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Idese: Um marco inicial na educação pública de Sergipe


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Publicado em 07 de julho de 2022
Por Jornal Do Dia Se


Josué Modesto dos Passos Subrinho

Com a publicação dos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica de Sergipe (IDESE), em 14 de junho de 2022, demos um importante passo na consolidação da política educacional voltada para a obtenção da qualidade da aprendizagem. Há fortes evidências, tanto no Brasil quanto em outros países, de que o monitoramento constante dos resultados e a avaliação em larga escala dos sistemas educacionais são fundamentais para a perseguição de metas de aprendizagem e para a seleção das melhores estratégias educacionais pelas escolas e professore(a)s. Sergipe era um dos poucos estados brasileiros que não possuía um sistema próprio de avaliação da Educação Básica. A Lei nº 8.595 que institui o Sistema Estadual de Avaliação da Educação Básica de Sergipe (SAESE) foi aprovada em 2019, mas não houve tempo hábil para a realização da primeira avaliação nesse ano; já em 2020, a pandemia da Covid-19 impediu a sua aplicação. Finalmente, em 2021, com o retorno das atividades presenciais, foi possível realizá-la, antecedendo as provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), sob a responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
A primeira questão a ser vencida foi a da oportunidade de realização da avaliação estadual. Havia temores quanto aos usos dos resultados, a recorrente questão colocada pelos que se opõem aos processos avaliativos de larga escala. A matéria, entretanto, envolveu outros atores, além dos mais diretamente ligados à educação, uma vez que os resultados do SAESE e do fluxo escolar coletados pelo Educacenso seriam utilizados para a construção da ponderação na distribuição da quota municipal do ICMS. Neste contexto, os temores de que o momento ainda fortemente influenciado pelos efeitos da pandemia não seria adequado à aplicação de uma avaliação de larga escala ficaram mais fortes.
De certa forma estávamos replicando uma questão, guardadas suas peculiaridades, colocada nacionalmente e mesmo em nível internacional: seria desejável manter ou começar a aplicação de sistemas de avaliações educacionais de larga escala ainda sob os efeitos da pandemia? No nível federal a decisão foi manter a avaliação do SAEB 2021, que por sinal seria a última da série iniciada em 2005. Em Sergipe também se decidiu começar a avaliação em 2021, visto que a pandemia atingiu a todos, Rede Estadual e redes municipais de ensino, e precisávamos de avaliação de larga escala para termos um retrato mais abrangente dos impactos sofridos pelas diversas redes de ensino em suas diferentes etapas da Educação Básica.
Este é um ponto importante. Foram feitas diversas avaliações com o objetivo de diagnosticar o nível de aprendizagem dos estudantes, tendo em vista os efeitos da pandemia. Nenhuma, contudo, teve a abrangência de todas as redes de ensino do Brasil e envolveu todas as etapas da Educação Básica. O SAEB, cujos resultados preliminares foram divulgados no último dia 17 de junho, poderá suprir, em parte, tal lacuna.
Com a divulgação final dos resultados do SAEB, prevista para os próximos meses, os especialistas chamam a atenção para o difícil problema da comparabilidade. Provavelmente um número de escolas muito maior que o verificado nas edições anteriores não conseguiu a participação mínima de 80% dos estudantes matriculados nas turmas objeto da avaliação no dia da aplicação das provas. É possível que a participação tenha um viés a favor dos estudantes mais mobilizados ou com melhores condições de aprendizagem. Por outro lado, avaliações diagnósticas realizadas por várias instituições captavam os efeitos devastadores do prolongado período de fechamento das escolas sobre a aprendizagem dos estudantes.
Todas as circunstâncias e cautelas descritas aplicam-se ao SAESE. Porém é difícil conter a curiosidade sobre o significado da avaliação realizada. Acreditamos que a abordagem mais justa é discutir claramente os resultados e suas limitações. O SAESE aplicou provas fornecidas pela Fundação CESGRANRIO, e esta se encarregou da mensuração e qualificação de resultados expressos em relatórios detalhados. A escala e os procedimentos utilizados guardam a comparabilidade com o SAEB, mas a comparação dos resultados de 2019, sem os efeitos da pandemia, com os resultados de 2021, sob efeitos da pandemia, precisa ser vista com todas as cautelas possíveis. A primeira análise é isolar parcialmente os efeitos da taxa de aprovação dos estudantes, centrando o olhar no nível aferido da aprendizagem, conforme o quadro abaixo.

Quadro I. Sergipe. SAEB 2019 E SAESE 2021
Proficiência na Rede Pública

 

Tendo em vista a profusão de resultados divulgados, confirmando os temores de perdas graves nos níveis de aprendizagem dos estudantes, a comparação dos resultados das provas de Português do SAEB 2019 com o SAESE 2021, os quais evidenciam um melhor desempenho no ano de 2021, em todas as etapas da Educação Básica avaliadas, traz resultados surpreendentes. O entusiasmo deve ser contido com a lembrança de que para a aferição dos resultados do SAESE adotou-se uma participação mínima de 50% dos estudantes matriculados nas turmas objeto da avaliação, enquanto o SAEB exige a participação mínima de 80% dos estudantes. Ou seja, este quórum mais baixo viabiliza uma amostra maior das escolas e, simultaneamente, pode ter um efeito de seleção dos estudantes mais participativos, ficando fora da amostra os que tiveram maiores dificuldades em participar das atividades do ensino remoto, característica predominante do período sob os efeitos da pandemia. Observe-se que nosso corte foi de Rede Pública para o Ensino Fundamental, mas para o Ensino Médio, se resume à Rede Estadual, visto não haver oferta desta etapa pelas redes municipais.
A análise dos dados das provas de Matemática confirma os resultados mais preocupantes aferidos em outras regiões do Brasil e com outras amostras. Aqui os possíveis efeitos do corte da participação dos estudantes, abaixo de 80%, não se expressaram em melhorias nos resultados; e se utilizarmos a escala do SAEB como referência da proficiência dos estudantes participantes das provas, o resultado para o SAESE, realizado em 2021 – 179,0 pontos – retrocede ao obtido em 2007, quando se chegou a 177,78. Para os anos finais do Ensino Fundamental, o resultado do SAESE – 232,1 pontos – encontra equivalência no resultado do SAEB 2013. Quanto ao Ensino Médio, a redução do resultado aferido no SAESE foi de apenas um ponto, não aparentando a gravidade das etapas anteriores. Mas continuam válidas as ressalvas de que é possível que o resultado esteja inflado pelo efeito da participação mínima para publicação das proficiências, conforme já comentado.
Feitas as observações sobre a proficiência, podemos apresentar os dados sintéticos do IDESE no quadro abaixo.

Quadro II. Sergipe. SAEB 2019 e SAESE 2021
Índice da Rede Pública

 

As notas de Português e Matemática das provas dos sistemas de avaliação são convertidas numa escala de 0 a 10 pontos, e a média das duas notas padronizadas produz o coeficiente N, que é multiplicado pela proporção média de aprovação dos estudantes nas etapas da Educação Básica avaliada, coeficiente P, numa escala de 0 a 1. A multiplicação de ambos os coeficientes produz o índice sintético, conforme exposto no quadro II. Como podemos ver, tanto nos anos iniciais do Ensino Fundamental quanto nos anos finais desta etapa o coeficiente N, isto é, a média das provas de Português e Matemática no SAESE foi sistematicamente inferior à obtida no SAEB 2019 em razão da forte redução nos resultados das provas de matemática. Entretanto, os resultados sintéticos do SAESE ficaram acima do SAEB 2019 pelo grande incremento na taxa de aprovação, que nos anos finais do Ensino Fundamental, por exemplo, passaram de 75% no SAEB 2019 para 96,4% no SAESE. O Ensino Médio foi a única etapa da Educação Básica em que houve simultaneamente um aumento nas médias das provas e na taxa de aprovação no SAESE em relação ao SAEB 2019. Para maior apropriação e análise por parte dos interessados foi publicada a Portaria nº 1957/2022, que apresenta as métricas utilizadas para a construção do IDESE, no Anexo Único, da mencionada portaria.
Para concluir, enfatizamos os resultados mais importantes da primeira aplicação do SAESE. Em primeiro lugar ele consolida a prática da avaliação em larga escala para orientar as estratégias educacionais visando à qualidade da aprendizagem. A simples aplicação do SAEB, com seu longo tempo entre a avaliação e o retorno dos resultados (aproximadamente dois anos e meio), e a dificuldade de as escolas utilizarem os dados específicos de cada unidade e turmas inviabilizavam o seu uso para redirecionamento dos projetos educacionais. A partir da implantação do SAESE poderemos intensificar a aplicação de outras abordagens avaliativas de larga escala e intensificação do monitoramento de indicadores pedagógicos e, principalmente, utilizar os resultados anuais para redirecionamento das estratégias educacionais de cada unidade, tendo em vista seus resultados e de cada uma de suas turmas avaliadas no ano anterior. Evidentemente um sistema nacional continua importante para fins de fornecimento de uma visão ampla da educação nacional e no estabelecimento de parâmetros seguidos pelos sistemas estaduais e/ou municipais.
Em segundo lugar, os próprios resultados do SAESE atestam o acúmulo das sequelas educacionais. A opinião pública e as comunidades escolares estão sendo fortemente mobilizadas pelos danos socioemocionais exibidos no retorno às aulas. São problemas graves que merecem toda nossa dedicação para tratá-los. As sequelas educacionais, mesmo quando aferidas por processos de larga escala, são mais silenciosas, mas não menos danosas. O retrocesso no nível de aprendizagem em Matemática, por exemplo, é uma tragédia que não pode ser remediada pelo simples retorno às atividades presenciais, ainda sujeitas a diversas situações que tentam justificar a suspensão das aulas. Todos os 200 dias letivos, todas as 800 horas do Ensino Fundamental, todas as 1.000 horas do novo Ensino Médio podem não ser suficientes para recuperarmos nossos níveis anteriores de aprendizagem, os quais nunca estiveram entre os melhores do país. Se almejamos a qualidade da aprendizagem precisamos explicitar nossas estratégias de recomposição e intensificação da aprendizagem. Não há uma receita única, uma fórmula mágica, mas todas certamente envolvem determinação, empenho e dedicação.
Terceiro, estamos em condições de consolidar institucionalmente a avaliação como parte importante da gestão das redes de ensino e de cada uma das escolas. A apropriação por cada professo(a)r dos resultados dos processos avaliativos é fundamental para aferir a correspondência entre os esforços empreendidos no ensino e os resultados da aprendizagem e para que esses procedimentos não sejam entendidos como interferências indevidas na prática docente. Há um largo caminho para o estabelecimento dessa cultura entre nós, que em outras redes provocaram saltos de qualidade na aprendizagem.
Finalmente, ficou evidente o efeito das elevadas taxas de reprovação, ou visto de outro ângulo, baixas taxas de aprovação sobre os resultados educacionais. Em artigos anteriores já tratamos desse assunto. Ele merece, contudo, uma nova abordagem, que faremos em um artigo próximo.

Josué Modesto dos Passos Subrinho, é secretário de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura – Seduc -, e foi reitor da Universidade Federal de Sergipe e da Universidade Federal da Integração Latino-Americana no Paraná

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