Inveja de Diogo Mainardi
Publicado em 11 de agosto de 2022
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
Nunca me supus invejoso. Desde ontem, no entanto, não concebo felicidade possível além da vida vivida por Diogo Mainardi.
Pouco me importa a grama do vizinho. Não quero para mim os bens do escritor e jornalista, a janela aberta para os canais de Veneza, a juba espessa de galã dos anos 50. Nada disso me interessa. Invejo, antes de tudo, a sua imitação canhestra de João Gilberto. Sem violão, sem gênio, Diogo deu as costas para a platéia, abandonou o espetáculo sem aviso prévio, a fim de ser esquecido pelos leitores preguiçosos da internet e se ocupar apenas com o próprio jardim e a biblioteca.
João Gilberto fez parecido. Antes de se recolher em mistério, de uma vez por todas, trancou-se na altura pouca de um décimo andar. Apertos financeiros, ofertas de somas milionárias por algumas horas de show, nada o convenceu a tirar o pijama para se apertar num terno, uma última vez. Louco, misantropo, até o fim.
Digo e repito: A renúncia é um gesto incompreensível para o comum das gentes, os inocentes do Leblon, pobres de imaginação, carentes de afetos e recursos. Como pode, alguém com o mundo inteiro aos próprios pés se conformar com as quatro paredes de um apartamento? Quem se espanta não conhece a felicidade, um artigo doméstico.
Sim, tenho inveja de Diogo Mainardi. O jornalista deu de ombros e renunciou às lides da opinião política, não está mais obrigado a ler jornal. Eu, ao contrário, tenho de engolir seco, a par de uma disputa fratricida, capaz de reunir os herdeiros do projeto concebido pelo ex-governador Marcelo Déda e bolsonaristas juramentados em um mesmo palanque, como a dizer: Foda-se a Democracia!