Uma questão de tempo

 

Não sou de me gabar. Mas, cá entre nós, cedo ou tarde, o bom tino de meus olhos e ouvidos, o bom agouro da sensibilidade empenhada diariamente na redação desta página, recebe a devida confirmação. 

O meu aval não vale nada. Os gestos, as cores, os sons e o discurso aqui defendido com todas as letras, entretanto, termina sempre por receber o insuspeito aplauso de outros públicos, novos interlocutores, as maiores plateias.

A menina Vitória Nogueira, assim evocada por força do hábito, Tori, uma cantora e compositora de timbre e poética especiais, recebeu a minha atenção antes mesmo de se afirmar como artista. Hoje, alguns álbuns depois, ela foi indicada na categoria Brasil pelo Prêmio Multishow. A chancela de uma curadoria sem raízes fincadas na aldeia, a sua terra natal, confirma a minha primeira impressão: aquela menina, agora virada em uma profissional, sempre fez música como gente grande.

Não sou de me gabar. Mas fui eu quem escrevi o primeiro texto publicado sobre The Baggios, após ouvir um EP mal gravado nas lonjuras de São Cristóvão, muitos anos antes de a banda sergipana ser indicada ao Grammy. Do mesmo modo, não esperei a cineasta Everlane Moraes conquistar a crítica especializada, a partir de uma feliz incursão pelo circuito mundial de cinema independente, para alardear a força do enunciado e da linguagem audiovisual em seus filmes.E por aí vai…

‘Descese’, a canção de Tori indicada ao Prêmio Multishow, merece o voto dos leitores deste Jornal do Dia, em resposta aos ouvidos moucos do lugar. Os livros, as montagens, as tintas aqui celebradas, o leitor pode apostar, dão sempre o que falar, simples questão de tempo.