A FOLHA SECA, AMADO BATISTA E OS TIPOS POPULARES
Publicado em 29 de maio de 2021
Por Jornal Do Dia
Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos
No início dos anos 80, costumava curtir a programação da AM Progresso, em Lagarto. Grandes sucessos populares marcaram aquela época e eu, particularmente, gostava muito da trilha sonora e ela acompanhou boa parte de minha infância e adolescência. Na casa de minha mãe e até hoje em minha casa, tínhamos o hábito de ouvir rádio. E foi numa daquelas ocasiões que conheci uma canção, que até hoje é a marca registrada de um dos grandes cantores do país.
"O Fruto Do Nosso Amor (Amor Perfeito)" é a primeira faixa do Lado B do disco "Sementes de amor", de Amado Batista, lançado em 1978 pela Continental. O segundo de uma consagrada carreira iniciada em 1975, com a gravação de um compacto. Com aquela canção, o artista ganhou repercussão nacional e nunca mais saiu das paradas de sucesso do cancioneiro popular brasileiro.
De autoria de Vicente Dias / Praiao Ii, "Amor perfeito" traz uma história triste de amor, com um desfecho trágico: "No hospital, na sala de cirurgia / Pela vidraça eu via / Você sofrendo a sorrir / Vi seu sorriso / Aos poucos se desfazendo / Então vi você morrendo, / Sem poder me despedir". A melodia é singular e colabora para a toada triste e melancólica. Atingiu em cheio a sensibilidade dos brasileiros, notadamente os mais simples e humildes e também os com sensibilidade apurada, não importando a classe ou a condição social.
Amado Rodrigues Batista completou 70 anos no último dia 17 de fevereiro. É natural do interior de Goiás, de uma fazenda na atual cidade de Davinópolis, antiga Catalão. Com 46 anos de carreira, mais de 40 discos gravados, inúmeras premiações, como discos de ouro, platina e diamante, segue sendo um dos artistas mais bem-sucedidos do gênero popular ou pejorativamente chamado de brega.
Em 2019, regravou com Simone e Simaria, o sucesso "Folha Seca" (1984). Uma bela canção que tem um de seus tipos marcantes de sua carreira. A letra é uma parceria do cantor com Reginaldo Carvalho e narra uma inusitada história de amor entre um solteiro e uma "moça da vida", pobre e desabrigada, que foi acolhida em sua casa e depois, do nada, o deixou. Dois versos são expressivos e traduzem a essência da canção: "Fazia um dia bonito quando ela chegou / Era uma tarde tão triste quando ela partiu".
Ao longo de sua carreira, Amado Batista criou e interpretou inúmeros tipos populares. Vejamos alguns. "O lixeiro e a empregada" (1982); "Casamento forçado" (1984), uma ode ao marido infeliz; "Menininha, meu amor" (1985), um clássico do gênero popular; "Seresteiro da Noite" (1985); "Princesa" (1991): "(…) deusa da minha poesia"; "Não quero falar com ela" (1998); "Secretária" (2001), uma reflexão sobre os limites entre o flerte, a paquera e o assédio sexual; "O pobretão" (2004); e "Amigo" (2005), com Eduardo Costa.
Historicamente estigmatizado, o gênero musical que levou Amado Batista ao estrelato ainda não se livrou das amarraras dos críticos e puritanos de plantão. Luã Diógenes, em matéria recente para o Diário do Nordeste, afirmou que "(…) o brega não envelhece e segue sendo um dos estilos mais queridos do Brasil". Trata-se de uma narrativa da vida do povo brasileiro, no que ela tem de mais autêntica e espontânea, real e verdadeira, sem enfeites e embustes poéticos.
Nesse sentido, seguramente, Amado Batista, ao lado de tantos outros de sua época, vivos ou não, está entre aqueles que sabem traduzir o sentimento das pessoas, suas alegrias, decepções, esperanças e tristezas. Suas canções também ajudam a desnudar os inúmeros preconceitos que poluem a boa convivência social, como na canção com Elias Wagner, "Sou igualzinho a você", regravada em 2016, sobre um jovem apaixonado numa cadeira de rodas: "Mas isso não me faz um grande perdedor / Nem tão pouco estou fora de forma / Eu sou um cidadão como outro qualquer".