A municipalização do Ensino Fundamental em Sergipe
Publicado em 29 de abril de 2021
Por Jornal Do Dia
Os últimos anos do século XX foram de importante crescimento no número de matrícula no Ensino Fundamental, tanto no Brasil (9%) quanto em Sergipe (12%), atestando o crescimento das redes escolares e a incorporação de segmentos populacionais que historicamente ficaram ao largo da escolarização
*Josué Modesto dos Passos Subrinho
Em artigo anterior, mostramos o processo de mu- nicipalização do Ensino Fundamental no Brasil. Esse processo foi intensificado com o pleno funcionamento do mecanismo de equalização de recursos destinados à educação, no âmbito dos estados, de acordo com o número de alunos matriculados. Inicialmente essa transferência estava restrita às matrículas no Ensino Fundamental, por meio do FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério), que, ao recolher 20% dos impostos e transferências federais recebidos pelo estado e seus municípios – legalmente vinculados à educação, os quais deveriam alcançar o percentual de 25% da receita corrente líquida, em um fundo contábil e, automaticamente repartir entre os municípios e o estado, de acordo com o número de alunos matriculados -, estimulou a oferta de novas vagas e a contratação de docentes e outros profissionais da educação, especialmente em municípios com déficits históricos na oferta de vagas públicas. Alguns estados da Região Norte e Nordeste passaram a receber recursos adicionais do Governo Federal com o propósito de alcançar um mínimo nacional de dispêndio per capta em educação.
Vejamos a evolução da matrícula em Sergipe, por redes:
Quadro I. Sergipe. Matrícula no Ensino Fundamental (em 1.000) e Participação das Redes Escolares
Os últimos anos do século XX foram de importante crescimento no número de matrícula no Ensino Fundamental, tanto no Brasil (9%) quanto em Sergipe (12%), atestando o crescimento das redes escolares e a incorporação de segmentos populacionais que historicamente ficaram ao largo da escolarização, a exemplo das populações rurais e dos estratos populacionais urbanos com menores rendimentos. Em Sergipe, como podemos ver no Quadro I, o total da matrícula no Ensino Fundamental passou de 385.000, em 1995, para 432.000, em 2000. No ano de 1995, a Rede Estadual era a principal ofertante de matrículas, com quase a metade do total (49%); seguida das redes municipais (40%), e, finalmente, as escolas privadas, com 11% das matrículas.
Entre os anos de 2000 e 2020 aparentemente se esgotaram os efeitos de incorporação de populações não escolarizadas e se fizeram mais fortes os efeitos da transição demográfica com a redução do total da população em faixa etária correspondente ao Ensino Fundamental (6 a 14 anos de idade). No Brasil, como um todo, a redução da matrícula na referida etapa, no período citado, foi de 25%. Sergipe apresentou um resultado semelhante; ou seja, teve a mesma redução de 25%.
Quanto à distribuição da matrícula por redes, em Sergipe, a Rede Estadual teve sua participação reduzida de 44%, no ano 2000, para 22%, no ano 2020. Em contrapartida, as redes municipais tiveram sua participação elevada de 48% para 55%. O mais surpreendente, contudo, foi o crescimento das escolas privadas, no mesmo período, de 8% para 23%. Tal comportamento da matrícula nas escolas privadas sergipanas está em consonância com uma tendência nacional, na qual a participação no total da matrícula passou de 9% para 17%, no mesmo período. Ou seja, em Sergipe o crescimento da participação das escolas privadas no total da matrícula no ensino fundamental foi assemelhado ao verificado nacionalmente, porém, com maior intensidade.
Quanto às redes municipais, em Sergipe, atingiram a participação de 55% da matrícula total no ensino fundamental, no ano de 2020, o que consolidou sua hegemonia tanto no âmbito do setor público quanto no total da matrícula. É um resultado parecido com o do Brasil como um todo, onde a participação das redes municipais alcançou 57%.
O resultado global do Brasil não esclarece a heterogeneidade de situações. Há estados que municipalizaram intensamente a oferta de matrículas do Ensino Fundamental e se concentraram na oferta de vagas no Ensino Médio e Técnico. Em alguns casos fizeram também fortes investimentos na criação de instituições voltadas ao Ensino Superior. Alguns estados desenvolveram regimes de colaboração com seus municípios, concomitantemente ao processo de municipalização, permitindo o alcance de melhorias sucessivas nos índices de qualidade da educação. Outros permaneceram com suas redes educacionais estaduais fortemente estabelecidas, e consequentemente a municipalização não evoluiu. Os municípios que haviam avançado na oferta de Ensino Superior, criando autarquias voltadas a esta finalidade e/ou subsidiando entidades comunitárias, tenderam a se retirar do Ensino Superior, sendo substituídos pelas entidades estaduais ou privadas.
Em Sergipe, como pudemos ver pelos dados expostos, a municipalização da oferta de vagas públicas no Ensino Fundamental seguiu a tendência nacional de consolidação da hegemonia das redes municipais. Entre nós, entretanto, a percepção da corresponsabilidade do Estado com o desenvolvimento das redes municipais foi limitada. Tivemos importantes iniciativas fomentadas pelo Estado visando à qualificação dos docentes, inclusive das redes municipais. Quanto ao acompanhamento da qualidade, por meio da fixação de metas de aprendizagem dos nossos estudantes, a efetiva implementação esteve muito aquém do obtido em outros estados, mesmo na rede estadual.
Diversos outros aspectos da expansão do Ensino Fundamental em Sergipe e no Brasil precisam de considerações, desde a subdivisão desta etapa da Educação Básica em anos iniciais e anos finais, os desafios e resultados obtidos por estados e municípios, as articulações do Ensino Fundamental com a Educação Infantil e com o Ensino Médio, entre outros. São aspectos que serão desenvolvidos em futuros artigos.
*Josué Modesto dos Passos Subrinho, secretário de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura – Seduc -, e foi reitor da Universidade Federal de Sergipe e da Universidade Federal da Integração Latino-Americana no Paraná