões que ouvem, sem, contudo, dedicarem alguma fração de seu tempo à ‘reflexão’ sobre os fatos. E na maioria das vezes emitem comentários sem qualquer fundamento e ainda se desdobram em discussões pífias e inúteis, defendendo opiniões que não lhes são próprias, posto que nelas "pegam carona". Exemplo disto são as incontáveis mensagens idênticas que recebemos diariamente através das redes sociais, pelos desmedidos e incômodos encaminhamentos.
‘Sêneca’ (Lucius Annaeus Seneca), um filósofo não tão citado pelos doutos de plantão, mas célebre advogado, escritor e intelectual do Império Romano, que viveu entre os anos 4 a 65 d.C., já pensava sobre esta peculiaridade não tão apreciável dos seres ditos humanos que, no nosso tão "evoluído" século XXI, parece aperfeiçoar-se.
Sobre o assunto, transcrevo um trecho extraído do Texto I do livro "Da felicidade", do filósofo Sêneca, para deguste dos prezados leitores que nos acompanham neste artigo semanal das terças-feiras.
Diz Sêneca: "Nada é mais importante que não seguir como ovelhas o rebanho dos que nos precederam, indo assim não aonde querem que se vá, senão aonde se deseja ir.
E, certamente, nada é pior do que nos acomodarmos ao clamor da maioria, convencidos de que o melhor é aquilo a que todos se submetem, considerar bons os exemplos numerosos e não viver racionalmente, mas sim por imitação.
Daí, a grande quantidade de pessoas que se precipitam umas sobre as outras. Como acontece em uma grande catástrofe coletiva, quando as pessoas são esmagadas, ninguém cai sem arrastar a outro, e os primeiros são a perdição dos que os seguem. Isso tu podes ver acontecer ao longo da vida; ninguém erra por si só, apenas repete o erro dos outros.
É prejudicial, portanto, apegar-se aos que estão à tua frente, ainda mais quando cada um prefere crer em lugar de julgar por si mesmo, deixando de emitir juízo próprio sobre a vida. Por isso, adota-se, quase sempre, a postura alheia. Assim, o equívoco, passando de mão em mão, acaba por nos prejudicar.
Morremos seguindo o exemplo dos demais. A saída é nos separarmos da massa e ficarmos a salvo. Mas agora as pessoas entram em conflito com a razão em defesa de sua própria desgraça".
Acrescento, para mais instigar o pensar dos caros leitores, aquela famosa frase que aparece no final dos capítulos nas novelas e seriados e em alguns filmes: "Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência".
Concluo o artigo recomendando que, pela carência de bom senso tão visível na contemporaneidade insípida, celebre-se mais constantemente o "7 de maio", o "Dia do Silêncio". Um dia que muito diz, sem precisar que nada se diga…
Como sou um admirador do ‘silêncio’ e o considero tão vital quanto o ar que respiro, celebro a data nos 365 dias do ano. Para mim, todo dia é dia de se fazer um pouco de silêncio. No mundo "apressado" em que vivemos, fruto de uma sociedade tão consumista, individualista e indiferente, e com opiniões tão massificadas, o silenciar por alguns minutos é como encontrar um poço de águas límpidas quando se está num deserto morrendo de sede…
No seu belo artigo "São José, o santo do silêncio" – publicado na edição n.º 3.818, de 17 e 18/03/2016 do nosso ‘Jornal do Dia’ – o nosso prezadíssimo ‘Arcebispo Emérito de Maceió, Dom Edvaldo Gonçalves Amaral, SDB’ (que aqui escreve regularmente às quintas-feiras), assim se expressa:
– São José foi o santo do silêncio. Diante dos evidentes sinais da misteriosa maternidade virginal de Maria, José, o homem justo, soube guardar silêncio heróico, que muito lhe custou. Em todo o Evangelho, não se lê uma única palavra sua, nem na busca de uma pousada em Belém para Maria, que estava para dar à luz o Deus Menino, nem diante dos pastores e dos Magos que vieram adorá-lo, nem na fuga para o Egito, nem na perda de Jesus no Templo aos 12 anos (só Maria fala em nome dos dois), nem, afinal, nos longos anos vividos em Nazaré, com Maria e Jesus, criança, adolescente e homem feito. São José é o santo do silêncio, patrono da vida contemplativa. Paulo VI chama o silêncio "a admirável e indispensável condição do espírito, na vida moderna barulhenta e hipersensibilizada". E que São José com seu silêncio "nos ensine o recolhimento, a interioridade, a disposição para escutar as boas inspirações e as palavras dos verdadeiros mestres. Que ele nos ensine a necessidade da meditação, da vida pessoal e interior, da oração que só Deus escuta no segredo".
Que assim seja!
* Raymundo Mello é Memorialistaraymundopmello@yahoo.com.br