O poeta não morreu
Publicado em 16 de dezembro de 2023
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
Doente de nostalgia, procuro um Kashima de cordas enferrujadassob o amontoado de informação de ‘Onirikum’, álbum solo recém-lançado porJulio Andrade (The Baggios). Espero o berro.Anseio pela catarse de versosnada elaborados, francos como um esporro, uma bofetada. O murro não vem.
Músico maduro, Julico agora se expressa de maneira muito sofisticada, por meio de arranjos espertos, texturas, nuances. O guitarrista cresceu, ganhou experiência, sabe hoje muito mais do que sabia ontem, largou as fraldas fedorentas de mijo.E o seu trabalho reflete um orgulho perfeitamente legítimo, derivado dos primeiros fios de cabelobranco.
‘Onirikum’ não pode ser definido, contudo, como um álbum de homem velho, muito ao contrário. Trata-se aqui de um registro perfeitamente conectado com a torrente de informação própria dotempo presente. O projeto gráfico do disco, aliás, foi realizado com o auxílio de inteligência artificial. Velho sou eu, um jornalista profissional de meia idade, animal cativo de saudades imensas, amordaçado pela fantasia de “bons tempos”.
Sim, eu também já tive vinte e poucos anos, bebi todasno Capitão Cook, ludibriado pela brevidade de minha própria juventude – uma flor varrida pelo vento. Já tive muito cabelo e pouco juízo.Ouvi The Baggios, o registra seminal, estupefato. Nunca me recuperei.
Tudo passa, no entanto. ‘Onirikum’ ecoa por aí, emociona, faz barulho. E afiança, contra toda a letargia, o compositor ainda é vivo.
Julico apresenta ‘Onirikum’:
23 de dezembro, às 18 horas, na Reciclaria.