Democracia em tempos atuais
Publicado em 18 de novembro de 2021
Por Jornal Do Dia
“O talento se desenvolve na solidão, o caráter no rio da vida.” (Autor desconhecido)
* Hely Ferreira
O nascimento da democracia na cidade de Atenas tinha um significado profundo. O próprio nome literalmente significa “poder do povo”. Apesar da força popular e o papel relevante dos sofistas como mestres da argumentação nas assembleias, muitos acreditam que o declínio da democracia ateniense ocorreu justamente por causa dos arrazoados relativistas decantados por eles. Em um cenário em que se tinha a verdade como requisito, o discurso foi perdendo credibilidade.
Sem morrer de amores pela democracia ateniense, no diálogo intitulado Protágoras, o filósofo Platão relata que Mercúrio resolveu fazer a seguinte indagação a Júpiter: “Como deve ser distribuída a arte política, se a mesma deve ser como as outras artes, entre os competentes”? Júpiter respondeu que “a arte política deve ser distribuída a todos”. Na mesma linha de raciocínio, diz o jusfilósofo contemporâneo Norberto Bobbio, que “a diferença entre a arte política e as outras artes é que não se ensina, e esta não se ensina porque é patrimônio de todos…”
Quando nos reportamos ao pensamento aristotélico, segundo o estagirista, a democracia a grosso modo é inferior à aristocracia. O motivo é que ela fundamenta-se em uma falsa presunção de igualdade. Ela “nasce da teoria de que aqueles que são iguais em determinado aspecto, são iguais em todos os demais: como os homens são igualmente livres, eles alegam ser absolutamente iguais”. Sendo assim, a democracia encontra-se amparada na isonomia, mas segundo Aristóteles é justamente o problema, pois a democracia cria uma falsa ideia de que todos são iguais perante a lei.
Chegando ao período medieval, o Direito se torna responsável direto, pela teoria da soberania popular, influenciado pelo jurista Ulpiano. Segundo ele, “o povo cria o Direito não através do voto, dando vida às leis, mas também, dando vida aos costumes”.
A teoria política moderna é herdeira direta de Maquiavel. O secretário de Florença foi inovador em vários aspectos. Basta lembrarmos de que ele não se preocupou em apresentar um modelo de como deve ser a política, mas como realmente ela é. A partir daí, até os nossos dias, tornou-se necessário lembrar de que os antigos viam a democracia como algo em que os cidadãos participavam diretamente. A democracia atual é representativa. Elegem-se pessoas para representar o povo. Atualmente nas democracias o voto não é para decidir, mas para escolher quem irá decidir. Disse Hans Kelsen que o que se tem é uma democracia real, já que a ideal não existe em nenhum lugar.
Um cientista social, ou um historiador, em tempos atuais, certamente se arriscará bastante em prever qual será o futuro da democracia. Em especial no Brasil, pois, certamente se deparará com o velho populismo, o messianismo e a sociedade conservadora. Temas emblemáticos e difíceis de combatê-los.
Hely Ferreira é cientista político