Terça, 21 De Janeiro De 2025
       
**PUBLICIDADE
Publicidade

Quarenta anos de solidão


Publicado em 12 de setembro de 2023
Por Jornal Do Dia Se


‘Alucinação’ ainda fere

Rian Santos – riansantos@jornaldodiase.com.br
 
Anna Cañans, uma cantora magrela, nervosà flor da pele, aportará com show dedicado a Belchior em Aracaju (Teatro Atheneu, 28 de setembro, às 20 horas). Faz pensar na longevidade das canções e reaviva a memória do bardo, um balanço sensível: “A nossa esperança de jovens não aconteceu”.
‘Alucinação’ (1976) é um disco definitivo, capaz de atravessar quatro décadas inteiras sem a necessidade de interpor uma única vírgula à compreensão do enunciado. Ainda mais agora. Com Belchior sumido e a estrela do Partido dos Trabalhadores apagada para sempre, o ano da graça de 2016 evoca uma rebordosa em tudo semelhante ao contexto de outrora, quando o ufanismo tropicalista era ultrapassado pelo desencanto pintado em verde e amarelo. A nossa esperança de jovens também não aconteceu.
Embora Caetano e Gil ainda insistissem numa perspectiva colorida da experiência, dois hippies fora de lugar, às vésperas do surto das discotecas, os retirantes refugiados na cidade grande não tiveram chance de curtir a onda boa dos doces bárbaros – méritos artísticos à parte. Entre o Brasil pandeiro aconselhado por João Gilberto e a ficção do nordeste, a solidão das pessoas, homens cinzas, normais.
Bob Dylan na forma, Lennon & McCartney no tutano. Poucos compositores foram tão felizes na assimilação de um dado ambiente quanto o trovador do Ceará. Mas o diálogo mantido com as principais forças sensíveis impulsionadas pela indústria cultural da época não abdicou nunca de um ponto de vista subjetivo, enterrado no próprio umbigo. Conhecedor do próprio lugar, Belchior não permaneceu indiferente às palavras de ordem do seu tempo. Antes, defendeu um desespero genuíno, nenhuma relação com a moda de 1976.
‘Alucinação’ ainda fere. E não é para menos. Ancorado no intervalo entre a euforia antropofágica da música pop made in Brasil e alguma consciência latino-americana, o registro é prova de que a tecnologia não transformará nunca a essência de um povo. Se, por um lado, a globalização derrubou as fronteiras determinando a localização e o fluxo dos bens de consumo culturais, por outro seguimos os mesmos aflitos de sempre, como os nossos pais. 
**PUBLICIDADE



Capa do dia
Capa do dia



**PUBLICIDADE


**PUBLICIDADE
Publicidade