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O silêncio cúmplice dos gestores que perpetuam o abuso


Publicado em 26 de novembro de 2024
Por Jornal Do Dia Se


* Gegório José

 

Se há algo mais insidioso do que o assédio sexual em ambientes profissionais, é a cumplicidade silenciosa – ou pior, a participação ativa – de quem deveria ser guardião do respeito e da ética no trabalho: os gestores. No Brasil, onde dados alarmantes já pintam um quadro de violência contínua contra mulheres, o assédio em ambientes de trabalho ganha um novo contorno de crueldade quando perpetrado ou tolerado por aqueles que ocupam cargos de chefia.
Os números da pesquisa “O ciclo do assédio sexual nos ambientes profissionais” escancaram uma ferida. Quase metade das mulheres entrevistadas já sofreu assédio sexual no ambiente de trabalho, com as mulheres negras e as de baixa renda figurando como as maiores vítimas. Para essas mulheres, o trabalho, que deveria ser sinônimo de emancipação e dignidade, se transforma em um campo minado de constrangimentos e violência.
O que causa náusea, porém, é o papel desempenhado por alguns gestores – homens e mulheres – que, ao invés de combaterem esse crime, se tornam autores ou facilitadores. Em vez de liderarem com ética, tornam-se predadores com crachá, explorando sua posição de poder para subjugar, constranger e calar as vítimas. E, como se não bastasse, muitos ainda cultivam uma cultura de impunidade, tratando o assédio como uma brincadeira ou um mal-entendido, enquanto minam qualquer possibilidade de denúncia ou justiça.
Na realidade virtual do trabalho online, a distância física não trouxe alívio. Reuniões digitais se tornaram palco de piadas de mau gosto, comentários invasivos e avanços inapropriados, como se o distanciamento social desse carta branca para o desrespeito. É a prova de que o problema não está no espaço, mas no caráter – ou na ausência dele – de quem deveria dar o exemplo.
A omissão diante do assédio é tão criminosa quanto o próprio ato. E isso não é apenas uma questão moral; é uma questão de responsabilidade legal. Mas as vítimas, esmagadas por um sistema que frequentemente prioriza a reputação dos agressores, ficam sem saber a quem recorrer. Muitas vezes, quem deveria protegê-las prefere proteger os “resultados” da empresa, como se dignidade fosse um custo descartável.
Chegamos ao ponto em que combater o assédio sexual no trabalho não é apenas uma demanda ética; é uma urgência de saúde pública. Porque o trauma de ser violentada em um ambiente que deveria ser seguro tem consequências profundas e duradouras. O medo, a vergonha e a culpa corroem carreiras, sonhos e, mais importante, vidas.
Às organizações que ainda não entenderam o básico: reinventar o mundo do trabalho exige mais do que campanhas publicitárias de inclusão e cartilhas nas paredes. Exige coragem para cortar o mal pela raiz, implementar políticas claras e eficazes e, sobretudo, garantir que as vítimas sejam ouvidas e protegidas – e que os agressores, sejam eles quem forem, enfrentem as consequências de seus atos.
Se gestores acham que o assédio não é problema deles, estão errados. A cultura de assédio é uma praga que contamina equipes, destrói reputações e pode custar caro – em processos judiciais, em talentos perdidos e em clientes que não toleram ser associados a um ambiente tóxico.
Não há mais espaço para omissão. Não há mais desculpas para o silêncio. Chegou a hora de varrer os predadores e seus cúmplices para fora dos escritórios, das fábricas, das reuniões online – de onde quer que tentem se esconder.
É hora de construir ambientes profissionais onde o respeito seja regra, não exceção. Porque o trabalho deve ser um lugar de realização, e não de medo. A responsabilidade é de todos, mas a mudança começa no topo. E quem não estiver disposto a liderar com integridade, que saia do caminho.

 

* Gregório José, Jornalista/Radialista/Filósofo

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