Sexta, 07 De Fevereiro De 2025
       
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O tecido social contemporâneo


Publicado em 24 de agosto de 2013
Por Jornal Do Dia


A condição do ser humano dentro do contexto sócio político vigente

* Anderson Bruno

Marlon Delano é um dos mais ‘quentes’ diretores de curta-metragem da nova geração do audiovisual sergipano. Ele sempre está com alguma novidade pronta pra ser degustada pelos apreciadores fílmicos de plantão. Nos altos e baixos de suas produções, penso que uma, em particular, reflete curiosa e eficiente grandeza.
‘Vida Social’ (BRA/SE, 2012, 3.41 min) é um micro-metragem. Ele explora momentos do indivíduo dentro de uma sociedade. Questões como relacionamento a dois, sexualidade, o papel do homem e da mulher, são os objetos chave de seu roteiro.

O resultado fílmico é uma produção de cunho experimental. Não há texto falado. Tudo é exibido num simples plano de conjunto. Observa-se todo o mínimo cenário e seus atores. Sempre sentados em duplas. Um ao lado do outro. Uma formação interessante. A sensação é de obediência. Do mesmo jeito que sentamos na frente do professor no colégio.

Como também, quando esperamos pacientemente sermos atendidos nas filas de bancos, previdência, consultórios médicos e por aí vai. A própria bandeira do nosso querido Brasil, evoca essa postura. Tá escrito lá: ‘Ordem e Progresso’. Aqui em ‘Vida Social’, essa ordem é exposta de maneira robotizada, como se nossos quereres, sentimentos e sensações fossem relegados ao sistema e suas regras. E sem condição de apelo.

O revezamento das duplas de personagens são propositadamente concebidas como a marionetes manipuladas por mãos negras. Um contraponto de cor muito bem vindo no figurino. O contraste com o branco utilizado nas roupas dos atores remete claramente à simbologia das cores. Se a cor alva representa a pureza que há em nós, não restam dúvidas (pelo menos aqui no curta) que não somos páreos para com a negatividade de um sistema ditatorial em sua negra estrutura capitalista.

O tom melancólico, frio e tenso da trilha sonora (do próprio Marlon Delano) estabelece o pessimismo de ponta a ponta do material e conduz toda a atmosfera da história. Acaba por ser uma representação sonora do nosso cotidiano porque, se analisarmos racionalmente, somos moldados a todo o tempo a sermos o que nos é imposto. Quase nunca somos aquilo que nós queremos ser. O reflexo está nas máscaras sociais dramatizadas no filme nos momentos de censura racial, de estilo e sexual. A marca da proibição dá-se com um efeito de som semelhante ao soar de meios de produção de massa ou o ecoar de uma sirene laboral. Ele é estridente, seco e impositivo em sua sentença. No caso, aqui, é o que delimita o que serve e o que é descartado no sistema.

O estilo da edição de Marlon é preciso, pontual e de efeito. Como a maior parte das cenas são frontais à câmera, estabelecendo um diálogo bidimensional com a nossa telinha (consequentemente conosco), os cortes são secos, acompanhados de um efeito de som que enfatiza os planos de detalhes a serem expostos. Eles marcam e evidenciam nossa visão de preconceito e descriminação. No final das contas, os planos-detalhe funcionam como a uma lente de aumento da nossa própria hipocrisia social.

Mesmo sendo uma produção curtíssima, ‘Vida Social’ conseguiu imprimir na sua breve duração, a exposição da condição do ser humano dentro do contexto sócio político vigente. O domínio do capital, as relações de trabalho, a condição conjugal e sexual do indivíduo; tudo emoldurado na construção dita civilizada e correta que uma sociedade precisa seguir. Como a uma cartilha. O resultado foi uma inteligente construção artística dentro do campo audiovisual.

* Anderson Bruno é crítico audiovisual.

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