Na pele do tambor
Publicado em 16 de fevereiro de 2023
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
Há algo de primitivo no apelo de um tambor.
Foi atraído pelo chamado ancestral e uma pontinha da curiosidade mais vulgar que pisei uma vez no chão sagrado de um terreiro. Havia, sim, alguma magia no ar, a beleza ritual de uma comunhão festiva com o mistério. Mulheres em saias vermelhas de cigana bebiam e dançavam possuídas pela graça, um espetáculo de línguas estranhas, adivinhações, súplicas e sentido. Tudo impressionava, tudo vibrava, mas eu pouco vi do culto. A música dos atabaques ecoava sem descanso. Ali, eu era todo ouvidos.
É mais ou menos essa a promessa guardada nas apresentações do grupo Burundanga Percussivo no Carnaval de Aracaju. Embora a intenção seja outra, mais imediata e mundana, a reunião promovida pelo maestro Pedro Mendonça terá sempre um dado de resgate. Basta um comando e os tambores quase sempre calados da gente sergipana transbordam em sopapos de alegria- esta é, até onde eu sei, aliás, a única surra que o lombo cansado do povo gosta.
O maestro Pedro Mendonça escreve assim, com a palma das mãos, mais um belo capítulo da música Serigy. Depois de colaborar com artistas e projetos diversos, notadamente o terceto instrumental Café Pequeno, coloca agora a percussão no centro do palco, no meio da rua, sob aplausos e holofotes. A oportunidade não poderia ser mais feliz. O pulso forte, a marcação cerrada, o acento expansivo honram a nossa vocação cultural para a festa.
Fé e farra, cultura e religiosidade. O leitor mais rigoroso talvez torça o nariz para os imperativos aparentes na página. Nada mais equivocado. Na pele do tambor, convivem todos os tempos, todos os gostos, afins e opostos, uma alegria comunal.
Carnaval no mangue com Burundanga:
Domingo, 19,a partir das 13 horas, n’A Casa do Mangue (Rua Alu Campos, 180, Farolândia).