Terça, 21 De Janeiro De 2025
       
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Publicado em 26 de julho de 2023
Por Jornal Do Dia Se


Virginia Woolf: pérolas aos porcos.

Rian Santos – riansantos@jornaldodiase.com.br
 
Efeméride mais besta, o tal Dia do Escritor, celebrado por gente de nariz empinado e tempo de sobra para exortar suposta superioridade intelectual nas redes sociais, como ocorreu ontem. Mais proveitoso seria celebrar a diversidade em páginas e páginas e páginas e páginas.
Sei do que falo. Entre todos os artefatos de minha vaidade, a pequena biblioteca plantada bem no meio da sala se destaca. Há, nas prateleiras abarrotadas, uma amostra heterogênea do mundo inteiro. Das anoitecidas vozes cantadas por Mia Couto aos gemidos afogados em rum barato nas ruínas sujas de Pedro Juan Gutiérrez. As mulheres, no entanto, por si mesmas não falam nunca. Virginia Woolf e Elena Ferrante, aqui em casa e em todas as bibliotecas, são exceções à regra.
A mim, pouco me importam as palavras exaustas dos movimentos identitários. Ocorre que o silêncio de alguns nos deixa a todos mais pobres. Calem Machado de Assis e Lima Barreto, dois crioulos ousados, que tomaram para si a dignidade da palavra, na marra, e observem o rombo cavado nas letras brasileiras. Este seria um buraco sem fundo.
Não se julga um livro pela assinatura do autor na capa. Também seria estúpido deduzir que a inteligência da humanidade foi toda preservada em documentos de cultura. Daí as lacunas de sensibilidade em todos os tempos, em todos os cantos, ainda aqui e agora. O materialismo histórico é uma construção repleta de falhas. Walter Benjamin já nos advertiu sobre as mentiras sussurradas pelo anjo da história.
Contra todas as aparências, as mulheres sempre escreveram, certas de lançar pérolas aos porcos. Anos atrás, a pesquisadora Danielle Rodrigues realizou a curadoria da exposição ‘Escritoras sergipanas’, reunindo 17 mulheres da nossa literatura esquecidas no acervo da biblioteca Epiphânio Doria. Com fotos e informações biográficas, a mostra propunha a imersão na produção das escritoras locais. Núbia Marques, Ilma Fontes, Izabel Nascimento… E por aí vai.
Sim, elas existem. Tanto amam e odeiam quanto escrevem. De si para si, do outro, para os outros. O mundo é grande.Hoje, só permanece na sombra confortável da própria ignorância, alheio à voz do mulherio, quem quer.
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