Sem limites
Publicado em 19 de julho de 2022
Por Jornal Do Dia Se
Rian Santos
riansantos@jornaldodiase.com.br
O ator Rodrigo Santoro vive Fernão de Magalhães, em minissérie da Prime Vídeo. Há quem fale bem do novelão, conformado com o quase nada oferecido em matéria audiovisual pelas plataformas de streaming. Convém mencionar, contudo: Trata-se de um personagem dos mais relevantes, o primeiro navegador a contornar a circunferência do mundo, com gana de buscar o horizonte.
Alheio ao buxixo, ensaio um muxoxo. A carreira do ator brasileiro não me inflama os brios ufanistas. Lembro, no entanto, de excursão parecida, promovida sob pretexto diverso. Que fim teria levado os negacionistas da terra plana?
Nau sem rumo – “A maior aventura de todos os tempos”, assim foi definida a excursão planejada pela Conferência Internacional da Terra Plana (FEIC, na sigla em inglês), com o objetivo declarado de navegar até a borda presumida do planeta. A nau sem rumo deveria partir em 2020. Mesmo antes de zarpar, no entanto, o cruzeiro afrontou a experiência dos primeiros navegantes, todas as cartas náuticas e até as estrelas. Um delírio amparado na confusão entre os domínios da fé e da ciência.
Para alguns, o Big Bang e a Teoria da Evolução das Espécies são tão plausíveis quanto qualquer passagem da bíblia. Submetido ao crivo de crenças diversas, a maioria de natureza religiosa, o conhecimento acumulado ao longo da História é rebaixado ao status de mera suposição. Assim, se tudo não passa de hipótese, Deus é mais.
Teorias da conspiração sempre existiram, para todos os gostos, nos quatro cantos do mundo. A corrida especial, um produto de propaganda da Guerra Fria, por exemplo, ainda hoje alimenta toda sorte de desconfianças. Mas uma coisa é duvidar da presença do homem na lua, com transmissão ao vivo por rede de televisão. Outra, muito diferente, é atribuir a ditas palavras sagradas, entre outras convicções pouco ortodoxas, o poder de encerrar qualquer assunto com um autoritário ponto final.
Em artigo publicado na Gazeta do Povo, o professor Carlos Orsi lembra que a forma da Terra é uma das certezas mais bem assentadas da humanidade. Filósofos e matemáticos a demonstraram, a partir de todas as evidências, séculos antes do suposto nascimento de Cristo. Pitágoras já falava numa Terra redonda, assim como Aristóteles. Eratóstenes chegou a calcular a circunferência do planeta, usando sombras ao meio-dia.
Nicolau Copérnico, o primeiro a observar que o homem de carne e osso, a mais imperfeita das criações divinas, não habita o centro do universo, mas vive apeado num modesto cavalo obediente, apenas mais um pangaré no carrossel cósmico governado pelo sol, certamente não estranharia as mistificações deste século XXI. O mundo gira e gira sobre o próprio eixo, em torno de um astro em chamas, mas muita gente ainda se recusa a deixar o buraco do próprio umbigo e vive sob rédeas curtas, com a cabeça enterrada no mesmo lugar.