Teremos Novos Diretores nas Escolas Estaduais?
Publicado em 21 de junho de 2019
Por Jornal Do Dia
* Tereza Cristina Cerqueira da Graça
O Edital n. 010/2019/SEDUC, recentemente publicado, abre aos integrantes do quadro do magistério estadual, com nível superior, a possibilidade de chegar à direção de uma das escolas públicas. O processo seletivo avaliará as competências de gestão administrativa e pedagógica, considerando a experiência do candidato (10 pontos para gestão de setores da SEDUC e de outras redes, e 5 para direção de escola); levará em conta também prêmios conquistados (5 e 3 pts) e formação acadêmica, concedendo 40 pontos para doutorado, 25 para mestrado e 10 para especialização. Acrescenta mais 10 pontos para uma segunda graduação (nas áreas de Administração, Economia, Ciências Contábeis, Engenharia de Produção e Direito), 6 pontos para Especialização ou MBA em gestão, 5 pontos para cursos de capacitação de diretores e 3 pontos para cursos curtos de liderança e gestão.
Os selecionados nessa etapa apresentarão um Plano de Ação que leve em conta as características da escola, seus indicadores de aprendizagem, fluxo e retenção, apontando estratégias de melhoria. De posse do plano, uma Banca Examinadora fará entrevista com o candidato avaliando suas motivações e competências de gestão, podendo lhe atribuir um máximo de 10 pontos. (Edital n. 010/2019/SEDUC)
Se Aracaju figura entre as primeiras cidades brasileiras a banir a indicação política para os cargos de diretores escolares (1986), Sergipe agora deixa de estar entre os últimos estados resistentes à mudança. Aliás, radicalizou quando resolveu tirar da mira dos políticos a gestão das suas Diretorias de Educação, fazendo também uma seleção, cujo resultado não só dissipou as desconfianças, como revelou a determinação do Governo de Sergipe em melhorar a educação pública estadual a partir da qualificação dos seus maiores dirigentes.
Muitas pesquisas já demonstraram que diretores selecionados academicamente e/ou eleitos pela comunidade escolar tendem a apresentar resultados gerenciais mais afinados com melhoria da qualidade do ensino. "O Processo de Seleção de Diretores nas Escolas Públicas Brasileiras" é uma delas. Publicada em 2015 pela Fundação Itaú Cultural, a pesquisa é capitaneada por Andrea Lucchesi e Paula Pereda, e conta com a colaboração de mais três estudiosos do tema. (Disponível em: https://www.redeitausocialdeavaliação.org.br).
Com dados de 2011, traça um panorama das modalidades de escolha de diretores no Brasil, relacionando os modelos com a formação do dirigente e o desempenho acadêmico dos estudantes, medido pela Prova Brasil e IDEB. O estudo aponta que diretores escolhidos por processos seletivos ou por eleições apresentaram melhores características gerenciais que os indicados por técnicos ou por políticos; já o processo seletivo conjugado com eleições indicou um melhor desempenho acadêmico do alunado. Quanto à rotatividade, conclui que as escolas de melhor IDEB são aquelas onde os gestores estão no cargo há mais de cinco anos.
Como na rede estadual de Sergipe os professores doutores são em número bastante reduzido e, caso algum desses resolva concorrer, sua vantagem sobre os demais é visível, foquemos numa competição entre os atuais diretores e os professores mestres que hoje somam mais de 600 (seiscentos).
Desde alguns anos, as faculdades particulares de Sergipe ofertam uma profusão de cursos de especialização, muitos realizados em finais de semana, e tendo como principal clientela os professores públicos motivados pelos planos de carreira. Então, são poucos os docentes públicos que não tenham no seu currículo uma Especialização. Disso se conclui que a grande maioria dos diretores possui algum desses cursos (10 pontos), entretanto, poucos são portadores de mestrado. Assim, um diretor com especialização inicia o processo com 20 pontos (05 da experiência de gestor, 10 da especialização e 05 de curso de capacitação); um professor mestre sem experiência de gestão já sai na frente com os 25 pontos. É razoável esperar que, interessado na área, ele tenha feito um curso de gestão (há muito, instituições de nível superior, públicas e privadas, ofertam cursos de especialização em gestão educacional ou escolar, inclusive via EAD; todos abertos a qualquer professor), o que lhe dará mais 06 pontos. Portanto, presumivelmente, o professor mestre inexperiente vai para as demais etapas do processo com 11 pontos à frente do diretor atual.
O que poderá tirar a vantagem do inexperiente será a pontuação dada a uma segunda formação, caso o diretor experiente seja bi-graduado numa das áreas acima citadas. Aliás, há de se questionar a contribuição dessa segunda graduação, principalmente se o professor a cursou enquanto exercia a docência ou o cargo, pois, certamente, lhe reduziu as condições de um trabalho mais qualificado, tanto na gestão da escola quanto na atividade de sala de aula.
No estudo que nos aludimos acima, foram analisadas 274 escolas da rede estadual de Sergipe, concluindo-se que 5,2% dos diretores eram nomeados por sugestão de técnicos da SEDUC, 15,3% por outros tipos de indicação e 78,4% por intervenção política. A pesquisa não chega a detalhes, mas nós sabemos como eram (são) loteados os cargos de diretor de escola em nosso Estado, inclusive naquele período onde juntou diferentes apadrinhados num mesmo grupo gestor: o Diretor do político A, o Vice do político B e o Coordenador Pedagógico do político C. Um horror! Diante desse quadro e dos seus reflexos nos indicadores de aprendizagem dos estudantes sergipanos, a recente iniciativa do Governo é um avanço considerável.
A aritmética do edital revela que a Secretaria da Educação quer diretores capacitados academicamente na liderança das escolas públicas; o que é um bom início, mas não é tudo. Na longa caminhada das eleições para diretores da rede municipal de Aracaju, testemunhamos diretores com boa qualificação acadêmica revelarem-se verdadeiros desastres na gestão das escolas, seja por inaptidão/incompetência burocrático-administrativa, seja por inabilidade em intermediar conflitos. Em 2010, vinte e duas das oitenta escolas da rede não apresentaram candidatos.
Por isso, entendo ser esta seleção a alavanca de um processo, cuja execução tem que ser acompanhada e avaliada, inclusive com a participação e fortalecimento dos órgãos colegiados das escolas; esses sim, instâncias legais que garantem uma gestão participativa e democrática. Porém, só verdadeiramente democrática se os mecanismos de gestão e o clima organizacional engendrados pelo diretor e pelo Conselho estiverem voltados para a melhoria da aprendizagem dos alunos – tarefa máxima e principal da escola.
Muito se espera desse novo diretor, mas ele pouco fará se não lhe forem dadas razoáveis condições de trabalho e se não conquistar a confiança dos seus liderados. Fará menos ainda se tiver na sua equipe gestora alguém que lhe dê ‘carteirada’ ou alguém que escolheu pelo único critério da simpatia ou amizade pessoal. Teremos novos diretores escolares? Uma parte da resposta a esta questão é a recente renovação dos dirigentes das DREs, a outra parte dependerá da disposição/motivação dos nossos mais qualificados professores.
*Doutora em Educação pela PUCRS, professora da UNIT e professora aposentada das redes estadual e municipal de Aracaju.