Quinta, 17 De Abril De 2025
       
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Na alegria e na tristeza


Publicado em 27 de abril de 2013
Por Jornal Do Dia


Um filme intrigante, provocador, analítico

* Anderson Bruno

O longa-metragem ‘Amor’ (Amour, Dir. Michael Haneke, 2012, FRA, ALE, AUS, 127 min), vencedor do César e da Palma de Ouro no Festival de Cannes do ano passado, bem como os troféus do Globo de Ouro e do Oscar na categoria Filme Estrangeiro, finalmente chegou ao cinema sergipano através da Sessão Cine Cult.

É um filme intrigante, provocador, analítico. Não é um filme fácil, não é um filme simples. Como também não é um filme 100% arrebatador a ponto de ser colocado no alto de um pedestal sozinho. No pedestal sim, mas ao lado de outros tão grandes cinematograficamente quanto. Digo isso em virtude da empolgação pelo frescor do momento, quando uma nova produção é lançada no meio artístico e, já ‘de cara’, ser considerada única, singular e intocada.

Ótimos predicados a produção tem, mas não a ponto de ficar sozinha sob as luzes dos holofotes dos cânones das artes. O título já nos apresenta a um sentimento que leva consigo toda uma carga de significados e simbolismos diferente dos demais. O ser humano não sente amor por outra pessoa a todo o momento. Simplesmente aparece. E especifico aqui a parte conjugal do sentimento de amor. Ele é poderoso.

O número 1. As religiões o exaltam, os poetas o exaltam; até os sujeitos mais vis o desejam! (como não se lembrar de Laurence Olivier em ‘Spartacus’ (Stanley Kubrick, 1960) ao revelar, num diálogo com Jean Simmons, ser essa sua principal motivação na perseguição do personagem título de Kirk Douglas? Spartacus irradiava e magnetizava amor. Seu algoz, não).

O casal octogenário, protagonista de ‘Amor’, experimenta o turbilhão de outros sentimentos quando a saúde dela se deteriora. ‘Na alegria e na tristeza. Na saúde e na doença’. A famosa frase do cerimonial de casamento passa a ser a principal personagem do filme, num doloroso embate filosófico e existencial de sustentação de todos os preceitos arraigados nessa mensagem cristã.

A partir daí é drama no seu estado mais puro e concentrado. Michael Haneke acompanha o processo do dia-a-dia da vida do casal em planos longos e sem trilha sonora ou canções. Apenas um silencioso som ambiente. Seu ápice monstruoso soa um tanto óbvio dentro das características depressivas da condução da história. O tapa na cara, literalmente uma cena do filme, soou muito mais forte, chocante e original. Ali sim, foi a apoteose fílmica de todo o percurso angustiante vivido pela dupla, fotografado na dramaturgia do veterano casal de atores. Essa cena valeu muito mais do que mil travesseiros [sic].

O maior mérito de ‘Amor’ é explorar a sustentação de uma estrutura, aparentemente forte, sem o aviso prévio de sua ruína. Por mais sólida e resistente, em algum momento ela vai dar sinais de mudança. Um fato. Um destino. Sabe um trecho da música ‘Por enquanto’, composta por Renato Russo? Dizia assim: ‘Se lembra quando a gente chegou um dia a acreditar que tudo era pra sempre, sem saber que o pra sempre, sempre acaba’. Pois é. E aí? Como fica?
Juntar os veteranos Emmanuelle Riva e Jean Louis Trintgnant (e ainda, de quebra, Isabelle Huppert) denota a sensibilidade e maturidade de Michael Haneke no trato dramático e artístico do seu filme. Com esse grupo, ele agrega valor à sua obra, bem como para a sétima arte em seu escopo mais genérico. Os quatro dão um show de profissionalismo, transformando ‘Amor’ em peça obrigatória para qualquer apreciador, de qualquer nível, da arte cinematográfica.
E pensar que ‘Amor’ foi filmado em Paris, a capital mundial do romantismo. Ironia pura.

* Anderson Bruno é crítico audiovisual.

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