**PUBLICIDADE
Opinião
Publicado em 12 de agosto de 2012
Por Jornal Do Dia
PODER JUDICIÁRIO
Justiça Federal de Primeira Instância
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SERGIPE
1ª VARA FEDERAL
Processo n° 0003307-74.2012.4.05.8500
Classe 1 – Ação Civil Pública
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Réu(s): CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SERGIPE – CREA/SE
DECISÃO
Trato de Ação Civil Pública, movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face do CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SERGIPE – CREA/SE CAIXA, objetivando a determinação para que o requerido se abstenha de negar a expedição das carteiras profissionais dos estudantes graduados e diplomados em 2011 no curso de Engenharia de Pesca da Universidade Federal de Sergipe, em razão de não terem cursado as disciplinas “Cultivos de Peixes Ornamentais” e “Trabalho de Conclusão de Curso”, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para o cada descumprimento constatado.
Narra em suma que, provocado por denúncia “via web”, avistável nas fls. 03/24 do anexo, instaurou o competente inquérito civil público, tombado sob o n. 1.35.000.000306/2012-37, com o fito de apurar a ausência de registro junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Sergipe – CREA/SE aos egressos do curso de Engenharia de Pesca formados pela Universidade Federal de Sergipe – UFS.
Diz que, segundo o denunciante, todos os formados do Curso de Engenharia de Pesca pela UFS entre 2010 e o final de 2011 não estão logrando obter seu registro junto ao CREA/SE, o que vem inviabilizando o exercício regular da profissão. E que o motivo suscitado pela autarquia para não conceder a autorização para a prática da atividade de engenharia é a discrepância entre os diplomas fornecidos pela aludida instituição de ensino superior e as diretrizes estipuladas pela legislação específica.
Afirma que, em resposta a ofício encaminhado pelo MPF, a UFS informou que a Coordenação do Curso de Engenharia de Pesca promoveu as adequações necessárias, de acordo com as diretrizes curriculares mínimas apontadas pelo MEC, e submeteu o novo projeto pedagógico ao Conselho de Ensino, ao passo que o CREA/SE relatou que a Resolução nº 72/2006/CONEP, que aprova o projeto pedagógico do curso de Engenharia de Pesca, determina que a carga horária seja de 3.615 (três mil seiscentas e quinze) horas, equivalendo a 241 (duzentos e quarenta e uma) créditos, dos quais 213 (duzentos e treze) são obrigatórios e 28 (vinte e oito) são optativos e, no entanto, os históricos curriculares dos egressos estão em desconformidade com essas diretrizes, não tendo os mesmos cursado as disciplinas “Cultivo de Peixes Ornamentais” e “Trabalho de Conclusão de Curso”.
Aduz que em reunião com as autoridades competentes, o representante da UFS disse que houve uma proposta do CREA em conferir registro provisório, válido por um ano aos egressos do Curso de Engenharia de Pesca, período no qual eles poderiam cursar as disciplinas faltantes, em decisão amparada no parecer técnico da Câmara de Agronomia.
Informa que foi juntada ao inquérito civil público a Resolução n. 119/2011/CONEP, que versa sobre as alterações no Projeto Pedagógico do Curso de Graduação em Engenharia de Pesca e o parecer da Assessoria Técnica do Regional, salientando a impossibilidade de cadastramento dos egressos do curso de Engenharia de Pesca da UFS junto à Autarquia.
Acrescenta que foi expedida recomendação no sentido de o CREA/SE não se abster de emitir a carteira profissional dos alunos graduados em 2011 e diplomadas no curso de Engenharia de Pesca pela Universidade Federal de Sergipe, e que, em resposta, o CREA/SE não acolheu a recomendação ministerial, ao pretender restringir as atribuições e funções daqueles profissionais egressos, impondo limites ao exercício profissional dos mesmos.
Defende o direito ao livre exercício profissional dos engenheiros de pesca, cuja habilitação profissional se obtém por diploma expedido por instituição de ensino reconhecida pelo Ministério da Educação, sendo que a expedição da competente carteira profissional vincula-se unicamente à prova de tal habilitação.
Argumenta que os aludidos estudantes colaram grau devidamente e receberam seus respectivos diplomas da instituição federal de ensino nos termos da normativa regulamentar vigente à época – Resoluções 2/2007/CNE, 72/2006/CONEP e 74/2006/CONEP, atendendo integralmente à carga curricular exigida à época da conclusão de seus cursos.
Afirma que ao CREA/SE não cabe emitir juízo de mérito a respeito de ausência de disciplinas no currículo básico do egresso, para emissão de carteira profissional, devendo ater-se à análise única da existência de diploma devidamente emitido por instituição oficial de ensino reconhecida.
Requer a concessão de medida liminar, para determinar que o CREA/SE se abstenha de negar a expedição das carteiras profissionais dos estudantes graduados e diplomados em 2011 no curso de Engenharia de Pesca da Universidade Federal de Sergipe, em razão de não terem cursado as disciplinas “Cultivo de Peixes Ornamentais” e Trabalho de Conclusão de Curso”, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada descumprimento constatado, bem assim que dê ampla divulgação à decisão judicial, no mínimo, três jornais de ampla circulação no Estado de Sergipe, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais).
Juntou o Procedimento Administrativo n. 1.35.000.000306/2012-37, em anexo.
É o relatório. Passo a decidir.
Faz-se necessária uma análise dos requisitos e pressupostos indispensáveis para o deferimento da tutela antecipatória. Com efeito, assim dispõe o art. 273 do Estatuto Processual Civil:
O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
Acrescenta o § 2º, do mesmo artigo:
§ 2º – Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
A presente Ação Civil Pública visa a obter provimento judicial para obstar o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CREA/SE de negar a expedição de carteira profissional aos estudantes graduados e diplomados em 2001 no curso de Engenharia de Pesca da Universidade Federal de Sergipe – UFS, em razão de não terem cursado as disciplinas “Cultivo de Peixes Ornamentais” e “Trabalho de Conclusão de Curso”.
Sobre o exercício da atividade profissional de engenheiro, a Lei n. 5.194/66 assim estabelece:
LEI Nº 5.194, DE 24 DE DEZEMBRO DE 1966.
Regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo, e dá outras providências.
Art. 2º O exercício, no País, da profissão de engenheiro, arquiteto ou engenheiro-agrônomo, observadas as condições de capacidade e demais exigências legais, é assegurado:
a) aos que possuam, devidamente registrado, diploma de faculdade ou escola superior de engenharia, arquitetura ou agronomia, oficiais ou reconhecidas, existentes no País;
b) aos que possuam, devidamente revalidado e registrado no País, diploma de faculdade ou escola estrangeira de ensino superior de engenharia, arquitetura ou agronomia, bem como os que tenham êsse exercício amparado por convênios internacionais de intercâmbio;
c) aos estrangeiros contratados que, a critério dos Conselhos Federal e Regionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, considerados a escassez de profissionais de determinada especialidade e o interêsse nacional, tenham seus títulos registrados temporàriamente.
Parágrafo único. O exercício das atividades de engenheiro, arquiteto e engenheiro-agrônomo é garantido, obedecidos os limites das respectivas licenças e excluídas as expedidas, a título precário, até a publicação desta Lei, aos que, nesta data, estejam registrados nos Conselhos Regionais.
(…)
Art. 55. Os profissionais habilitados na forma estabelecida nesta lei só poderão exercer a profissão após o registro no Conselho Regional, sob cuja jurisdição se achar o local de sua atividade.
Art. 56. Aos profissionais registrados de acôrdo com esta lei será fornecida carteira profissional, conforme modelo, adotado pelo Conselho Federal, contendo o número do registro, a natureza do título, especializações e todos os elementos necessários à sua identificação.
§ 1º A expedição da carteira a que se refere o presente artigo fica sujeita à taxa que fôr arbitrada pelo Conselho Federal.
§ 2º A carteira profissional, para os efeitos desta lei, substituirá o diploma, valerá como documento de identidade e terá fé pública.
§ 3º Para emissão da carteira profissional os Conselhos Regionais deverão exigir do interessado a prova de habilitação profissional e de identidade, bem como outros elementos julgados convenientes, de acôrdo com instruções baixadas pelo Conselho Federal.
Art. 57. Os diplomados por escolas ou faculdades de engenharia, arquitetura ou agronomia, oficiais ou reconhecidas, cujos diplomas não tenham sido registrados, mas estejam em processamento na repartição federal competente, poderão exercer as respectivas profissões mediante registro provisório no Conselho Regional.
Art. 58. Se o profissional, firma ou organização, registrado em qualquer Conselho Regional, exercer atividade em outra Região, ficará obrigado a visar, nela, o seu registro.
Para o exercício da atividade profissional de engenheiro, portanto, é obrigatório o registro no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia em cuja jurisdição as atividades poderão ser exercidas, conforme disposição legal supracitada, sendo o mesmo assegurado aos que possuam, devidamente registrado, diploma de faculdade ou escola superior de engenharia oficiais ou reconhecidas, existentes no País.
Destaco, nesse contexto, que é atribuição do Conselho Nacional de Educação, órgão vinculado ao Ministério da Educação, a definição do currículo mínimo profissional, estabelecendo cargas horárias mínimas, níveis de escolaridade e conteúdo, para a certificação/diplomação dos educandos para o exercício das atividades profissionalizantes.
Compete, assim, aos órgãos próprios do sistema educacional a autorização para a instalação e funcionamento de cursos técnicos e/ou profissionalizantes e de nível superior, bem como a aprovação dos respectivos planos de curso, a supervisão do seu funcionamento e o registro de seus diplomas, se for o caso, para que tenham validade nacional.
A atribuição dos órgãos de fiscalização do exercício profissional, de outro lado, refere-se às atribuições principais e à ética profissional de uma determinada categoria. Não cabe ao órgão de fiscalização profissional definir condições de funcionamento de cursos e de programas educacionais. O que lhes compete é definir as atribuições profissionais correspondentes a partir da respectiva lei de regulamentação da profissão, considerando o diploma e/ou certificado expedido e registrado por escolas autorizadas e supervisionadas pelos órgãos próprios do sistema educacional.
Dessa forma, ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Sergipe – CREA/SE não é dado definir se a carga horária ou o conteúdo do curso certificado é válido ou não para a habilitação ao exercício da profissão daquele que o detém, mas tão somente verificar se aquele que está em busca de registro profissional possui o correspondente diploma ou certificado, expedido de acordo com a regulamentação do sistema educacional, habilitando-o para o desempenho profissional das atribuições funcionais definidas em lei.
Consoante posicionamento firmado pela jurisprudência, dentre as atribuições dos Conselhos de Classe, não se encontra a de fiscalizar o ensino das disciplinas inerentes aos cursos de formação, mas tão-somente o de fiscalizar o exercício de tais profissões, nos termos da legislação instituidora, não tendo o Conselho Profissional atribuição para analisar a vida acadêmica da instituição de ensino e, muito menos, a partir desta análise, ampliar ou restringir o campo de atuação do profissional. A avaliação da formação do profissional incumbe exclusivamente ao Ministério da Educação, razão pela qual ao Conselho de Classe resta vedado negar registro a profissionais formados em cursos oferecidos por entidades legalmente autorizadas pelo MEC, devendo a qualificação do profissional ser aferida mediante os certificados que atestam a conclusão de tais cursos.
Nesse sentido colaciono os julgados abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL. ENSINO. DISCIPLINA DE CUSTOS. CONTABILIDADE. PROFISSIONAL DA ÁREA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS. EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL. AUSÊNCIA DE ÓBICE LEGAL. (…) 2. In casu, sobressai inequívoco do acórdão objurgado que: “Dentre as atribuições do Conselho de Contabilidade, não se encontra a de fiscalizar o ensino das disciplinas inerentes aos cursos de formação de contador ou técnico em contabilidade, mas tão-somente o de fiscalizar o exercício das profissões de contador e guarda-livros, conforme dispõe o art. 10 do Decreto-Lei nº 9.295/46: (…)5. O Conselho Profissional não tem atribuição para analisar a vida acadêmica da instituição de ensino e, muito menos, a partir desta análise, ampliar ou restringir o campo de atuação do profissional. 6. A avaliação da formação do profissional incumbe exclusivamente ao Ministério da Educação, razão pela qual ao Conselho de Classe resta vedado negar registro a profissionais formados em cursos de especialização oferecidos por entidades legalmente autorizadas pelo MEC, devendo a qualificação do profissional ser aferida mediante os certificados que atestam a conclusão da especialização 7. Recurso Especial desprovido1.
ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. REGISTRO. TÉCNICO EM FARMÁCIA. Remessa oficial considerada interposta por imposição do art. 12 da Lei 1533/51. Tem direito à inscrição junto ao Conselho Regional de Farmácia o Técnico que apresenta diploma de curso de segundo grau devidamente registrado no Ministério da Educação se, das 2.200 horas obrigatórias, 900 forem relacionadas às matérias profissionalizantes. Segundo precedente da Turma, o fato de o Conselho Federal de Enfermagem ter o poder-dever de zelar pelo prestígio e bom conceito da profissão não significa que possua o poder de credenciar cursos de especialização, ultrapassando os limites de sua competência e invadindo aquela reservada ao Conselho Federal de Educação. Se o Conselho – restrito à atividade fiscalizatória do exercício da profissão – não provocou o referido órgão em tempo hábil para evitar a conclusão dos cursos e a expedição dos diplomas, decisão administrativa atual não pode retroagir para atingir aqueles títulos obtidos enquanto estavam sob a égide da legalidade, considerada a data do ingresso da ação mandamental (ano de 2002) e aquelas em que foram expedidos os diplomas (1998 a 2001). Concluído o curso questionado e expedidos os diplomas enquanto o mesmo era reconhecido pelo Ministério da Educação, não pode o Judiciário afrontar o princípio constitucional da irretroatividade para desconsiderá-los. Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. Apelação e remessa oficial, considerada interposta, improvidas2.
No caso dos autos, o requerido vem indeferindo a inscrição dos egressos do curso de Engenharia de Pesca da Universidade Federal de Sergipe no ano de 2011 sob o fundamento de que o curso cujo certificado lhe fora apresentado não teria atendidos aos requisitos mínimos para a habilitação ao exercício da atividade de engenheiro de pesca, especialmente no que diz respeito à ausência das disciplinas “Cultivo de Peixes Ornamentais” e “Trabalho de Conclusão de Curso”.
Conforme demonstrado acima, não cabe à demandada decidir se o certificado apresentado é suficiente ou não para a habilitação, daquele que o detém, exercer a referida atividade profissional. Cumpre tão somente verificar se o mesmo foi expedido em observância à regulamentação do órgão de educação que tenha competência para tanto.
Com efeito, o curso em questão foi ministrado por instituição de ensino federal oficial, e, como se observa do diploma de fl. 31, referente a um dos egressos do curso de Engenharia de Pesca da UFS no ano de 2011, o mesmo está devidamente reconhecido nos termos da Portaria Normativa nº 40/20073 do Ministério da Educação, bem como o diploma encontra-se devidamente registrado no órgão competente.
Desta forma, tendo os diplomados concluído o curso de Engenharia de Pesca e obtido o respectivo diploma de conclusão de curso, não cabe ao Conselho Profissional impedir o registro dos mesmos, obstando o exercício da atividade profissional para a qual foi habilitado por instituição oficial do sistema federal de ensino.
Presente, pois, a verossimilhança das alegações da parte autora.
Quanto ao perigo de dano irreparável, a atuação do Conselho de Classe vem obstando aos egressos do curso de Engenharia de Pesca da UFS no ano de 2011 o exercício de atividade profissional constitucionalmente garantido àqueles que atenderem às qualificações profissionais que a lei estabelecer, o que poderá causar-lhes danos irreparáveis ou de difícil reparação,
Vislumbro, assim, a presença dos requisitos necessários à concessão da medida liminar pretendida.
Ante o exposto, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela para determinar ao CREA/SE que se abstenha de negar o registro, por ora provisório, aos egressos do curso de Engenharia de Pesca da UFS no ano de 2011, em razão de não terem cursado as disciplinas “Cultivo de Peixes Ornamentais” e “Trabalho de Conclusão de Curso”, sob pena de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada caso de descumprimento, sem prejuízo de outras cominações legais, devendo ainda divulgar (em três jornais de ampla circulação) esta decisão, a fim de que os interessados tenham a devida ciência da mesma.
Citar. Caso a contestação contenha preliminares (art. 301 do CPC), ou venha acompanhada de documentos, intimar o autor para apresentar réplica, querendo (art. 327 do CPC), tudo nos termos do art. 162 §4º do CPC.
Após, sem prejuízo de eventual julgamento antecipado da lide, especifiquem as partes as provas, caso desejem produzir, justificando-as, no prazo de 05 (cinco) dias.
Intimar.
Aracaju, 25 de julho de 2012.
Telma Maria Santos Machado
Juíza Federal