Segunda, 07 De Outubro De 2024
       
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Lembrança de Araripe Coutinho


Publicado em 15 de dezembro de 2021
Por Jornal Do Dia Se


Sangue nas veias.

Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br

Sempre atenta, a professora Maria Roseneide Santana lembrou esta semana de um poeta morto, justamente no último dia 13, quando todas as atenções estavam voltadas para o sorriso largo de Luiz Gonzaga. O sanfoneiro nasceu na mesmo data em que Araripe Coutinho veio ao mundo, muitos anos depois. A mim, no entanto, assombra-me os versos, mais do que as canções. Isso porque a memória pouca dos sergipanos é capaz de os enterrar mais uma vez.
Conta-se muitas histórias sobre Araripe. Nenhuma faz justiça a seus versos mais inspirados. ‘Nenhum coração’ (2008), o seu último suspiro literário, nunca foi páreo para a infinidade de causos protagonizados pelo poeta, de um requinte prosaico. O nu do Palácio Olímpio Campos, escandaloso, periga ser lembrado como o seu maior momento.
Embora cultivasse uma imagem frívola, a ponto de assinar, em seus últimos dias, uma excelente coluna social, Araripe foi veículo de pelejas existenciais bastante agudas. Viado, preto e pé rapado, ele frequentava as altas rodas da província com a maior naturalidade do mundo, habitué de gente graúda. Quando as luzes apagavam, no entanto, sobrevinham poemas carregados de aflição e o poeta perguntava às paredes: “Quem se lembraria de trazer-me um pêssego numa tarde de angústias?”.
Em público, Araripe ria muito e falava alto. Na folha em branco, na ponta da pena, entretanto, o tom era outro, e ele se lamentava, sem preocupação com as aparências: “Se eu pudesse dizer como anda a minha casa…”.
Nos livros, Araripe confessava o que jamais seria admitido em sociedade, quando o personagem das caras e bocas finalmente se calava. O seu eu lírico tinha sangue correndo nas veias. E se expunha em versos, certo de não ser realmente ouvido (aposta minha), como quem fecundasse garrafas e mais garrafas com as próprias lágrimas, às escuras, antes de finalmente lançá-las ao mar.

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