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Aprovada pelo Conselho Estadual de Cultura como Patrimônio Imaterial Sergipano


Publicado em 28 de fevereiro de 2015
Por Jornal Do Dia


 * Marcos Paulo Carvalho Lima

Tão logo os carmelitas aportaram em Sergipe d’El Rey, em 1618, já trataram de construir um rico complexo arquitetônico, que compreende Convento, Igreja e Sede da Ordem Terceira. Atualmente a Igreja da Ordem Terceira do Carmo(ou Carmo Menor), é denominada da Igreja Senhor dos Passos, e dela parte de uma das maiores e mais tradicionais festividades religiosas de Sergipe: a Festa Nosso Senhor dos Passos. A Igreja Nossa Senhora do Carmo (Carmo Maior) abriga várias imagens de rara beleza e inestimável valor cultural e retrata fielmente o barroco brasileiro dos séculos XVII e XVIII. (São Cristóvão. Berço de Sergipe, Guia de Visitação).
 
No Conjunto do Carmo há dois espaços: O Museu/ou Me
    morial de Ex-Votos e o Memorial da Irmã Dulce, que abriga
    um acervo referente a sua passagem por Sergipe, historicamente, são colocadas oferendas em agradecimento as graças alcançadas.
Além de turistas oriundos dos diversos estados e de municípios sergipano, a tradicional festa Nosso Senhor dos Passos reúne romeiros e devotos para agradecer as graças alcançadas e realizar promessas. Os romeiros descem e sobem as ladeiras do município de São Cristóvão cantando e rezando.
Antes do fim de semana que ocorre a Festa, acontecem os três primeiros Ofícios, sempre nas sextas-feiras. O quarto Ofício é chamado de: Ofício da Festa. Prosseguindo, são realizados os três últimos Ofícios, totalizando os Sete Ofícios de Nosso Senhor dos Passos. Em outro momento, focarei mais sobre os Ofícios de Passos e a Verônica. Recomendo leitura dos trabalhos de: Magno Francisco e Ivan Rêgo, alguns se encontram nas fontes consultadas.

As Procissões de Senhor dos Passos são realizadas nos segundos sábado e domingo após a realização do carnaval. Na sexta á noite os fiéis rezam o Ofício da Paixão de Jesus Cristo, em seguida a missa, após, acontece o momento que vem ocorrendo nos últimos anos, o Ensaio para a peregrinação do sábado. No sábado ocorre à primeira procissão, após a Missa Campal realizada a noite na Praça do Carmo, em seguida os romeiros cantam e caminham pela cidade, seguindo roteiro, os sete primeiros passos da Paixão, que são realizados em locais definidos, seguindo tradição, onde são erguidos pequenos altares com uma tela representando a passo a ser cantado pelos cantadores. Os fiéis carregam velas acesas, muitos dos ex-votos são deixados na Igreja noite do sábado e às vezes na sexta. Como havia dito anteriormente, o cortejo sai da Igreja do Carmo, cantores, músicos e promesseiros, seguindo a imagem de Senhor dos Passos. No final da caminhada pelas ruas de São Cristóvão, conforme escrito acima vão até a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Vitória, de onde sairá somente no domingo à tarde. A Romaria segue em silêncio, grande parte dos promesseiros vestem túnica roxa. Saem acompanhando a imagem de Senhor dos Passos. A procissão diurna, chamada Procissão do Encontro, realizada na tarde do domingo tem dois cortejos: Um acompanha o Senhor dos Passos da Igreja Matriz em direção a Praça São Francisco onde ocorre o referido Encontro, são cantados três passos neste percurso, em todos os anos as ruas são as mesmas, porém, muda o local/residência onde para a Romaria, em 2015: 1º Passo, beco da Poesia(casa de Dona Marita); 2 º Passo, na rua Frei Santa Cecília, (casa de Dona Gilza), os Passos são parados em frente as residências, 3º Passo, Praça são Francisco, de onde prosseguem a romaria. O outro cortejo sai da igreja do Carmo acompanhando a imagem de Nossa Senhora em direção à mesma praça. Um sermão é realizado no momento do encontro das imagens, logo após ouve-se o canto da Verônica, o momento mais aguardado pelos romeiros. Os promesseiros atiram suas vestes penitenciais em direção às imagens.

De acordo com o pesquisador Ivan Rego, a referida festa é destinada à renovação de votos em favor do Senhor dos Passos, um dos mistérios da Paixão. São dois dias de celebração onde o Martírio de Cristo e a Dor de Sua Mãe ao presenciá-lo a caminho da Crucificação, são relembrados por milhares partícipes que chegam de várias partes do estado e do Brasil. Os devotos, fiéis, promesseiros, penitentes, turistas e observadores dão a solenidade são cristovense o tom de festa polissêmica e multifuncional onde o destaque fica tanto praças, ações penitenciais públicas relacionadas ao ideal de imitação de um Cristo que sofreu, como para as ações de desobriga. Esses atos de fé e religiosidade em São Cristóvão atestam a eficiência do compromisso entre devoto e o Senhor dos Passos. (ARAGÃO, Ivan. Festa, Memória e Turismo Cultural-religioso)

As festas com base no caráter sagrado ou profano são acontecimentos tradicionais, que deslocam grande contingente de pessoas em busca de conforto espiritual, equilíbrio psicológico, fuga do cotidiano, lazer e enriquecimento cultural. Embora em mais de cinco séculos de presença portuguesa no Brasil, as festas profissionais de origem ibérica tenham se ressignificado, as mesmas são "uma das mais antigas manifestações da vida social no Brasil. Elas diferem umas das outras conforme a época e a sociedade, mas, invariavelmente, representam os valores, reforçam as estruturas sociais e ajudam a construir a identidade de um grupo. ( REGO, Ivan […]", apud Ferreira, 2009, p. 11).

Ainda no artigo de Ivan, as celebrações sagradas dão instrumentação para identificar nesses eventos uma vivência do religioso incorporado ao cultural, possibilitando, muitas vezes, a recuperação da própria identidade (Martins & Leite, 2006). No país, ainda predomina o catolicismo como religião em destaque, nesse contexto, ao longo do ano as festas de padroeiros e santos fazem parte do dia a dia das pessoas. Iniciando em janeiro, com as comemorações dos Santos Reis; em abril, a Semana Santa; passando por datas festivas como Corpus Christi e festas do ciclo junino, em junho; e finalizando com o Natal, em dezembro; há ainda as homenagens aos santos e padroeiros, no calendário litúrgico anual. Santos e Nunes (2005), refletem que:

As festas constituem um dos principais momentos do catolicismo popular. É difícil imaginar o cotidiano de uma pequena cidade brasileira sem as agitações das novenas, santas missões, acompanhamentos e procissões. Essas são algumas expressões de religiosidade que acabam por se tornar um grande instrumento para se compreender a sociedade na qual estão inseridas (p. 98). (IBID)    

O pesquisador Magno Francisco, que se dedica há anos estudos sobre religiosidade, nos diz que: "A romaria do Senhor dos Passos também é o lócus dos sentidos. Para sentir o tempo de penitência dos Passos podemos fechar os olhos e ouvir o dobrar dos sinos, os motetos dos sete Passos, o lastimoso canto da Verônica ou os benditos dos pedintes. Podemos sentir os cheiros que rondam a cidade, com os cabelos queimados pelas velas na Procissão do Depósito, com o manjericão exposto nos andores. O paladar também é inconfundível com as famosas queijadas e briceletes vendidos nas ruas e ladeiras da cidade. O calor humano transcende o espaço da igreja, sentido no aperto entre os devotos transportando os andores do Senhor dos Passos e da Virgem da Soledade pelas ruas estreitas. Podemos finalmente abrir os olhos e ver o colorido dos parques de diversões na cidade baixa, o roxo nas sacadas dos casarões, das igrejas e dos corpos dos romeiros, sem esquecer do que os devotos fazem questão de destacar: a beleza dos "olhos vivos dos Senhor dos Passos".
Com relação à guarda da imagem, de acordo com o historiador Thiago Fragata, conforme reza e tradição, a imagem de Senhor dos Passos e a organização do ato processional ficava aos encargos dos leigos da Irmandade de Nossa Senhora do Carmo, transformada em Associação em 1977. No passado, São Cristóvão foi centro político e religioso da Capitania Del Rey. Assim, segundo Fragata, esse antigo centro de convergência religiosa preserva manifestações culturais do período colonial, como a Procissão de Senhor dos Passos.

Para ele, não é possível datar com exatidão o início da maior Romaria de Sergipe, os indícios acenam que tudo iniciou no final do século XVIII ou início do XIX. Com base em Serafim Santiago, Fragata diz: "consta que a imagem articulada, chamada de roca, em razão das características constitutiva e mobilidade, foi encontrada no rio Paramopama, afluente do Vaza Barris.
No ano de 2010, o Arcebispo José Palmeira Lessa, através de Decreto, oriundo da Arquidiocese de Aracaju, determina: 1 – A Festa Senhor dos Passos da Cidade de São Cristóvão será sempre da responsabilidade e coordenação do sacerdote que tenha a cura pastoral da Paróquia de Nossa Senhora da Vitória; 2 – A antiga e venerável imagem do Senhor dos Passos, conservada no templo chamado Carmo Menor, bem como todo o acervo aí presente, é de responsabilidade de quem ocupa o Convento do Carmo, atualmente os frades da Ordem Carmelita; 3 – Em se tratando de levar a imagem do Senhor dos Passos em peregrinação, fora da tradicional procissão no Tempo da Quaresma, utilizar-se-á sempre uma réplica, confeccionada para este fim, e nunca a imagem original. (retirado na íntegra).

A Festa Nosso Senhor dos Passos, não somente para os são cristovenses, mas, para os sergipanos, principalmente a comunidade católica, possui um valor histórico e cultural, de cunho tradicional religioso. O pedido de registro foi aprovado pelo Conselho Estadual de Cultura, Processo nº22/10, de 02 de julho de 2010, assunto: Registro Senhor dos Passos, como bem imaterial do patrimônio cultural sergipano. Autora da propositura: Ana Nascimento Fonseca Medina, a relatora do processo, foi a conselheira Ana Conceição Sobral de Carvalho, segundo a relatora:  

A magnitude e a abrangência do fato cultural preservado até os dias de hoje, pela comunidade devocional, torna relevante o reconhecimento oficial através do registro como bem imaterial do patrimônio cultural sergipano. (SORBRAL, Ana Conceição de carvalho).

    Para Ana Conceição, assim conhecida, aliada ao registro como patrimônio imaterial, é importante elaborar projeto de mapeamento detalhado do conjunto que envolve o ato religioso e está em seus vários aspectos, como rituais de penitencia, objetos devocionais, músicas, cantos, culinária, entre outros fatos que emanam desse universo místico, para efeito de estudo, publicação e difusão.

Do ponto de vista social, as comunidades, os grupos de pessoas que se reúnem à volta de "uma fé", fazem da educação o ponto de aprendizagem dos fenômenos religiosos da sua relação com o divino na perspectiva que o ser intelectual só é na sua plenitude enquanto produto do espiritual. Esta relação intelectualidade/espiritualidade constitui-se como parte integrante dum patrimônio religioso e ao mesmo tempo sinal de pertença de um lugar. (CAMPOS, Fernando, Educação e Religião: Patrimônio, Pertença e Identidade).

Todavia, este referencial de cultura também alcança vertentes que envolvem o âmbito social e econômico local, sobretudo, os significados que as comunidades e sociedades atribuem à importância daquele bem religioso/cultural, influenciando os vários meios de difusão inerente também ao âmbito do turismo.
O pluralismo cultural e religioso, apreendido nos estudos das sociedades multiculturais é retransmitido através de veículos acadêmicos onde perpassam todo o viés de segmentos religiosos, onde a cultura predominante em certo âmbito geográfico utilizará de seu entendimento com o campo da divindade, seguindo herança, a fim de dar continuidade também aos processos educativos de ensino/aprendizagem e a transmissão da tradição religiosa de geração para geração.

* Marcos Paulo Carvalho Lima é licenciado em História pela UFS, especialização em Ensino para a Igualdade nas Relações Étnico Raciais/FSLF e Pesquisador

Fontes Consultadas:
ARAGÃO, Ivan Rego,. Análise do Marketing Religioso na "Segunda Maior Romaria do Nordeste Brasileiro no Período da Quaresma" História Agora: A Revista do Tempo Presente.
ARAGÃO, Ivan  Rego.  Festa, Memória e Turismo Cultural-Religioso: A Procissão ao Nosso Senhor dos Passos, em São Cristóvão-Sergipe.  Revista  Rosa dos Ventos.
SANTOS, Magno Francisco de Jesus, NUNES, Verônica Maria Meneses, Na Trilha dos Passos do Senhor: A Devoção ao Senhor dos Passos de São Cristóvão/SE. Revista da Fapese de Pesquisa e Extensão, v. 2, p. 97-110, jul./dez. 2005
SANTOS, Magno Francisco de Jesus, Os Últimos Passos de uma Devoção: Indícios da religiosidade de um nobre sergipano oitocentista. Historien, Revista de História(3) apr/set de 2010.
http://lmariap.blogspot.com.br/2009/05/festa-de-senhor-dos-passos.html

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