Quinta, 18 De Abril De 2024
       
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Memória, carne e poesia


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Publicado em 16 de julho de 2013
Por Jornal Do Dia


Quando a carne se presta à poesia

Rian Santos
[email protected]

Ainda o Sercine. Finalmente tenho a resposta para o estudante de jornalismo que bateu à minha porta com um monte de interrogações amarradas num bloquinho. O coitado subiu três lances de escadas, esbaforido, mas teve de descer com as mãos vazias. Somente agora, após uma semana acompanhando o Festival, percebo. Para realizar uma leitura de mundo satisfatória e transportar a experiência de nossos dias para o papel empilhado nas bancas de revistas só é preciso se aproximar dos mais novos, gente que conserva o pasmo essencial e risca as feições de determinado com as próprias angústias.

Temerário arriscar a motivação de Everlane Moraes, que conquistou o prêmio da Mostra Nordeste do Festival Sergipe de Cinema no último fim de semana, ao conceber o projeto do documentário Caixa D’água – Qui-Lombo é esse? (2012). O fato, no entanto, é que os quinze minutos de imagens reunidas no filme resignificam uma das paisagens mais caras à geografia afetiva da cidade, agora pra sempre irmanada à verdade dos moradores mais antigos do lugar – uma música executada em tom monocórdio, captada durante sabe-se lá quantas horas de entrevista, uma melodia que nasce no mesmo abafado dos pontos de macumba e das preces que arrastam as novenas. Como se não bastasse o serviço prestado à memória, Erverlane ainda emprestou a própria carne para contorno da poesia.

Eu não fui o primeiro a perceber as virtudes do documentário. Relapso por natureza, na verdade fui um dos últimos a me prestar ao deslumbre. O estudioso Wesley Pereira de Castro, por exemplo, fez questão de compartilhar o seu assombro com os leitores do blog Críticas de um cinema nu, onde cataloga as impressões suscitadas por sua maior paixão declarada.
"Não apenas o filme resolveu muito bem a conjunção entre uma linguagem poética e, ao mesmo tempo, preocupada com a oralidade dos depoentes como algumas soluções estilísticas mui criativas (uma animação durante a narrativa da fundação espontânea de um cemitério infantil, projeções fotográficas sobre o corpo da própria diretora e de um ator, superposição de vozes, etc.), o teor bakhtiniano da narrativa documental impressiona pelo respeito aos moradores da comunidade onde a própria diretora vive, sendo que o curta-metragem é ainda agraciado por trechos antológicos de uma apresentação do cantor e compositor Irmão num programa da TV Aperipê, em que o artista cunha o neologismo "sofreviventes" para referir-se aos quilombolas. Emocionante e muito bem realizado: de longe, uma das produções mais interessantes do panorama audiovisual sergipano".

Se Wesley falou, tá falado. Caixa D’água é prova de que já fazemos Cinema de verdade.
Para ir além: http://crticasdeumcinemanu.blogspot.com.br

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