Se Oscar Wilde fosse um imbecil.
Pela culatra…
Publicado em 16 de março de 2022
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
Pouca gente é capaz de defender a liberdade de expressão, até as últimas consequências. E, só por isso, o espectro do autoritarismo ganha corpo no tempo presente. A censura imposta ao humorista Danilo Gentili, sob o falso pretexto de combater a pedofilia, alerta sobre os caminhos tortos percorridos no encalço da virtude. Com recente decisão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, condena-se uma piada ruim, sob risco muito mais grave.
Explica-se: O governo federal determinou a excomunhão do filme ‘Como se tornar o pior aluno da escola’ (2017), produção de Danilo Gentili que voltou a ser associada à pedofilia por perfis bolsonaristas. O despacho determina que Netflix, Telecine, Globoplay, YouTube, Apple e Amazon suspendam a oferta do besteirol, “tendo em vista a necessária proteção à criança e ao adolescente”.
O pau que dá em Chico, também serve ao lombo de Francisco. Se Gentili é considerado persona non grata pelos discípulos da igrejinha progressista, o mesmo não pode ser dito de seu colega Fábio Porchat, silenciado por força da mesma canetada. Não se trata, portanto, de defender este ou aquele, ao sabor de eventuais afinidades. Mas de observar princípios. Quem se cobre das melhores intenções do mundo para impor limites irrazoáveis à opinião geral e de cada um, coloca a própria cabeça a prêmio, como um boi a caminho do abate.
Cá entre nós, o trabalho de Gentili não faria nenhuma falta a ninguém com algum lampejo de vida inteligente. Eis a minha opinião. Mas ‘O complexo de Portnoy’, romance de Philip Roth, considerado ofensivo por anos a fio, reúne páginas valiosas, indispensáveis. Obras originais excomungadas, reabilitadas depois de sofrer opróbrio ao desafiar a moral vigente, existem às pencas. Os padrões de tolerância às ideias, palavras e comportamentos flutuam no tempo.
Gentili não passa de um mensageiro, uma advertência basbaque sobre a fragilidade das conquistas civilizatórias, uma espécie de Oscar Wilde imbecil. Não fosse o infantilismo reativo de certos progressistas, ele jamais teria sido deslocado para o centro de um debate fundamental, muito maior do que as gagues sem graça que lhe garantem conforto e pão.
O mais sensato seria deixar os idiotas falando sozinhos, feito uma criança mimada em reunião de adultos, doida para chamar a atenção. Excessos criminosos, claro, devem ser enquadrados nos rigores da Lei. Mas nunca se dispara contra reles mensageiro, sob pena de o tiro sair pela culatra.