Serviço de transporte coletivo é ruim em todo o País
Greve da VCA afetou saúde financeira de outras empresas
Publicado em 07 de julho de 2013
Por Jornal Do Dia
Empresas de ônibus devem regularizar pagamentos
Cândida Oliveira
candidaoliveira@jornaldodiase.com.br
A semana vai começar com a regularização do pagamento dos rodoviários das empresas de transporte público em Aracaju. De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário de Aracaju (Sinttra), Miguel Belarmino da Paixão, terça-feira, dia 9, haverá uma reunião entre a direção do sindicato, da Viação Cidade de Aracaju (VCA) e Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Município de Aracaju (Setransp) para definir quando inicia o pagamento do salário e do ticket alimentação referente ao mês de junho.
Na sexta-feira, dia 5, foi finalizado o pagamento da pensão alimentícia e férias de junho. O mês de maio já foi regularizado em sua totalidade – salário, ticket alimentação, pensão alimentícia e férias. "O Setransp está dando todo apoio para que a situação se regularize", contou Miguel.
Por conta dos dois dias de paralisação as empresas Progresso e Modelo estão com dificuldade em pagar aos seus trabalhadores. "Alegam que o financeiro foi afetado, porém prometeram que no dia 9 de julho farão o pagamento do salário e ticket, no caso da Progresso, e apenas salário a empresa Modelo", informou o sindicalista.
Interrupção – Novas paralisações não devem mais acontecer se depender da direção do Sinttra. "Nós estamos atuando no sentido de conscientizar os trabalhadores da VCA para que possam apoiar a empresa nesse momento de crise, pois parar a circulação dos veículos prejudicará a população e as empresas. Por isso, esperamos que as paralisações não voltem a acontecer", ressaltou Belarmino.
Em Aracaju há 4 mil trabalhadores rodoviários, entre motoristas, cobradores, funcionários da administração e manutenção. Apenas a VCA conta com 1.300 funcionários. São três os grupos que dominam o setor do transporte público. A VCA formada pelas empresas São Cristóvão, Cidade Histórica e São Pedro; Halley e Modelo; Progresso e Tropical. A empresa Progresso é a maior delas.
Qualidade dos veículos – As manifestações realizadas em Aracaju pelo Movimento Não Pago não reivindicam apenas a queda no valor da tarifa da passagem, mas qualidade na oferta do serviço. Os veículos geralmente estão em péssimo estado de conservação, uma realidade que afeta não apenas os usuários, mas também motoristas e cobradores. De acordo com o sindicalista, a caloria emitida pelo motor, os assentos irregulares e o barulho tem afastado muitos trabalhadores do setor. "Geralmente essas pessoas se afastam pelo INSS por motivo de doenças", revela.
A carga horária também é pesada, 8h20 por dia, com intervalo de 1h e há casos de trabalhadores que cumprem uma carga horária de até 12h, principalmente nos finais de semana. "Esses são temas discutidos com as empresas, a fim de que possam melhorar o dia a dia do trabalhador. Inclusive temos reuniões constantes com a gerência operacional de cada empresa para avaliar as escalas", contou.
Paralisação – Dois dias de paralisação – 27 e 28 de junho – dos rodoviários transformou a cidade de Aracaju em um verdadeiro caos. Cerca de 250 mil pessoas que utilizam diariamente o transporte público ficaram sem locomoção. Os empregados da empresa VCA pararam as atividades para reivindicar o cumprimento de uma ordem judicial que obrigava a empresa a pagar dívidas trabalhistas, salários atrasados, pensão alimentícia e ticket alimentação no valor de R$ 360.
Para ajudar os companheiros, motoristas e cobradores de outras empresas também pararam. Resultado, 528 ônibus deixaram de circular pelas ruas aracajuanas e da Grande Aracaju. A fim de amenizar os transtornos gerados com a paralisação, a Superintendência de Transportes e Trânsito de Aracaju autorizou que veículos de transporte escolar e táxis ofertassem o serviço de transporte coletivo.
Tansporte público ruim afeta saúde, educação e cultura da população, dizem especialistas
Agência Brasil
Os efeitos negativos de um transporte público caro e de má qualidade não estão restritos à questão da mobilidade urbana. Prejudicam também outras áreas vitais para a vida do cidadão, como saúde, educação, finanças e cultura. Especialistas e integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) consultados pela Agência Brasil avaliam que a mobilidade urbana está diretamente relacionada à qualidade de vida, além de ser um dos maiores causadores de estresse da vida das pessoas.
"É um trauma para todo mundo. Principalmente para quem fica em pé, duas horas, crucificado, com alguém tentando pegar bolsa, apalpar. Não é à toa que as pessoas estão preferindo usar motocicletas, mesmo que isso represente risco a própria integridade física por causa dos acidentes, e não é à toa que essas manifestações conseguiram tantas adesões", disse à Agência Brasil o doutor em políticas de transporte pela Universidade Dortmund, na Alemanha e professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UnB), Joaquim Aragão.
As manifestações citadas pelo especialista foram iniciadas pelo MPL em São Paulo. O movimento tem, como um de seus interlocutores, o professor de história Lucas Monteiro. "Defendemos Tarifa Zero porque, além de ser a única forma de as pessoas terem acesso à cidade, o transporte público beneficia áreas vitais como saúde e educação. Por isso já imaginávamos que nossa luta se espalharia pelo país, mas não que iria alcançar a dimensão que alcançou", disse à Agência Brasil.
De acordo com o representante do MPL, o incentivo ao uso de transportes individuais causa também problemas como aumento da poluição e do número de atropelamentos, o que resulta em mais gastos e problemas para a saúde pública. Dados do Ministério da Saúde mostram que, em 2010, 42.844 pessoas morreram nas estradas e ruas do país. Desse total, 10.820 acidentes envolveram motos. No mesmo ano, o gasto total do Sistema Único de Saúde (SUS) com acidentes de trânsito foi R$ 187 milhões. Só com internação de motociclistas foram gastos R$ 85,5 milhões.
Além disso, acrescenta Monteiro, diversos tratamentos de saúde deixam de ser feitos porque os pacientes não têm condições de pagar pelo deslocamento. E o problema relacionado à falta de condições para custear os transportes também afeta o direto e a qualidade da educação.
"Frequentei muitas às escolas públicas. É comum alunos faltarem aulas por não terem dinheiro para ir à escola. Além do mais, direito à educação não está restrito a apenas ir à escola ou ao banco escolar. Os estudantes precisam ter acesso à cultura, a visitar museus. E, sem circular, não há como ter acesso a isso. A grande maioria não vai ao centro da cidade, museus, centros culturais para complementar sua formação", disse Monteiro.
Segundo Aragão, dificuldades para mobilidade urbana afetam diretamente o rendimento escolar de jovens e crianças, que ficam cansados e com o sono sacrificado. "É um fator a mais a prejudicar o rendimento, além da qualidade de instalações do ensino público. Da mesma forma, afeta também a evasão escolar, a formação de profissionais e a produtividade do país", disse o especialista.
"A mobilidade bloqueia inclusive a vida social do cidadão de baixa renda, que fica sem acesso a entretenimento, cultura e lazer. Esses são privilégios das pessoas motorizadas. Uma família de quatro pessoas que queira se deslocarem da periferia até um parque no centro da cidade gastará R$24, caso a passagem unitária custe R$3. Para quem recebe salário mínimo, isso é impossível", disse.
Arquiteto, urbanista e especialista em transporte público, Jaime Lerner diz que por trás das manifestações iniciadas pelo MPL está o descrédito nas políticas públicas e a falta de respostas à sociedade, sobre os diversos serviços públicos prestados a ela. "E tudo fica mais fácil em todas as áreas quando se tem um bom transporte público", disse o ex-prefeito de Curitiba (PR).
Muitas das mobilidades foram anunciadas sem sequer estudar a própria cidade, avalia Lerner. Segundo ele, é importante entender a cidade como um sistema de estrutura de vida, trabalho, movimento e mobilidade juntos. No fundo, acrescenta, faltam decisões políticas, e, em geral, essas decisões são voltadas para soluções mais caras.
"O Brasil é rápido em fazer coisa errada e demorado em fazer a coisa certa", disse. "Sustentabilidade é equação entre o que você poupa e o que você desperdiça. Portanto, se tiver de se deslocar por distâncias cada vez maiores, é óbvio que a coisa não vai funcionar".