Sem mácula (Divulgação)
**PUBLICIDADE
Dia primeiro
Publicado em 28 de dezembro de 2024
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
.
Numa crônica quase piegas, o poeta Carlos Drummond de Andrade adverte os inocentes de olhos espetados no calendário: o espírito do Ano Novo não vingará por força de moto contínuo, compelido por votos de felicidade e foguetório. No escuro insondável, em sono profundo, o Ano Novo dorme e sonha, como um menino.
Tomo liberdades com a crônica de Drummond, eu sei. Neste intervalo, entre o fim e o começo de um novo ano, quando tudo estala, ainda broto, a esperança renovada dispensa qualquer fundamento. O marco temporal sugere uma estrada aberta, oportunidades, recomeços possíveis. Todo homem, toda mulher, desperta nestes primeiros dias do ano como quem parte em cruzeiro por mares nunca dantes navegados, uma aventura, todos renascidos.
Nos primeiros dias de um ano novo todos viram crianças, sem qualquer passado a lhes pesar sobre os ombros. Amores ressequidos, dívidas antigas, boletos vencidos, as frustrações derivadas da experiência acumulada ao longo da vida, os calos nas palmas da mão do trabalhador acostumado ao cabo da enxada, erros e acertos repousam no éter.
O dia primeiro não tem passado, não tem mácula de memória, igual à flecha de Oxóssi: uma ideia concebida sob sol ainda não nascido, uma aurora que desde já inflama o horizonte no futuro.