Fica decretado: "Nenhum aluno repetirá de ano"
Publicado em 10 de maio de 2020
Por Jornal Do Dia
*Erbson Rodrigues
Em Filosofia aprendemos que o sentido grego da palavra admiração é espanto. Quando estamos diante de uma situação diferente, inesperada, temos uma atitude de admiração e esta atitude é ponto de partida para o ato de filosofar, pois nos leva à descoberta de nossa própria ignorância e à indagação sobre o que ignoramos.
Ora, o espanto veio-me em solapada ao ler o título da matéria no G1 de hoje: Sem celular e TV, alunos da rede pública de SP temem perder o ano: ‘Não quero repetir’. Por que o espanto? Em virtude de perceber que, enquanto estamos em um mutirão frenético, na Secretaria de Educação de Sergipe, a fim de garantir que os alunos mantenham o vínculo com a Escola, retornem após a pandemia, tenham a vida preservada, recebam – ainda que achemos poucos e fragmentados – umas doses de conteúdos curriculares, e saibam que o seu lócus de Esperança continua lá, aguardando seu retorno, a imprensa só critica.
Estamos empenhados, pois acreditamos na importância da Educação para a formação de uma sociedade próspera, com crianças e adultos capazes de fazer boas escolhas. Mas, vejam bem, senhores repórteres, "a escola não é de modo algum o mundo, nem deve ser tomada como tal; é antes a instituição que se interpõe entre o mundo e o domínio privado do lar" (Arendt). Simplificando, diria que a escola e as aulas a distancia – por tecnologias ou não -, são espaços diferentes de aprendizagem e não antagônicos. Ensinar é inserir-se na história: não é só estar na sala de aula, mas num imaginário político mais amplo. Não foi escolha nossa, foi um ‘ser’ misterioso que nos atacou inesperadamente sem nos dar tempo para planejamentos mais elaborados. Nós também nos sentimos inseguros, com medo de sermos injustos. Aceite nossas desculpas!
De outra forma, a indagação filosófica nos faz perceber o que ignoramos porque, se houve impacto negativo pelo título do artigo do G1, de outra forma, houve redimensionamento das expectativas ao ler o apelo das crianças: "Não quero repetir". Esse apelo parece ressoar em nossos ouvidos e coração: "Não quero repetir". E nós vamos profetizar: Você não vai repetir. Seu apelo será uma ordem a todos os Educadores da nossa querida Rede Estadual de Sergipe. Vamos nos empenhar para descartar a Pedagogia do prêmio e castigo.
Vamos usar todas as estratégias possíveis, e colocar todos os esforços para garantir que os estudantes "não repitam de ano", que contem sempre com a escola, que ela continue sendo a sua segunda casa. Se o conhecimento do currículo for menor do que a sala lhe proporcionaria, nos desculpem. Agora nós queremos que você "não repita de ano", "não abandone a escola", e sempre olhe para ela com Esperança. O mestre Paulo Freire está conosco nesse ideal: "Se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode".
Por isso, fica decretado desde agora: "Em tempo de pandemia, nenhum estudante irá repetir de ano. Nenhum professor, coordenador ou diretor será criticado por isso. "Agora vale a vida, e de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira" (Thiago de Melo).
*Erbson Rodrigues, professor da Rede Estadual de Ensino, Doutorado em Educação pela USC, Espanha.