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O EXTREMO DO EXTREMISMO


Publicado em 02 de janeiro de 2023
Por Jornal Do Dia Se


Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos

Aprendi desde menino muito cedo a conviver com uma máxima que diz: “quem tem vergonha, não faz vergonha”. Mas, aprendi também que existe a chamada “vergonha alheia”. Aquela sobre a qual ou devemos ter dó ou lamentar mesmo. Tímido, a vida foi mostrando para mim que deveria me superar e dizer o que penso. Entre os poucos males que me afetaram o contágio com a COVID-19, a ansiedade foi um deles. Há quase dois anos, busquei ajuda e tenho tido progressos importantes. Entre eles, o de procurar ser autêntico e dizer o que penso sem ficar naquela de se omitir ou de agradar.
Pois bem. Na última quarta-feira, final da tarde, na cidade de Aracaju, numa renomada empresa sergipana, estávamos eu e minha esposa aguardando a liberação de um serviço. Nesse ínterim, vivemos uma das situações mais embaraçosas de nossas vidas. Inusitada, mas não nova nesses tempos de intolerância política e de distorção da verdade no que ela tem de mais pura. Foi uma prova de fogo para testar como andavam meus nervos e consciência. Se quiserem chamar de coragem, fiquem à vontade.
A certa altura da nossa espera, que levou boa parte da tarde, conversava descontraído com um atencioso e competente funcionário da empresa sobre a política no Brasil no tempo presente. Lá pelas tantas, sem emitir qualquer juízo de valor, tocamos no assunto viagem de Bolsonaro aos EUA. Disse a ele que havia muita controvérsia. Que o presidente havia negado e que pouco menos de duas horas, a impressa tinha descoberto que o General Heleno, responsável pela segurança presidencial, já tinha tomado todas as providências.
Um senhor, que estava sentado no canto da sala de atendimento, que eu não conseguia visualizar porque entre ele e eu havia uma bebedouro e um móvel para servir café (aliás, muito saboroso), saltou com “quatro pedras na mão”, fazendo a seguinte indagação, em tom bastante ríspido e alterado: “e o presidente não pode viajar não?”. Eu fiquei, inicialmente, surpreso e sem ação. Minha esposa, delicadamente, tentou conversar com o senhor, sem sucesso, pois estava transtornado.
Tomado por um sentimento de revolta, passei a confrontar com o “cidadão”, sem ofendê-lo, momento algum. Frente a sua indelicadeza, deixei de lado todas as convenções sociais e parti para o embate, “sem ódio e sem medo”, como nos orienta o padre Zezinho numa de suas canções. Possesso, o senhor que a certa altura bradava que tinha 61 anos, passou a me dirigir inúmeros e impublicáveis impropérios. Alguns destes, revelam que era o sujeito: bolsonarista de extrema direita. Aqui, um parêntese para deixar claro que tenho amigos e familiares que votaram no Bolsonaro, mas nada se compara ao que enfrentei, com minha esposa e funcionário naquela tarde.
Alguns de seus “argumentos”: 1) você sabe com quem está falando?; 2) Ponha-se em seu lugar; 3) Votei quinze anos no PT ladrão; 4) Não estou falando com você, fique na sua. E a “pérola”, após dizer ao funcionário da empresa e a minha esposa que era aquele tipo de gente que estava querendo bagunçar o país, inclusive, sacando arma para matar opositores: “que arma, porra nenhuma; eu resolvo no braço”. Para bom entendedor, inclusive para mim que fui moleque de rua, me chamou para a porrada.
Sem argumentos, após proferir a última “pérola” bolsonarista de extrema direita, saiu do ambiente, aos berros. Confesso que temi pela minha vida e pela saúde de minha esposa, cujos nervos não se acomodavam no lugar. O funcionário, atônito, permaneceu calado e depois me confidenciou que jamais havia passado por aquela situação.
Pelos noticiários, vimos muitas situações desse tipo e até piores. Mas, no maior de nossos otimismos, jamais achamos que um dia possamos passar por algo do tipo. Tive uma sorte melhor que muitos outros que ousaram enfrentar essa turba enlouquecida. Não deixei de reparar dois detalhes no “cidadão de bem”, que me chamaram a atenção: uma bolsa de couro, suspensa pelo ombro direito, com um volume no mínimo estranho; e um terço enorme de prata no pescoço, onde se destacava um crucifixo.
Eu, minha esposa e o funcionário estamos vivos, graças a Deus. Eu, sobretudo, para contar a história, longe de ser a última e a ideal para este final de ano. Fui até aconselhado a não partilhar, mas penso que nesses tempos em que estamos vivendo, omitir-se seja a pior coisa a se fazer. Por isso, preferi o exemplo de Charles De Gaulle (1890-1970), em que ao final da Segunda Guerra Mundial, enfrentou os nazistas de peito aberto. Não recomendo a ninguém a mesma atitude, pois, pensando bem, melhor seria ter agido como aquele trecho da música de Maderada que diz: “Deixa o gado berrar!”.

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