Sábado, 11 De Janeiro De 2025
       
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REPÚBLICA DO CACIQUE SERIGY


Publicado em 15 de novembro de 2020
Por Jornal Do Dia


 

Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos
Sabe-se que o território sergipano é fruto de uma conquista militar. Que o sangue indígena verteu de forma significativa nos primeiros tempos, causando dizimações, mas também gerando espólios de guerra para os dominadores vitoriosos. Figura muito conhecida nessa saga que teve como desfecho o ano de 1590, um chefe indígena, ainda que derrotado, para além de troféu, também se transformou em símbolo e representação identitária. Deu-se a partir de então uma espécie de antropofagia semiótica, onde o vencido vira lenda e marco.
Líder das tribos resistentes, o Cacique Serigy sobreviveu a todo o processo histórico de Sergipe, alcançando a República em seu esplendor honorífico, seja em representações iconográficas, nas artes, mas também nas várias nomenclaturas e alusões da cultura e do saber científico, nas academias literárias, nos prédios públicos, na prosa e na poesia, na música e até mesmo nas discussões. Na rua.
No final do século XIX, Felisbelo Freire, em História de Sergipe (1891), no capítulo sobre a Conquista de Sergipe, Serigy, bem como Suruby e Aperipê (p.97) estão representados como sujeitos hostis em comparação aos que teriam recebido a expedição jesuítica de 1575, de Gaspar Lourenço e João Salônio.
Na esteira de Freire, Pires Wyne, em História de Sergipe – vol. 1 (1970), deu ao personagem Serigy feições heroicas de resistência, mas também semânticas: "no rio dos siriris" e/ou "chefe indígena" (p. 33). A imagem guerreira e idílica à luz das impressões deixadas pelo viajante alemão Karl Von den Steinen (1855-1929).
Em 1996, a historiografia sergipana entrava em uma nova fase e em novo patamar. Novos estudos e pesquisadores se somam cada vez mais à cena, em ascensão e já consagrados, a exemplo de Maria Thetis Nunes, e aquele personagem seguiu merecendo alguma atenção. Naquele ano, com seu livro Sergipe Colonial I, Thetis colocou em questão a divergência dos historiadores, por exemplo, quanto ao destino de Serigy (p. 26). Preso, qual teria sido seu fim, se fuga ou se morte exemplar, quem sabe uma abdução. Manteve-se a áurea em torno do sujeito. 
No início dos anos 1970, o propalado cacique virou honraria. Trata-se da Medalha da Ordem do Mérito Serigy. Uma das insígnias mais cobiçadas do Estado de Sergipe, concedida pelo Poder Municipal por ocasião do aniversário da cidade de Aracaju. Entre os agraciados ao longo de sua história, a antropóloga Beatriz Góis Dantas, em 1988.
Beatriz Góis Dantas é uma das mais renomadas estudiosas sergipanas, natural da cidade de Lagarto. Entre seus estudos, destaque para o dedicado aos indígenas de Sergipe. Em 1980, escreveu e publicou o livro Terra dos Índios Xocó. No ano seguinte, com Fernando Lins e Luiz Alberto dos Santos, colaborou na montagem da exposição Índios em Sergipe, que contribuiu para que outras investidas fossem feitas no afã de conhecer melhor o povo originário das terras sergipanas.
Assim, novas expressões sobre os índios em Sergipe tomaram conta dos ambientes acadêmicos e universitários, com trabalhos como o livro Temas de História e Cultura Indígena em Sergipe (2016), organizado por Diogo Francisco Cruz Monteiro e Kleber Rodrigues. 
Esta semana, mais do que o costume em razão da peleja do Trump para com o Biden, o mundo prestou mais atenção a uma solenidade. O Dia dos Veteranos de Guerra dos Estados Unidos. Uma cerimônia muito bonita diante de uma coroa de flores. Estaria o Cacique Serigy na condição de merecedor de uma também, como fundador da saga sergipana? Sobretudo, no em que pese todas as celebrações em torno dos 200 anos de Emancipação Política da Bahia ou continuará subsumido em eventos palacianos para apenas uma casta privilegiada ver?
A verdade mesmo é que o Cacique Serigy segue vivo. Ele está nas feiras, no mangue, no folclore, na praia de Atalaia vendendo caranguejo, no Barco de Fogo de Estância e nos Parafusos a torcer e distorcer. Na voz vibrante de Amorosa e nas cordas mágicas dos violões de Chiko Queiroga e Antônio Rogério. Na poesia de Assuero e Jorge Henrique. Ele é o senhor da toada, a toada simbólica e vigorosa de uma gente multifacetada. É, sem sombra de dúvidas, o verdadeiro mandatário deste lugar.

Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos

Sabe-se que o território sergipano é fruto de uma conquista militar. Que o sangue indígena verteu de forma significativa nos primeiros tempos, causando dizimações, mas também gerando espólios de guerra para os dominadores vitoriosos. Figura muito conhecida nessa saga que teve como desfecho o ano de 1590, um chefe indígena, ainda que derrotado, para além de troféu, também se transformou em símbolo e representação identitária. Deu-se a partir de então uma espécie de antropofagia semiótica, onde o vencido vira lenda e marco.
Líder das tribos resistentes, o Cacique Serigy sobreviveu a todo o processo histórico de Sergipe, alcançando a República em seu esplendor honorífico, seja em representações iconográficas, nas artes, mas também nas várias nomenclaturas e alusões da cultura e do saber científico, nas academias literárias, nos prédios públicos, na prosa e na poesia, na música e até mesmo nas discussões. Na rua.No final do século XIX, Felisbelo Freire, em História de Sergipe (1891), no capítulo sobre a Conquista de Sergipe, Serigy, bem como Suruby e Aperipê (p.97) estão representados como sujeitos hostis em comparação aos que teriam recebido a expedição jesuítica de 1575, de Gaspar Lourenço e João Salônio.
Na esteira de Freire, Pires Wyne, em História de Sergipe – vol. 1 (1970), deu ao personagem Serigy feições heroicas de resistência, mas também semânticas: "no rio dos siriris" e/ou "chefe indígena" (p. 33). A imagem guerreira e idílica à luz das impressões deixadas pelo viajante alemão Karl Von den Steinen (1855-1929).
Em 1996, a historiografia sergipana entrava em uma nova fase e em novo patamar. Novos estudos e pesquisadores se somam cada vez mais à cena, em ascensão e já consagrados, a exemplo de Maria Thetis Nunes, e aquele personagem seguiu merecendo alguma atenção. Naquele ano, com seu livro Sergipe Colonial I, Thetis colocou em questão a divergência dos historiadores, por exemplo, quanto ao destino de Serigy (p. 26). Preso, qual teria sido seu fim, se fuga ou se morte exemplar, quem sabe uma abdução. Manteve-se a áurea em torno do sujeito. 
No início dos anos 1970, o propalado cacique virou honraria. Trata-se da Medalha da Ordem do Mérito Serigy. Uma das insígnias mais cobiçadas do Estado de Sergipe, concedida pelo Poder Municipal por ocasião do aniversário da cidade de Aracaju. Entre os agraciados ao longo de sua história, a antropóloga Beatriz Góis Dantas, em 1988.
Beatriz Góis Dantas é uma das mais renomadas estudiosas sergipanas, natural da cidade de Lagarto. Entre seus estudos, destaque para o dedicado aos indígenas de Sergipe. Em 1980, escreveu e publicou o livro Terra dos Índios Xocó. No ano seguinte, com Fernando Lins e Luiz Alberto dos Santos, colaborou na montagem da exposição Índios em Sergipe, que contribuiu para que outras investidas fossem feitas no afã de conhecer melhor o povo originário das terras sergipanas.
Assim, novas expressões sobre os índios em Sergipe tomaram conta dos ambientes acadêmicos e universitários, com trabalhos como o livro Temas de História e Cultura Indígena em Sergipe (2016), organizado por Diogo Francisco Cruz Monteiro e Kleber Rodrigues. 
Esta semana, mais do que o costume em razão da peleja do Trump para com o Biden, o mundo prestou mais atenção a uma solenidade. O Dia dos Veteranos de Guerra dos Estados Unidos. Uma cerimônia muito bonita diante de uma coroa de flores. Estaria o Cacique Serigy na condição de merecedor de uma também, como fundador da saga sergipana? Sobretudo, no em que pese todas as celebrações em torno dos 200 anos de Emancipação Política da Bahia ou continuará subsumido em eventos palacianos para apenas uma casta privilegiada ver?
A verdade mesmo é que o Cacique Serigy segue vivo. Ele está nas feiras, no mangue, no folclore, na praia de Atalaia vendendo caranguejo, no Barco de Fogo de Estância e nos Parafusos a torcer e distorcer. Na voz vibrante de Amorosa e nas cordas mágicas dos violões de Chiko Queiroga e Antônio Rogério. Na poesia de Assuero e Jorge Henrique. Ele é o senhor da toada, a toada simbólica e vigorosa de uma gente multifacetada. É, sem sombra de dúvidas, o verdadeiro mandatário deste lugar.

 

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