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OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO


Publicado em 29 de janeiro de 2022
Por Jornal Do Dia Se


Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos

Nem mesmo o autor imaginava que a obra fizesse tanto sucesso. Disse isto numa edição de 1966, ressaltando que aquilo foi decisivo para que ele pudesse fazer profissão da literatura. Publicada em 1938, “Olhai os lírios do campo”, certamente, é um dos mais extraordinários livros de Érico Veríssimo (1905-1975). Famoso, de modo particular, pela série “O Tempo e o Vento”, ele toca seus leitores com ele mesmo chamou com uma “filosofia salvacionista barata”, mas, longe disso, considero um tratado humanístico.
“Olhai os lírios do campo” gira em torno do personagem Eugênio. De origem bastante humilde, passou grande parte de sua vida em busca de superar traumas e humilhações de infância. Por isso mesmo, alcançou o sucesso que tanto almejada, mas sem superar o seu renitente complexo de inferioridade e a revolta para com tudo e para com as pessoas.
Por outro lado, o médico conceituado Dr. Eugênio também nutria em seu íntimo uma boa índole, capaz de ter empatia pelos mais necessitados e, por isso mesmo, viver às voltas com inúmeras crises de consciência, aliviadas pelo amor que sentia por uma colega de faculdade, a também médica, Olívia. Eugênio achava-se feio e rude e isso o angustiava. Não aceitava a pobreza dos pais e sobretudo o alto grau de servilismo e resignação do pai, um alfaiate.
Ele tinha vergonha de si e assumira o propósito de ser médico logo cedo e deixar aquela miséria. No fundo, no fundo, queria mesmo era “(…) ser sereno e feliz como os outros” (p. 29), principalmente como Olívia, cuja característica primordial era a de ter “uma quente qualidade humana” (p. 59). Admirava-a e se apaixonou por ela por sua superioridade natural, sua serenidade e por sua fé.
Aliás, o ateísmo de Eugênio era do tipo vacilante. Duvidava de Deus a todo instante e queria, a todo custo, se convencer que Ele não existia e se existisse era como o destino, cruel. Mas, um dos argumentos de Olívia contra o ateísmo era no mínimo desconcertante para ele: “- Vocês ateus nos querem tirar Deus para nos dar em lugar dele… o quê? É o mesmo que tirar pão da boca de quem tem fome e dar-lhe um punhado de cinza e de areia” (p. 76).
“Olhai os lírios do campo” revela, por meio de suas personagens, um Érico Veríssimo poético e pensador. São dezenas de axiomas fantásticos, dotados de grande sentimento. Destaco a seguir, pelo menos, dois deles: “Só foge da solidão quem tem medo dos próprios pensamentos” (p. 92); ou ainda: “A bondade não deve ser uma virtude passiva” (p. 175).
A obra também traz reflexões sobre a medicina e sobre a prática médica. Toca em questões pontuais e ainda atemporais, como a ética e a questão do aborto, da necessidade do profissional de saúde visar mais o bem do seu paciência do que a sua carreira. Renovado pelas circunstâncias da vida, o personagem Eugênio defende uma medicina socializada, não muito diferente de nossos dias, foi taxado de comunista apenas pelo fato de querer ajudar os mais necessitados.
Eugênio viveu um casamento arranjado com Eunice, a filha riquinha do senhor Cintra. Teve um relacionamento promíscuo e extraconjugal com Isabel, esposa de um amigo da família: o fascista, antissemita e megalomaníaco engenheiro, “doutor” Filipe. Mas, nada disso tirou de seus pensamentos Olívia, que se dedicou à medicina no interior do Rio Grande do Sul, criando a filha que teve com Eugênio, Anamaria.
“Olhai os lírios do campo” ainda revela inúmera tramas que não desejo adiantar para não frustrar o interesse de seus potenciais novos leitores. Antecipo, apenas, que Eugênio, enfim, irá se encontrar e abrir mão de tudo para viver um grande amor com Olívia, embora o destino tenha lhe revelado uma grande e trágica surpresa, mas necessária para que ele abraçasse uma nova vida e deixasse de lado aquilo que não lhe permitia ver o mundo e as pessoas de outra maneira.

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