Um bom conselho
Publicado em 26 de novembro de 2022
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br –
Os donos da internet conhecem todos os nossos hábitos de consumo. Ao invés de me oferecerem um Iphone de última geração, por exemplo, atacam o meu correio eletrônico com a sugestão de um milhão de livros indispensáveis à satisfação das ignorâncias no escuro de minha cachola. O gerente ficou louco. A Black Fraude não perdoa ninguém.
Passei anos sem telefone celular, desde quando sofri um acidente na BR 101. O rombo na minha cabeça, vertendo sangue, não intimidou os urubus de tocaia no acostamento da estrada. Foi-se o aparelho, um gatilho de ansiedades tecnológicas. Ficaram as urgências da vida real – a superfície áspera do mundo ferindo os nervos na palma das minhas mãos, a dor e o formigamento na ponta dos dedos.
Com mais de 40 anos nas costas quebradas, começo a me conformar com uma curiosidade crônica. Um livro depois do outro. Devagar e sempre. Não comorei, contudo, as obras completas de Guimarães Rosa, um box luxuoso da Cia das Letras, antes de derrotar as 600 páginas de ‘Moby Dick’. Muito menos pela metade do dobro do preço.
O professor João Costa sabia das coisas. Lembro do conselho, oferecido com a voz grave e o ar senhorial de um personagem sabedor dos próprios méritos. Aproveitem a juventude, ele dizia. Cultura se adquire na época das espinhas. Depois de adulto, não há tempo para o que mais importa. Depois dos 30, os livros são como ostras fechadas, não compartilham o seu segredo precioso com ninguém.
Torço para Johny estar errado. De todo modo, penso em voltar a ‘Moby Dick’o quanto antes.Tenho ainda sede de aventura. Apesar de minha calvície pronunciada e de todos os cabelos brancos.