Sobre os personagens que pulam para vida real
Publicado em 19 de janeiro de 2022
Por Jornal Do Dia Se
Sabemos que o mercado é poderoso e que os presidenciáveis vivem rebolando para agradá-lo
José Fernandes de Lima
Tenho notado que alguns personagens estão pulando da literatura tradicional para as páginas das colunas sociais.
As notícias que aparecem nos jornais e nas revistas dão a impressão de que estamos falando de alguém conhecido ou de alguma celebridade.
A título de exemplo, vou citar alguns nomes.
O primeiro é o PIB. Os jornais falam do PIB como quem fala de uma criança e outras vezes, como quem fala de um idoso. Dizem: esse ano, o PIB cresceu bastante ou esse ano o PIB já cresceu mais de 2%. Quem lê essa notícia pode pensar que estão falando de uma criança.
Outro dia, dizem: o PIB caiu. Eu quando ouço essa notícia, fico imaginando o coitadinho escorregando na calçada. Vai ver, ele andou passeando nas calçadas irregulares de alguma capital brasileira.
Há outro personagem cuja fama de mal-humorado o torna muito importante. É um tal de Mercado.
Quase toda semana, ouvimos notícias do tipo: o Mercado anda muito nervoso. O Mercado não está gostando nada disso. O Mercado não admite esse tipo de comportamento do governo. O governo – coitado – não pode nem fazer uma besteirinha que o Mercado já fica inquieto.
Não conhecemos as suas feições, não sabemos as roupas que usa, nem onde mora. O que sabemos é que ele não gosta de aumento de salários, não quer nem ouvir falar de aumento de gastos públicos.
Sabemos também que ele é poderoso e que os presidenciáveis vivem rebolando para agradá-lo.
Há duas irmãs que, ao serem citadas, trazem à nossa cabeça uma cena de baile antigo.
São elas, a Ficha Limpa e a Ficha Suja. A Ficha Limpa é aquela irmã bem-comportada, discreta, calma, meio sem sal e a Ficha Suja é aquela voluptuosa, dada, solta, que dança de acordo com a música.
Isso talvez explique por que alguns indivíduos são atraídos pela Ficha Suja, mas não gostam de mostrá-la em público.
Tem um personagem que lembra uma megera. Quando nós ouvimos falar nela, imaginamos logo uma bruxa, ranzinza e capaz de colocar gosto ruim em tudo.
O pessoal da esquerda tem essa personagem em péssima conta.
O leitor já deve ter adivinhado que estamos falando da Zelite. Já deve ter ouvido alguém dizer que a Zelite é retrograda, não quer que a educação melhore, atrapalha o desenvolvimento do país e trabalha em favor do atraso.
Esse caso é interessante porque, no início, o nome era pronunciado e escrito no plural – dizíamos as Zelites. O tempo foi passando e elas foram consolidadas numa pessoa só, hoje conhecida como Zelite.
Se algum dia decidirmos colocá-la no rol das personagens do bem, talvez tenhamos que sofisticar o seu nome – quem sabe, passa a ser Zellitte, com dois “l” e dois “t”.
José Fernandes de Lima é físico e professor.