OS CAMINHOS DE RESISTÊNCIA DO FUTEBOL FEMININO NO BRASIL (III)
Publicado em 26 de julho de 2023
Por Jornal Do Dia Se
* Vânia Azevedo e Thauan Fonseca
A revogação da lei que proibia as mulheres jogarem futebol no Brasil ocorreu no final da década de 1970, porém esse fato não foi suficiente para mudar o cenário da modalidade no país. O desinteresse das federações e clubes em gerir o futebol feminino permaneceu inalterado, haja vista que a queda do decreto lei não representou uma ação capaz de modificar a mentalidade de uma sociedade predominantemente machista, razão suficiente para que as proibições se mantivessem em curso.
Os costumes que predominavam na sociedade traziam consigo o ranço do patriarcalismo, de maneira que, a rejeição à adesão da mulher ao futebol não estava restrita apenas aos homens, mas a todo o contexto social vigente. Surpreendentemente, havia segmentos da sociedade liderados por mulheres que não escondiam a sua rejeição; razão que se explicava pela influência naturalmente exercida por instituições conservadoras que possuíam voz na sociedade. Porém, o tempo foi mestre em mostrar que a força de um propósito é capaz de resistir a todo tipo de opressão, especialmente quando o desejo de fazer um fato novo acontecer se agiganta conforme cresce adeterminação dos envolvidos.
Foi assim que, em 1983, finalmente a regulamentação do futebol feminino se torna uma realidade, e a partir daí o futebol passa a ser praticado sem ressalvas, inclusive tendo permissão até mesmo para a sua prática nas escolas. Sob a liderança de grandes jogadoras, novas possibilidades surgiram, oportunizando a criação de um calendário para as competições do futebol feminino; e jogar em um estádio de futebol deixou de ser um sonho, para se tornar uma grata realidade.
As equipes do Radar e Saad – pioneiras no profissionalismo – protagonizaram esse momento de evolução, representando a nova força do futebol feminino; reacendendo no coração dos torcedores a esperança de finalmente iniciar um ciclo de realizações e afirmação, como resultado do esforço, da luta e determinação daqueles que sempre acreditaram no êxito do futebol feminino do Brasil.
No entanto, somente em julho de 1986 acontece a primeira convocação da seleção brasileira feminina. Na ocasião o Brasil enfrentou os Estados Unidos (perdendo por 2 x 1), empatando em seguida com a China – resultado que representou para as meninas do Brasil um começo animador.
De volta aos gramados no exterior, participaram de um torneio experimental na Chinaorganizado pela FIFA, ocasião em que (como reflexo do descaso da CBF), utilizaram uniformes anteriormente utilizados pela seleção masculina. Ainda assim, a questionável logística e as condições a que se submeteram para estar na competição não impediu que conquistassem um honroso terceiro lugar, derrotando as donas da casa.
Desde então verificou-se a crescente evolução da modalidade, e o Brasil tem estado presente em todas as edições da Copa do Mundo de futebol Feminino. Ainda que a diferença de tratamento entre os gêneros sempre tenha sido imensa, elas sempre fizeram das dificuldades que permearam os caminhos da mulher no futebol um fator de superação e resistência. E foram exatamente essas campanhas, motivadas pelo ideal de superação, asresponsáveis pela visibilidade alcançada, permitindo que nossas jogadoras atuem nas melhores equipes do futebol mundial, e alcancem o nível técnico que a seleção brasileira hoje possui. Esse cenário de valorização já nos permite sonhar e acreditar nesse expresso verde/amarelo de talentos e muita história. Graças a nomes como Pretinha, Roseli, Sissi, Formiga, Marta e Cristiane, que deram identidade à nossa seleção e serviram de base para o futebol feminino obter o respeito que hoje possui.
Entretanto, nada foi fácil, nem tampouco por acaso. Nos bastidores estiveram atuando nomes que precisam ser lembrados e que foram fundamentais para potencializar a garra e determinação das nossas meninas; guiando-as pelos caminhos do aprendizado, para fazer florescer a tríade do sucesso: talento, técnica e garra.
* Vânia Azevedo é professora aposentada da SEED e Universidade Tiradentes; escritora; Thauan Fonseca é mestrando de História (UFRB)