De pé, a partir da esquerda: Luís Travassos, José Dirceu, José Ibrahim, Onofre Pinto, Ricardo Vilas, Maria Augusta Carneiro Ribeiro, Ricardo Zarattini e Rolando Frati. Agachados: João Leonardo Rocha, Agonalto Pacheco, Vladimir Palmeira, Ivens Marchetti e Flávio Tavares.
O dia da liberdade faz 55 anos
Publicado em 10 de setembro de 2024
Por Jornal Do Dia Se
* Marcos Cardoso
Há 55 anos, no dia 7 de setembro de 1969, seria concluída com sucesso a mais ousada ação realizada pelos homens e mulheres que dedicaram suas vidas à causa da liberdade do Brasil lutando contra a servidão da ditadura militar.
Três dias antes, no 4 de setembro, revolucionários da Aliança Libertadora Nacional (ALN) e do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), dentre eles o jornalista e ex-deputado federal Fernando Gabeira e o jornalista Franklin Martins, realizaram o ato mais atrevido da guerrilha urbana no Brasil: o sequestro, no Rio de Janeiro, do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick. O resgate seria pago com a libertação de 15 presos políticos e a divulgação de um manifesto.
Alguns daqueles presos políticos se tornaram conhecidos, como José Dirceu, que viria a ser homem forte do PT e no primeiro governo Lula, e Vladimir Palmeira, ex-deputado federal e também fundador do PT. E o sergipano Agonalto Pacheco. Eles aparecem na célebre foto onde 13 dos 15 que iriam para o exílio posam, mãos amarradas, em formação de time de futebol, à porta do Hércules 56 que os levaria ao México. Antes passariam em duas capitais: Recife, onde apanhariam o legendário líder comunista pernambucano Gregório Bezerra, e Belém, onde pegariam Mario Zaconatto, um jovem militante do PCB.
Agonalto Pacheco imortalizou-se naquela foto, o segundo da esquerda para a direita, entre João Leonardo e Vladimir, agachado na pista do Galeão. São 13 quase maltrapilhos, aspectos sofridos, barbas por fazer.
“Ficamos sobrevoando o Estado do Amazonas. Eles ficaram sobrevoando, ameaçando jogar a gente no rio Amazonas. Foi uma viagem apreensiva. Chegamos ao México no dia 7 de setembro, à tarde, pois eles achavam que podiam ainda localizar o embaixador. Comunicamos nossa chegada no México, e aí eles soltaram o embaixador”, contou o comunista sergipano.
O governo atendeu às reivindicações dos revolucionários, os presos políticos foram enviados para o México e o manifesto foi publicado nos principais jornais e divulgado em todas as rádios e televisões. Quando o embaixador foi libertado, seguiu-se uma feroz repressão, que levou ao assassinato, ainda em setembro e sob tortura, de Virgilio Gomes da Silva, o “Jonas”, e de Carlos Marighella.
Na noite de 4 de novembro de 1969, o líder da ALN foi surpreendido por uma emboscada na capital paulista. Foi varado pelas balas dos agentes do Dops sob a chefia do delegado Sérgio Paranhos Fleury.
Agonalto Pacheco – A morte do velho comunista Agonalto Pacheco, aos 80 anos, no dia 14 de abril de 2007, reduziu a fileira dos que defendiam uma sociedade ideal, um mundo onde todos seriam iguais e teriam acesso aos bens e serviços de acordo com suas necessidades. Marxista, defendia o socialismo científico, que estabeleceu os meios para se atingir a sociedade de iguais que substituiria a ordem injusta e imoral do liberalismo capitalista.
Pura utopia, a história insiste em provar. A democracia é o pior dos regimes, à exceção de todos os demais, como disse Churchill, e o homem moderno não conhece democracia fora do sistema capitalista, infelizmente – ou não.
Natural de Aquidabã, Agonalto era um romântico que levou às últimas consequências a realização do seu sonho. Militante desde a adolescência do Partido Comunista Brasileiro, o Partidão, mudou-se para São Paulo após o golpe de 64, onde se aliou à ALN, de Carlos Marighella, principal dirigente da luta armada contra a ditadura. Era o homem simples, do agreste sergipano, pegando em arma contra o regime militar.
Foi preso em janeiro de 1969 quando organizava uma reunião nacional de proscritos. Torturado no temível Dops (Departamento de Ordem Política e Social) de São Paulo para delatar Marighella, que sabia onde estava escondido, resistiu estoicamente. O pau-de-arara e a cadeira do dragão não dobraram o nordestino magro, comprido, suave, mas de propósitos definidos, que possuía a convicção dos que sabem aonde querem chegar.
“Essa frente que eu abracei é uma frente como outra qualquer, mas com um agravante: você pode sair aleijado, cego ou para o cemitério”, contou no depoimento para o jornalista Osmário Santos mais de dez anos depois do fim da ditadura, mas ainda como quem guardava um segredo escondido por trás das palavras. Por causa da tortura e, principalmente, de um murro no estômago passou vários dias sem poder se mexer.
Agonalto Pacheco viveu no exterior, principalmente em Cuba, retornado ao Brasil após a anistia sancionada em agosto de 1979. Primeiro São Paulo, depois Aracaju. Na capital sergipana, onde fora vereador no final dos anos 50, ele voltou à atividade política, trabalhando no Partidão ou no PMDB e em alguns pequenos cargos públicos. Nas atividades partidárias, Agonalto era respeitado pela experiência e pela tranquilidade com que defendia suas teses. Era um conciliador, sempre disposto a pacificar as posições contrárias.
Depois que o seu querido PCB naufragou, ele desiludiu-se da política. Morreu amargurado com a vida pública, segundo revelaram seus filhos. Mas manteve a simplicidade e a dignidade até o fim.
O espírito conciliador do velho comunista estava presente no próprio velório, onde os cristãos se benziam e faziam orações silenciosas diante do corpo inerte do materialista dentro de um caixão coberto pela bandeira vermelha do Partido Comunista.
* Marcos Cardoso é jornalista