Uma odisseia no trânsito aracajuano
Publicado em 23 de novembro de 2021
Por Jornal Do Dia
* Lacerda Júnior
Por conta do constante aumento da gasolina fui obrigado a viver uma aventura que há muito tempo não vivia, deixei o carro em casa e passei a ir trabalhar utilizando o transporte coletivo de passageiros da nossa querida Aracaju. No primeiro dia que me aventurei nessa odisseia, de cara, já tomei um susto, após correr para conseguir alcançar o ônibus, entrei no veículo, peguei as moedas para pagar a passagem e passei um longo período observando o cenário e me perguntando: Onde está o cobrador? Visualizei a catraca, o validador para os que pagariam com o cartão de passagens, mas não visualizei este importante profissional que marcou minha infância, já que todas as vezes que tentava entrar pelo fundo do ônibus sem pagar a passagem ele dizia carinhosamente: Desça! Será que ele teria ido ao banheiro do ônibus? Mas observei que a estrutura do veículo era a mesma que eu conheci ainda na década de 1990, ou seja, não poderia estar no banheiro porque o veículo não o possuía. Desalentado sentei nas cadeiras que antecediam a catraca para tentar entender como pagaria a passagem com minhas moedas. Foi aí que tomei um baita susto: O cobrador era o motorista! Ou seria o motorista que era o cobrador? Sei lá! Ficou difícil de entender.
Durante o percurso, com o veículo em movimento, percebi que o motorista dirigia o veículo, cobrava as passagens, auxiliava o elevador de cadeirantes, abria e fechava as portas, além de ter que “gravar” a fisionomia de quem pagava com dinheiro para que quando este conseguisse superar a multidão que se aglomerava antes da catraca liberar a passagem.
Cheguei em casa chocado com tudo o que vi, além da precariedade do veículo que embarquei, aquela situação de extremo risco de um sinistro de trânsito, tendo em vista que aquela situação de trabalho não permite que o condutor concentre sua atenção apenas na via, mas acaba trabalhando com a atenção dividida, colocando em risco sua vida e a de centenas de pessoas transportadas.
O Código de Trânsito Brasileiro em seu artigo 252 preceitua que dirigir o veículo realizando a cobrança de tarifa com o veículo em movimento se constitui uma infração de trânsito de natureza média punível com multa. O legislador ao tipificar a infração deveria ter agravado a natureza da mesma por conta do extremo risco de dano que a conduta oferece, porém, essa não foi a única infração cometida, pois ao proceder a liberação da catraca enquanto dirige o condutor também infringe o artigo 169 do CTB, que preceitua que dirigir sem atenção ou sem os cuidados indispensáveis a segurança se constitui uma infração de natureza leve também punível com multa, apesar das diversas infrações possíveis por conta do excesso de atribuições do motorista,percebe-se que a fiscalização das infrações não ocorre de forma efetiva.
O motorista de ônibus, além das inúmeras funções que lhe foram atribuídas, ainda precisa lidar com itinerários complicados com curto espaço de tempo para conclusãoem um trânsito conflituoso que mistura em uma mesma pista diversos modais.
Ao final da minha primeira aventura, na odisseia do trânsito aracajuano,percebi que a cada dia o usuário do transporte coletivo de passageiros, corre o risco de ser envolvido em graves sinistros de trânsito por conta da falta de fiscalização das condutas infracionais por parte das autoridades competentes.
Agora vou precisar abandonar este texto e correr pra pegar meu ônibus que já está chegando. Que saudades de quando o preço da gasolina permitia ir trabalhar na segurança e conforto do meu carro.
* Lacerda Júnior, especialista em Segurança e Educação para o Trânsito