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UM CORAÇÃO REAL PARA UM PAÍS SEM CORAÇÃO


Publicado em 27 de agosto de 2022
Por Jornal Do Dia Se


Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos

Se a saudosa Carlota Joaquina (1775-1830) estivesse viva, certamente diria algo do tipo em relação ao nosso tempo: “Este é um lugar onde faltam lideranças com cojones”. Quem dera, Princesa do Brasil! O problema é mais sério do que possamos imaginar. Quase duzentos anos depois da “Independência”, para além da democracia, estão em jogo também coisas como esperança, perspectiva e projeto de nação. Em grande medida, nada mudou. Seguimos como na canção de Vital Farias: “(…) sem rumo, sem direção / com os olhos cheios de água, / sumiu levando esta mágoa / dentro do seu coração” (Saga da Amzônia,1984).
No último dia 22 de agosto, com honras de Estado, foi recebido no Brasil o coração do Imperador Dom Pedro I. O mesmo deverá ficar entre nós até o dia 9 de setembro, quando retornaráà igreja de Nossa Senhora da Lapa (Porto, Portugal), onde fica guardado há 187 anos. Entre os muitos memes que vi na internet, um me chamou a atenção: “O coração da monarquia fica tão bonito assim, fora do peito e parado”.
O médico sergipano, Manoel Bomfim (1868-1930), foi um dos adeptos desse sentimento antilusitano. Grande estudioso da educação e das ciências sociais do Brasil, atribuía à Coroa Portuguesa parte considerável do que ele chamava de “males do país”: “E esse Portugal, de mercantis degradados, entregue à saudade má dessas Índias perdidas; esse Portugal, a projetar sobre o Brasil a sombra sinistra do seu declínio, deu-nos todos os males de uma vida estiolada, fora dos estímulos em que o Ocidente se refazia”
Isto ajuda a explicar, por exemplo, porque o coração de Dom Pedro não está no Brasil e porque somente a partir de 1972 seus restos mortais se encontram na Cripta do Monumento à Independência, no Museu do Ipiranga, em São Paulo. No fundo no fundo, há ainda no sentimento nacional um certo resquício antilusitano, propagado largamente pela República. Aliás, é daquele mesmo ano o famoso filme “Independência ou Morte”, de Carlos Coimbra, um dos maiores sucessos de bilheteria do país.
Até mesmo eu que não morro de amores por Monarquia e tão pouco por Dom Pedro I, sou instado a concordar com o jornalista Otávio Guedes, da Globo News. Em seu blog, Guedes assina uma reflexão muito interessante, intitulada “Brasil desrespeita, a prestações, o último desejo de Dom Pedro I”. Ele lembrou que as comemorações do Sesquicentenário da Independência do Brasil aconteciam num momento de regime ditatorial e que aquele “governo” havia se prevalecido disto para fazer propaganda nacionalista, pasmem. Era o famigerado governo Médici.
“Saudosista da ditadura militar”, aspas para Guedes, com as quais concordo em gênero, número e grau, e aspirante a ditador, ao presidente Jair Bolsonaro coube a “honra” de receber o coração do imperador mais carismático da História do Brasil, não que seu não filho não o tenha sido. Cinquenta anos depois de Médici, em pleno regime democrático, três momentos personalistas se encontram como a conjunções astrais do pior agouro possível.
O que há, portanto, em comum entre 1822, 1972 e 2022? A ausência popular, a secundarização da vontade e da soberania popular. Digo mais: do protagonismo popular. De decisões de alcova às palacianas, a completa ausência daqueles que efetivamente constroem essa nação. Para além dos personalismos, das sandices momentâneas de poder, um coração sem coração, uma nação sem rumo e sem direção, com fome, cansada e desejosa de dias melhores.

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