CULTURALISMO, SÍLVIO ROMERO E JORGE CARVALHO
Publicado em 01 de maio de 2021
Por Jornal Do Dia
Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos
A primeira vez que tive acesso à primeira edição do livro A Cultura Ocultada, de Jorge Carvalho do Nascimento, foi no dia 16 de novembro de 1999, com uma dedicatória que guardo com carinho até hoje, onde ele se dirige a mim como "inteligência jovem". À época, estava iniciando meu Mestrado em Educação pela Universidade Federal de Sergipe. Ele era nosso professor de História da Educação Brasileira, quando pude aprender muito, além de aprofundar nossa amizade, iniciada ainda na graduação em História, no início dos anos 90, também pela UFS.
Ainda lembro como tive a graça de ter aquele livro ofertado por suas mãos. Havia terminado a aula, no final da manhã, e eu e um colega precisávamos ir ao centro de Aracaju. Sem carro, Jorge nos ofereceu uma carona até a praça Camerino. No caminho, havia alguns exemplares no banco de trás. Comecei a folhear um deles e ao final da carona, ele encostou o carro e autografou dois: um pra mim e outro para meu colega.
Saí do carro efusivo e feliz pela gentileza do mestre. Naquela mesma semana, o li num único fôlego, fazendo anotações que depois foram muito úteis, não somente para minha dissertação de mestrado, mas também para minha tese de doutorado, desta feita em História, pela Universidade Federal de Sergipe. Em ambas as oportunidades, pude refletir o ambiente intelectual do final do século XIX e sua interface com a educação sergipana e lagartense, nesse último caso no que se refere às práticas escolares levadas a termos pelo padre Álvares Pitangueira, no povoado Urubutinga.
Vinte dois anos depois, Jorge Carvalho repete aquele gesto de carinho para comigo, encaminhando para minha residência, em Lagarto, um exemplar da segunda edição de A Cultura Ocultada, desta feita pela editora Criação, da competente Adilma Menezes, cujos trabalhos tem merecido a atenção de muitos escritores sergipanos nos últimos anos.
Prefaciado pelo presidente da Academia Sergipana de Letras, Dr. José Anderson Nascimento, a segunda edição está mais encorpada, com uma nota explicativa do autor, mantendo a tônica analítica de seu objeto de pesquisa: a circulação e difusão das ideias alemãs do final do século XIX, que tiveram na Escola do Recife, notadamente em Tobias Barreto e Sílvio Romero, seus principais expoentes.
Para José Anderson Nascimento: "A linha mestra da obra de Jorge Carvalho do Nascimento está na análise da contribuição de Tobias Barreto para a formação do Brasil, destacando o seu enfoque à educação, principalmente à educação e emancipação da mulher" (p. 9).
Tobias foi um dos primeiros defensores do legado da cultura pela educação na história, desqualificando as explicações e afirmações eugênicas de superioridade da raça branca e inferioridade das demais. Assim, a seu ver, a cultura não era um elemento de herança biológica, mas sim de aquisição por meio da aprendizagem e do saber. Prova disso é que muitos mestiços e até mesmo negros conseguiram produzir exímios nomes e representantes da inteligência humana.
"A Cultura Ocultada" revela, em detalhes e com forte evidenciação histórica, a sagacidade dos ocultadores em esconder a valiosa contribuição da Escola do Recife, por exemplo, consubstanciada em seus maiores representantes de origem sergipana: Sílvio Romero e Tobias Barreto. Os mais otimistas jamais teriam percebido que o século XIX supera a visão centralista dos escolanovistas. A produção cultural desse período estava longe de ser reduzida ao meramente tradicional ou não inovador, deixando entrever, desde então, uma concepção modernizada de educação na sociedade brasileira que não vingou por não corresponder às intenções ideológicas-políticas da época.
Incansável, o sexagenário Jorge Carvalho tem contagiado a todos nós semanalmente com seus textos e vem numa produtividade literária sem igual. Prepara para os próximos meses mais uma pérola, o livro Julho, como ele mesmo define: "uma pequena novela policial". Vida longo, querido mestre! A cultura sergipana agradece.