O LEGADO DE IMAGINE

Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos

Fiquei estarrecido com as manifestações antidemocráticas do último dia 7 de setembro, no Brasil. O nível de imbecilidades passou de todos os limites. É triste ver um país mergulhado em pobreza, problemas de toda ordem (problemas reais, do mundo real) e uma pandemia ainda a vitimar inúmeras pessoas, e um presidente acuado e raivoso, incapaz de passar segurança, sem soluções e colocando mais lenha numa nação tomadas por animosidades faz algum tempo.
Nesse contexto, impossível não pensar e não celebrar uma das canções mais geniais já produzidas no mundo. Cinco décadas depois, IMAGINE, de John Lennon e Yoko Ono, segue sendo atemporal e atual, capaz de invocar as pessoas não somente a resistir, mas também a pensar em perspectivas melhores para a vida humana. O cenário pensando, ou melhor, imaginado pelo ex-beatles mais carismático e polêmico, nos faz ainda sonhar com dias menos sombrios, mais justos e menos polarizados.
É o que espero e desejo para meus dois filhos. É o que sonho para todas as crianças e jovens do Brasil. Um país sem fossos sociais gritantes, um líder sereno e capaz de apontar caminhos, direções, metas desenvolvimentistas, mas também dignas e acessíveis para todos, sobretudo para os mais necessitados. E se for necessário lutar, eu irei à luta para garantir um regime democrático justo, sólido e respeitável.
E IMAGINE me inspira para uma luta que está longe de pegar em armas, disseminar ódios e intolerâncias. Uma luta que começa na defesa por uma educação pública de qualidade, por saúde para todos, pelo fortalecimento das forças produtivas com vistas a gerar empregos, mas também por acesso à cultura, à arte e ao conhecimento e à livre expressão da fé, sem imposições ideológicas e preconceituosas.
Esta semana, em diversas partes do mundo, a letra de IMAGINE foi projetada em vários lugares de grande visibilidade pública. No dia 9 de setembro foi celebrada a sua data de lançamento, em 1971. A canção faz parte do álbum duplo que leva o mesmo nome, que tem também outros grandes sucessos como "Jealous Guy" e "How Do You Sleep". Esta última teria sido uma crítica velada ao ex-parceiro Paul MacCartney.
Produzido por Phill Spector, IMAGINE foi gravado no estúdio particular de Lennon, em Tittenhurst Park, na Inglaterra. Um ambiente propício para as propostas do casal pacifista. Entre as curiosidades, a participação de um outro ex-beatle, George Harisson, por quem John tinha grande afinidade. A base das canções foram o piano e a guitarra e houve muita ousadia nas faixas, com liberdade criativa e muita sensibilidade. O disco foi um sucesso no mundo inteiro e IMAGINE alcançou o topo das paradas em vários países.
Para Édson Medeiros: "Durante a gravação de IMAGINE, Lennon passava por uma fase interessante de sua vida graças ao seu engajamento político e sua luta pelo fim da Guerra do Vietnã. Sua preocupação com causas sociais o levou a se envolver em protestos e movimentos que causariam uma perseguição do governo Nixon, que o processava e queria impedi-lo de viver ou entrar em território americano (2014)".
Bom, os desdobramentos disso todos já sabemos. A morte precoce de Lennon, assassinado aos quarentas anos, no dia 8 de dezembro de 1980. Venceu o ódio? A letra de IMAGINE não surtiu os efeitos pretendidos e o ativismo político do cantor inglês o levou a um fim trágico? Prefiro acreditar que não, pois a canção segue germinando no mundo e dando frutos importantes. Virou um hino universal da paz. E paz é do que temos mais necessitado para vencer o vírus mortal e a ignorância dos extremistas de os matizes, sejam elas de esquerda ou de direta. Somos um corpo e o corpo está na UTI carecendo de cuidados urgentes antes que feneça.