Terça, 21 De Janeiro De 2025
       
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Ela, enorme…


Publicado em 27 de junho de 2023
Por Jornal Do Dia Se


Inocente, igual a todos os bichos..

Rian Santos – riansantos@jornaldodiase.com.br
 
Há 13 anos, adotei uma cadela vira latas. Ontem, ela desatou a correr e a ladrar para sempre, pastora de um campo sem fim, deserto de qualquer memória, um campo sem limites, medindo a prosa sem medida de Graciliano Ramos, enorme.
O fim é sempre solitário. A misericórdia de uma agonia breve, como foi a de Glorinha,a minha cadela, não poupa a experiência do susto. Basta um segundo para tudo acabar. Num piscar de olhos já não há consolo possível, nenhuma declaração faz sentido, nenhum gesto conforta, nem obtém resposta, resta somente o pasmo, o luto.
Não há pudor nas cerimônias do adeus. No fundo do caixão, o cadáver de um homem o dispõe ao julgamento íntimo dos mais próximos. O veredicto varia de acordo com o juiz: bom pai, mulherengo, generoso, perdulário, sonso, incompetente… Deste espetáculo sem propósito, ao menos, os animais são poupados.
Eu mesmo abri a cova de minha cadela, tão funda quanto pude em tais circunstâncias. Eu mesmo a pus em um saco plástico e joguei o seu corpo rígido e frio no buraco. Depois chorei. Não por Glorinha, inocente igual a todos os bichos. Mas pelo tutor que não fui, o tutor que jamais serei, um dia.
O fim é também um alívio, Graciliano o sabia: “Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. E lamberia as mãos de Fabiano, um Fabiano enorme. As crianças se espojariam com ela, rolariam com ela num pátio enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo cheio de preás, gordos, enormes”.
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