Aqui, além…
Publicado em 03 de outubro de 2024
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
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Sob a minha perspectiva, esta página se justifica como um ponto de intersecção sensível entre campos diversos, tais como a Cultura, o Comportamento, a Política.
Quando a amiga Roseneide Bernardo, conhecida pela militância progressista nas trincheiras locais da boa Literatura, solicitou espaço para dar seus próprios pitacos sobre a sucessão na reitoria da Universidade Federal de Sergipe, confirmei o sucesso de um propósito íntimo: o de promover o debate mais amplo possível, com quem se dispusesse a um diálogo franco.
O espaço foi concedido, claro. Assim será enquanto houver jornalistas profissionais e jornais independentes, como este Jornal do Dia.Aqui, além, nos serões da província.
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Racismo institucional na UFS
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* Roseneide Bernardo
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Agora em 2024 acaba a gestão do atual reitor e vice-reitor da UFS. Em 40 anos é a primeira vez que temos um magnífico que não inscreveu chapa para a consulta pública; não apresentou programa de gestão; não participou dos debates, que ocorreram até 12 de março de 2020, mas teve a sorte de ter seu nome e o do seu vice incluídos, pelo ex reitor, na hora da votação pelos conselhos superiores.
É ilegal a eleição nos Conselhos? Não. Aqui na UFS está prevista no Art.22 do nosso Estatuto, desde 1999. Mas o rito democrático de mais de três décadas fora ali quebrado. Os Conselhos Superiores sempre organizaram a lista tríplice a partir das chapas inscritas na consulta pública e somente quando a eleição era de chapa única é que se incluíam outros nomes para a composição da lista, sem que esses nomes pudessem mudar o resultado de quem foi aprovado/a pela comunidade acadêmica.
Tudo bem, são águas passadas. Não adianta chorar o leite derramado, mesmo porque, em tempos de covid matando milhares, nem havia condições para mobilização ou contestação do pleito na justiça.
O problema é que, na total falta de argumentos para defender a manobra que levou o professor Valter à reitoria, alguns apoiadores, detentores de cargos, começaram uma campanha, a meu ver vergonhosa, de tratar a oposição como RACISTA, invisibilizando, inclusive, o fato de termos tido em 2020 uma candidata mulher e negra: a professora Vera Núbia, que inscreveu sua chapa junto com Silvana Bretas, ficando em 2º lugar na consulta, na qual o professor André Maurício e Rozana Rivas ficaram em 1º.
Afinal, o que é racismo para essas pessoas?
O reitor Valter herdou do ex-reitor o caso mais lastimável de RACISMO institucional da UFS, que desde 2014 vinha ignorando a lei de cotas para servidoras/es negras/os, restando um débito de, pelo menos, 41 vagas que não foram destinadas a docentes e servidoras/es negras e negros. O que fez o atual reitor, de 2020 para cá? Foi chamado agora pelo MPF, em junho de 2024, para uma conciliação e prometeu liberar as vagas devidas para o campusa ser construído em Estância.
Não há medidas antirracistas implementadas durante esta gestão. Somente depois do Caso Ilzver, um caso de racismo institucional de repercussão nacional, se criou a Coordenadoria e um edital de Pesquisas em Ações Afirmativas(2023); somente agora(2024) a gestão prometeu ao MPF a criação de uma Pró-reitoria de Ações Afirmativas;
Com setepró-reitorias à disposição nos últimos 4 anos, o atual reitor não nomeou um/a pró-reitor/a negro/a, pois teve que trazer de volta todos os indicados pelo Ângelo, com exceção da Progep, que foi indicada pela interventora de Bolsonaro e, estranhamente, continua no cargo.
O apagamento da memória e essa tentativa de reescrita da história recente da UFS, colocando as legítimas críticas a Valter Joviniano como expressão de “racismo”, parecem atender a um duplo e mal disfarçado propósito: a um só tempo blindar o atual reitor, deixando-o incólume de prestar contas sobre a sua má administração e, também, silenciar a comunidade acadêmica, que teme ser compreendida como racista.
Enfim, como diz o professor KabengueleMunanga: “Racista é todo aquele que convive com a discriminação racial, transformando-a em fenômeno natural.”
* Roseneide Bernardo é Técnica em Assuntos Educacionais desde 25 de outubro de 1994.