Além da bolha

Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br

No mundo real, além das bolhas onde ilustres desconhecidos arrotam valentia e melodias tortas, Música é um grande negócio. Folheio o Estadão, alheio aos protestos de talento genuíno da cena Serigy. Leio o nome de artistas francamente medianos recompensados com números de gente grande. Leio, reflito e concluo que os agroboys por cima da carne seca compreendem o funcionamento das engrenagens que movimentam o tal mercado.
Levantamento feito pela Pró-Música, uma das tantas entidades que representam os interesses dos produtores fonográficos brasileiros, aponta as 200 músicas mais executadas nas plataformas de streaming no país. A canção ‘Mal Feito’, da dupla Hugo & Guilherme com a cantora Marília Mendonça (1995-2021), encabeça o ranking.
No fundo da cova, a cantora continua faturando alto. Ela aparece ainda na terceira posição, com ‘Vai Lá em Casa Hoje’. O rapper carioca Xamã está em segundo lugar na lista com a música ‘Malvadão 3’, única capaz de vencer a hegemonia do sertanejo. Segundo a entidade, o mercado fonográfico brasileiro cresceu pelo sexto ano consecutivo, arrecadando R$ 2,526 bilhões em 2022 – alta de 15,4%.
Desconheço essa gente, torço o nariz para os balanços do sucesso estritamente comercial, mas números assim, tão expressivos, não deveriam ser desprezados por quem se dispõe a fazer música, mesmo aqui no fim do mundo.
Converso com David Gonçalves (leia-se Badalando), músico, produtor, empresário capaz de investir alto, a fim de gerenciar os interesses de artistas independentes sergipanos, com inserção ainda muito acanhada em ambiente virtual. Para além do produto em si – um álbum, um single, um EP -, ele me explica, é preciso dedicar a atenção necessária para o trabalho do artista não se perder no mar de informação que inunda as redes e as plataformas de streaming.
Eu não sei quanto dinheiro Arthur Matos torrou e botou no bolso, até alcançar a marca de um milhão de views no Spotify. Mas é certo que ele não é de fazer concessões, não rebola igual a Anita, não vendeu a alma ao diabo. Arthur faz música com o coração, mas entendeu a necessidade de chegar a ouvidos de carne e osso, capitalizar o próprio talento, mesmo atuando em um nicho de sensibilidade muito específico. De algum modo, Arthur projetou a potência delicada de seu gogó além da bolha. Assim fazem os profissionais de verdade.