Nadinho, o Yashin de uniforme cinza
Publicado em 09 de fevereiro de 2022
Por Jornal Do Dia Se
* Antônio Matos
Os mais novos, que não o viram jogar, podem imaginar um certo exagero nesta comparação. Mas quem teve a oportunidade de acompanhar a longa carreira de Leonardo Conceição Cardoso, no Vitória, Bangu, Bahia e Seleção Brasileira, sabe do que estou falando.
Líder como Lev Yashin, famoso goleiro do Dínamo de Moscou e da então Seleção Soviética, o ‘Macho’, aos gritos, embora sem ser desrespeitoso, impunha autoridade, orientando a defesa e exigindo empenho dos companheiros.
Não foi escolhido o melhor goleiro do século XX nem recebeu a ‘Bola de Ouro’ da conhecida revista ‘France Football’, como o notável ‘Aranha Negra’, simplesmente por jogar no Brasil e, sequer, se interessar em permanecer no futebol carioca, o grande centro futebolístico do país, ao lado de São Paulo, no final dos anos 50.
Ao contrário dos arqueiros da época, que mal abandonavam a pequena área, Nadinho se destacava por sair bem do gol e pela determinação de se lançar sobre a bola nos pés dos atacantes. Além disso, era frio, possuía um posicionamento extraordinário e, como poucos, sabia fechar o ângulo dos adversários, que se aproximavam do seu reduto.
Negociado pelo Vitória – onde fora campeão baiano em 1953 e 1955 – para o Bangu, chegou em 1956, à Seleção Brasileira, convocado para a Copa Oswaldo Cruz, em Assunção, diante do Paraguai, ganhando também, assim como Yashin, status de ídolo nacional.
Voltou para Salvador no final de 1957 e teve o passe comprado pelo Bahia, onde atuou por 10 anos, fazendo 339 jogos e sofrendo 316 gols, menos de um por partida.
Da mesma forma que o ‘Aranha Negra’ no Dínamo, o ‘Macho’ foi multicampeão no tricolor baiano. Além do título nacional de 1959, conquistou o tricampeonato do Norte/Nordeste, em 1959, 1961 e 1963, e o pentacampeonato estadual, de 1958 a 1962.
Em 1965, durante férias no Rio e treinando na Gávea, com a camisa do Flamengo, Yashin não tinha a menor ideia de que, na região Nordeste daquele país que visitava, existia um goleiro tão bom quanto ele e que, àquela altura, já planejava trocar a bola pelos livros jurídicos e os gramados pelos tribunais de justiça, transformando-se no advogado Leonardo Cardoso.
Sem nunca ter jogado de luvas e, muito menos, usado boné em dias de sol, como habitualmente fazia o ‘Aranha’, preferia um discreto uniforme cinza, em vez do negro do arqueiro soviético.
Nadinho, que residia num abrigo de idosos em Salvador, morreu, na semana passada, de covid e foi sepultado no Memorial Osab, em Alagoinhas, onde nascera há 91 anos. Sofria de Alzheimer e tinha sequela na mão esquerda, provocada por um AVC.
* Antônio Matos, jornalista e delegado de Polícia, é autor do livro ‘Heróis de 59’, que narra a conquista da I Taça Brasil pelo Bahia
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