A perda da soberania
Publicado em 02 de julho de 2014
Por Jornal Do Dia
*Ary Moreira Lisboa
Em 1833, Charles Darwin, de regresso de sua famosa viagem, aportou em Salvador, juntamente com o seu Beagle e tripulação durante algum tempo, onde encontrou uma civilização primitiva, sem educação e muito corrupta, que muito o estarreceu. O inglês, por ser ateu, apesar de sua esposa, Emma, ser de uma religiosidade extrema, provavelmente jamais tenha ouvido falar no Padre Vieira, que duzentos anos antes afirmara que no Brasil o verbo "rapio era conjugado em todos os tempos, modos e vozes". Otávio Mangabeira dizia que a Democracia era uma plantinha tenra que deveria ser regada com muito carinho e cuidado. Foi Delfim Neto quem disse que o mapa do Brasil se assemelha a um pernil, por isso vai sendo fatiado por todos. Ao contrário da Democracia de Mangabeira, a corrupção vislumbrada por Darwin e Vieira jamais foi cuidada tenramente, comprovando a teoria da evolução darwinista. Evoluiu com estarrecedor vigor, bem nutrida que foi pela falta de pudor e caráter. Quanto ao primitivismo por ele apontado, também sofreu evolução, e o mundo todo ficou estupefato ao ver a maneira grosseria, a estroinice, a rambóia como foi recepcionada a Presidente da República pelos torcedores, na abertura dos jogos da Copa, com xingamentos e palavras chulas, agressões verbais e explicitamente com endereço certo. Tal procedimento indignou a jornalista Dora Kramer com seguinte comentário: "Nutro especial ojeriza por palavras chulas, talvez por especial apreço ao idioma de tão variadas e belas possibilidades". (Que tal, João Carlos?). É repetitiva à exaustão que o povo brasileiro tem memória curta, tudo indicando que bebeu muita água do rio Lete, portanto se encontra contaminado, sem vacina, pela lei letéia. Didi, o maestro da Copa de 1958, considerado pela FIFA o melhor jogador dela, apesar do lamento dos paulistas liderados pelos locutores da Rádio Bandeirantes (única a transmitir todos os jogos), Pedro Luiz e Edson Leite, com o aristocrata Mário Moraes como comentarista, jamais se empenhava nos treinos, mas era exuberante durante os jogos. Por isso cunhou: "treino é treino, jogo é jogo". Foi o inventor da famosa e esquecida Folha Seca, cobrança magistral de falta. No jogo contra a França, vencido pelo Brasil por 5 a 2, deixou sua marca, não necessariamente de falta, com curvatura suficiente para balançar a rede dos gauleses. No momento, só se tem falado na Copa das Confederações vencida pelo Brasil, com comparações, certezas de vitórias e esperanças. A imprensa toda, constantemente volta ao tema na Copa das Confederações, esquecida de que cada jogo é um jogo, pois ninguém toma banho na mesma água de um rio. Segundo um jogador alemão, a partida mais importante é a próxima. O que aconteceu no passado não tem a garantia que vá repetir no futuro. Vira e mexe quem ontem foi campeão perde a coroa e até a cabeça. Nada a ver com a Espanha. Tudo indica que a vitória da Copa das Confederações está caminhando para se tornar um maracanaço de 1950, com Barbosa recebendo uma pena perpétua. Com a gloriosa vitória inversamente comparada ao fracasso de 50. No lugar de Barbosa, o vilão execrado, ocupou Neymar Junior (herói). Outro assunto abordado e comentado sem ressalvas, foram os gastos astronômicos para construção dos estádios. Aqui, o Brasil perdeu sua Soberania, entregando-a genuflexo, de mão beijada, a preço vil, do ponto de vista da moralidade, para que a FIFA, não só administrasse todo o evento, mas deliberasse o que deveria ser bebido, comido, vestido, falado, ocupado, inclusive com a venda dos ingressos. A lei letéia volta a ser acionada. Não foram só os gastos em construções de campos, estacionamentos, acessos, vias que absorveram e consumiram o erário. Para proteção das delegações espelhadas pelo continente brasileiro, em doze localidades, mais vultosos gastos foram e são necessários. Aviões, helicópteros, policiais civis, federais, forças do Exército, Marinha e Aeronáutica estão sendo usados. Até navios ficam fundeados nas sedes costeiras. (teriam submarino?) Alguém já se perguntou quanto custa o deslocamento e manutenção de todo este contingente? Enquanto isso, escolas foram preteridas. As estradas conservaram suas precariedades e muitos morreram por falta de assistência médica. Saúde? Onde? E para quê? Se "o sertanejo é, antes de tudo, um forte" (EC). Tem jegue para se locomover, o que dispensa outro tipo de transporte. Lima Barreto, e seu Policarpo Quaresma, jamais aprovaria o procedimento verbal agressivo e sem reticências endereçados à Presidente, impamtes de ódio e rancor. "O ódio é um pensamento que só pode existir na ausência de toda inteligência" (Tennesse Williams). A grosseria também. A compostura e comedimento da torcida dos japoneses tem chamado atenção de todos pela sobriedade, educação, disciplina como se comportam na maior colônia nipônica fora do Sol Nascente. No atual Brasil, não é para ser seguida. É lamentável!
*Ary Moreira Lisboa é advogado e escritor.