O elixir de São Cristóvão
Publicado em 18 de agosto de 2022
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
Lembro como se fosse ontem: Um amigo batizou a filha recém nascida em São Cristóvão, numa igreja centenária, com as paredes caiada de séculos e muito latim. Perdi a cerimônia, herege renitente. Mas aproveitei a festa em goles enormes, até dar vexame. Lá pelas tantas, Julico (The Baggios) deu o ar da graça, com um violão vagabundo embaixo de um braço e uma garrafa de Pisa Macio debaixo do outro. A memória chega até aí.
Novas oportunidades de ouvir o artista defendendo os seus primeiros versos e degustar a beberagem sucederam, sempre alegres. O blues rock do menino, combinado à bebida, desciam rasgando – Uma mistura que, ainda hoje, tanto tempo depois, ainda me aquece o sangue.
Pisa Macio é um destilado artesanal, fabricado na cidade histórica, forte como um burro teimoso, empacado. Eu o localizo entre a cachaça pura e o Príncipe Maluco, arrependimento de meu último Forró Caju. À diferença deste, contudo, o trago não trava a garganta. Remete, antes, a um aprendizado difícil, assim como os primeiros goles de um bom uísque. Gratificante, quase sempre. Por vezes, necessário.
Trata-se de bebida barata, convém advertir os incautos, comercializada em garrafa plástica em troca de poucos tostões furados. Os durangos de fino trato, estudantes com o ímpeto de varar as madrugadas com a carteira vazia, fazem uso do elixir de São Cricas. Para tanto, contudo, é preciso fazer jus aos próprios bagos.
É pela música dos Baggios e a lembrança vaga dos meus anos loucos que rendo agora homenagens ao senhor João Pereira Aquino – o João do Pisa, falecido ontem na São Cristóvão de tantos pecados. Alguém com a manha de empurrar cachaça nos anais de uma cidade interiorana merece um brinde, todos os discursos e prantos, um abraço embriagado, comovido como o diabo.