FORROZEIROS PUXAM O CORTEJO DURANTE O ENTERRO DA CANTORA CLEMILDA NO CEMITÉRIO SÃO JOÃO BATISTA: HOMENAGENS
Artistas e populares homenageiam Clemilda
Publicado em 27 de novembro de 2014
Por Jornal Do Dia
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
"Depois de morto, acabou". Em outro filme, a sentença proferida pela forrozeira Clemilda, logo nos primeiros minutos do longa metragem Morena dos Olhos Pretos (2014), poderia soar oportunista. No documentário dirigido por Isaac Dourado, ao contrário, o desaforo desmascara a pieguice das homenagens tardias e abençoa o intento do diretor. Um tabefe nas fuças de uns e outros. Sem meias palavras. Em alto e bom som.
Apesar de ancorado na trajetória musical de Clemilda, Morena dos Olhos Pretos presta um tributo ao conjunto dos operários da cultura popular nordestina – Uma faina pesada, cuja recompensa usual está muito aquém da alegria proporcionada a tanta gente, Brasil afora. Coroado pelo aplauso e por uma popularidade sem precedentes entre os nossos, o caminho da forrozeira sergipana não nega a poeira que venceu o talento de tantos outros. Antes, a revela.
São muitos os temas subjacentes à trama costurada por Dourado, por meio de depoimentos colhidos junto a comunicadores e aos maiores nomes do forró nordestino de então ao longo do filme. Embora não se preste a tal propósito, o documentário poderia amparar, por exemplo, uma discussão muito oportuna a respeito da cegueira e influência dos meios de comunicação de massa no gosto médio da população. O papel do Estado no amparo aos valores de determinado lugar também é abordado, en passant. E por aí vai. Vida e morte, o duelo fundamental, no entanto, pontua a maior parte dos testemunhos.
Entre tantas declarações emocionadas, o desabafo da cantora Amorosa se destaca. Sempre contundente, ela defende que nenhuma homenagem substitui a altura do palco negado pelo poder público local a Clemilda. Eu assino embaixo. Tapinhas nas costas não pagam as contas no fim do mês.
Curto e grosso, o filme de Dourado vai direto ao ponto. Em um ambiente obsedado pelos sinais mais superficiais do sucesso, a história de Clemilda faz uma advertência sobre as motivações que impulsionam o exercício criativo em nossos dias. Pra bom entendedor, meia palavra basta.
Uma nota triste – A cantora Clemilda perdeu na madrugada de ontem a batalha de vida e morte que enfrentava desde o último 11 de julho, quando deu entrada em um hospital particular da capital sergipana. Apesar da consternação popular, que reclamava o aparelho público e honras de chefe de Estado, foi velada e enterrada como a gente simples que a inspirava. No céu, especula-se, as homenagens teriam sido mais efetivas.