CADERNO DE RUMINAÇÕES, de Francisco J. C. Dantas
Publicado em 05 de novembro de 2020
Por Jornal Do Dia
* Antônio FJ Saracura
Francisco Dantas é escritor consagrado pelas obras anteriores. É o grande ficcionista sergipano, um dos maiores do Brasil, atualmente. Bem formado na arte, pois ensinou literatura em universidades no Brasil e no exterior; trabalhou com a matéria que hoje pratica com maestria.
Eu nunca havia lido uma obra dele inteira (em 2012), com a desculpa íntima de que poderia influenciar (polarizar) minha escrita. Afinal, ele é o sol sergipano…
Comonão me encandear?
E, por isso (acho, pois eram sentimentos fluidos), apenas roubava trechos de seus livros nas bibliotecas públicas, nas rodas de leitura e nas livrarias. Banhos de sol. Gloriosos!
E aí aconteceu o lançamento de seu novo livro, Caderno de Ruminações, na Livraria Saraiva, em 31 e maio de 2012; misturei-me à multidão, entrei na fila e consegui (calado) o meu autógrafo.
De posse do livro, não havia como me furtar à leitura…
Quando a concluí, dois dias depois, quedei-me atribulado, como fez o ferreiro Jánus no conto de MikszáthKálman, ao conhecer a ciência. Suas mãos tremeram e ele preferiu abandonar a profissão de cirurgião de cataratas. De que me serviria criar uma obra inferior? Ou cegar o paciente?
E comecei a rabiscar considerações sobre o livro lido, ainda meio encandeado, para ir me acostumando com o novo tempo. Caminhões de elogios encharcaram minha cabeça. A empolgação cega qualquer um.
Amassei os papeis e os joguei fora.
Parei dois dias, até achar uma beira de lagoa na Terra Vermelha onde o canto das saracuras, no final da tarde, fosse o mesmo de antes da leitura.
Talvez tenha esperado demais.
O que me saiu agora são ruminaçõezinhas que, a seguir, compartilho com você, que ainda me segue.
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No início da leitura, estive claudicante, como aluno de dança na primeira aula. Depois, peguei o ritmo da escrita, o jeito da prosa. E o livro fluiu fácil, gostoso, até o final.
"Caderno de Ruminações" conta a história de um médico brilhante que entra em decadência. Tudo que tenta ou que faz dá errado. E a cada dia, sobe mais no seu monte calvário. O autor está perto e não perdoa, acompanha-o, vasculha suas dúvidas (são muitas), seus orgulhos falidos (não são menos), sua paixão suicida por uma prima do ramo perverso da família, (que o maltrata). Essa Analice, mesmo aparecendo pouco, acelera a trama. Ela é gasolina de alta octanagem que faz o avião quebrar a barreira da lógica. Uma Iracema do circo de Zé Bezerra, que fazia os espectadores esquecerem a família para segui-la pelo mundo. Como o fez Zé Bigodinho, vendedor de bilhetes de loterias em Itabaiana, e como eu quase faço, na condição de leitor dessas Ruminações de Francisco Dantas, com Analice.
Há um perfeito entrosamento das palavras, das frases, das partes do enredo. Nada sobra, nada falta. As figuras, apesar de aparecerem em profusão, ajudam no criação dos climas. As palavras e construções eruditas são assimiladas facilmente pelo contexto bem definido. Acho que qualquer autor deve utilizar todos os recursos que a língua oferece. Quem os conhece, sorri contente; os outros (meu caso) sintam-se numa sala de aula proveitosa e aprendam.
O romance é ambientado em Aracaju, o que me deixou muito envaidecido. Estamos deixando de ser o fim do mundo.
Recomendo a leitura do Caderno e, para mim, em especial, recomendo a leitura dos demais livros de Francisco Dantas. Onde eu os achar à venda, darei um jeito de comprá-los. Perdi o medo! Depois do impacto inicial, cresci em busca do tamanho do monstro (sagrado). Na verdade, há espaço para todos. Parar com essa busca desesperada ao ótimo. Ter calma e usufruir os disponíveis, por enquanto.
(Aracaju, 25 de junho 2012, recuperada em 02 de junho de 2019, do blog: Antônio Saracura Sobre Livros Lidos).
* Antônio FJ Saracura, escritor das Academias Itabaianense e Sergipana de Letras